Artigo em destaque: Grafeno dopado e sem defeitos para uso em dispositivos eletrônicos.

O artigo científico de autoria de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Chemical Doping and Etching of Graphene: Tuning the Effects of NO Annealing. G. K. Rolim, G. V. Soares, H. I. Boudinov, and C. Radtke. J. Phys. Chem. C,  2019, 123, 43, 26577-26582. https://doi.org/10.1021/acs.jpcc.9b02214.

Artigo em destaque: Grafeno dopado e sem defeitos para uso em dispositivos eletrônicos

O grafeno já é usado na fabricação de alguns produtos, desde capacetes que dissipam o calor até embalagens antiestáticas. Entretanto, o material maravilhoso, como costuma ser chamado, ainda tem muito a entregar à sociedade. Por ser bidimensional, flexível e excelente condutor da eletricidade, entre outras propriedades, o grafeno pode ser a base de uma série de dispositivos eletrônicos e optoeletrônicos miniaturizados e de altíssimo desempenho. Entretanto, para isso, é preciso produzir, em escala industrial, um grafeno cuja rede de átomos esteja livre de impurezas indesejadas, mas que contenha, além do carbono inerente ao grafeno, pequenas quantidades de outros elementos (dopagem) para, dessa maneira, controlar suas propriedades eletrônicas.

Em um trabalho totalmente realizado no Brasil, uma equipe científica propôs um processo que pode ajudar a produzir, em grande escala, um grafeno apto para dispositivos eletrônicos. “O processo desenvolvido em nosso grupo permite melhorar e ajustar as propriedades do grafeno, além da remoção de contaminantes da sua superfície”, disse o professor Cláudio Radtke (UFRGS), autor correspondente do artigo que reporta o trabalho, recentemente publicado no The Journal of Physical Chemistry C.

Foto dos autores do trabalho. Da esquerda para a direita: Henri Boudinov, Cláudio Radtke Gabriel Vieira Soares (todos professores da UFRGS) e Guilherme Koszeniewski Rolim (bolsista de pós-doutorado do Pragrama de Pós-Graduação em Microeletrônica na UFRGS).
Foto dos autores do trabalho. Da esquerda para a direita: Henri Boudinov, Cláudio Radtke Gabriel Vieira Soares (todos professores da UFRGS) e Guilherme Koszeniewski Rolim (bolsista de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Microeletrônica na UFRGS).

A equipe adquiriu amostras de grafeno produzidas por CVD (chemical vapor deposition) e transferidas a substratos de silício. Essa técnica é, no momento, uma das mais adequadas para a produção em larga escala de folhas de grafeno de área relativamente grande, mas deixa impurezas residuais e gera defeitos no grafeno. Para remover as impurezas, é comum a aplicação de um tratamento térmico em atmosfera de dióxido de carbono (CO2), o qual é eficiente na eliminação dos contaminantes, mas acaba gerando novos defeitos na folha de grafeno. A boa notícia é que esses defeitos podem ser neutralizados (passivados).

Procurando, justamente, estratégias de passivação desses defeitos, o então aluno de doutorado Guilherme Koszeniewski Rolim encontrou um artigo científico de 2011, que apontava, por meio de cálculos teóricos, a possibilidade de usar óxido nítrico (NO) para passivar os defeitos do grafeno com átomos de nitrogênio e, ao mesmo tempo, dopá-lo para modular suas propriedades eletrônicas (principalmente, transformá-lo em um material semicondutor, condição essencial para usá-lo em dispositivos eletrônicos).

A equipe decidiu então verificar experimentalmente a predição teórica e, depois de realizar o tradicional tratamento com CO2 a 500 °C, aplicaram nas amostras um segundo tratamento térmico, este em atmosfera de óxido nítrico e a diferentes temperaturas, desde temperatura ambiente até 600 °C.

Depois do processo, os pesquisadores usaram diversas técnicas de caracterização para conferir os resultados e confirmaram, com alegria, que a dopagem com nitrogênio tinha acontecido e que ela tinha passivado os defeitos, melhorando assim as propriedades eletrônicas do material. Entretanto, os pesquisadores observaram também um efeito indesejado do tratamento com óxido nítrico: a degradação (etching) das folhas grafeno em alguns pontos. Depois de bastante trabalho científico, a equipe conseguiu determinar a causa. Durante o aquecimento, ocorria uma conversão de NO em NO2, o qual, por ser um composto muito mais reativo que o primeiro, acabava oxidando o grafeno.

Contudo, a equipe brasileira foi capaz de encontrar uma solução para esse problema. O “eureca” ocorreu enquanto os pesquisadores tentavam determinar a quantidade de átomos de nitrogênio que tinham se incorporado ao grafeno, mediante uma técnica baseada na análise de reações nucleares desencadeadas pela ação de um feixe de íons nas amostras de grafeno. Para poder aplicar essa técnica, a equipe teve que utilizar, no tratamento térmico, um óxido nítrico isotopicamente enriquecido, o qual tem uma pureza de 99,9999% em vez dos 99,9% do gás utilizado anteriormente.

Esquema ilustrativo dos parâmetros a serem controlados no processo proposto pela equipe brasileira. O equilíbrio entre pureza do gás e temperatura garante a obtenção de folhas de grafeno melhores para uso em dispositivos eletrônicos.
Esquema ilustrativo dos parâmetros a ser controlados no processo proposto pela equipe brasileira. O equilíbrio entre pureza do gás e temperatura garante a obtenção de folhas de grafeno melhores para uso em dispositivos eletrônicos.

A análise não rendeu os resultados esperados, pois não conseguiu quantificar o nitrogênio, que estava abaixo do limite de detecção. Contudo, o uso do gás enriquecido acabou trazendo muita satisfação à equipe. De fato, quando os pesquisadores compararam as propriedades eletrônicas dos dois de tipos de amostra, eles constataram que o grafeno tratado com o gás enriquecido sempre apresentava propriedades superiores. “Inicialmente tal resultado gerou bastante confusão na interpretação dos resultados”, conta o professor Radtke. “Mas, após mais alguns experimentos, passou a ser um dos pontos mais importantes do artigo, evidenciando a importância da pureza do gás durante o processamento”, completa. Concretamente, a conclusão foi que controlar adequadamente a temperatura e a pureza do gás durante o tratamento elimina o problema da degradação do grafeno por oxidação.

Dessa maneira, com bastante conhecimento e método científico, além de uma pequena intervenção do acaso, a equipe da UFRGS conseguiu desenvolver um processo de remoção de resíduos, neutralização de defeitos e dopagem do grafeno, que melhorou as propriedades eletrônicas do material sem gerar efeitos colaterais deletérios. Por se tratar de um tratamento térmico em atmosfera de gases, etapa que já faz parte da produção industrial de grafeno, o processo proposto pela equipe brasileira poderia ser facilmente aplicado à fabricação de folhas de grafeno para dispositivos.

“A inserção de heteroátomos (como o nitrogênio) na rede do grafeno sem a degradação de suas propriedades é especialmente importante na produção de dispositivos optoeletrônicos, transistores de alta velocidade, eletrônica de baixa potência e células fotovoltaicas”, destaca Radtke, lembrando que a fabricação desses dispositivos baseados em grafeno pode ser uma realidade nos próximos anos. “O Graphene Flagship (consórcio europeu de indústrias, universidades e institutos) anunciou a implementação de uma planta piloto para integrar grafeno em diferentes etapas da produção de dispositivos já em 2020”, comenta o professor da UFRGS.

O estudo, que contou com apoio financeiro das agências brasileiras CNPQ (principalmente por meio dos INCTs Namitec e INES), Capes e Fapergs, foi desenvolvido dentro do doutorado em Microeletrônica de Guilherme Koszeniewski Rolim, realizado no Programa de Pós-Graduação em Microeletrônica da UFRGS e defendido em 2018. O trabalho experimental foi feito no Laboratório de Superfícies e Interfaces Sólidas da UFRGS e no Laboratório Nacional de Luz Sincrotron do CNPEM.

Artigo em destaque: Controlando as propriedades eletrônicas de grafeno sobre carbeto de silício.

O artigo científico de autoria de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Graphene on the oxidized SiC surface and the impact of the metal intercalation. J.E.Padilha, R.B.Pontes, F. Crasto de Lima, R. Kagimura, R. H. Miwa. Carbon, Volume 145, April 2019, Pages 603-613.

Controlando as propriedades eletrônicas de grafeno sobre carbeto de silício

Um estudo baseado em simulações realizadas em supercomputadores por uma equipe científica brasileira aponta um caminho para superar o desafio de controlar as propriedades eletrônicas do grafeno. Soluções a esse desafio podem fazer a diferença no desenvolvimento de dispositivos eletrônicos bidimensionais – dimensão na qual o grafeno, rede de átomos de carbono de um átomo de espessura, se destaca pelas suas propriedades.

De fato, o grafeno é um material extremamente resistente, leve, flexível e transparente. Além disso, ele é um excelente condutor do calor e da eletricidade. Contudo, ainda é difícil controlar no grafeno a concentração e o fluxo de cargas elétricas, o que limita seu uso na eletrônica.

Soluções para driblar essa limitação tecnológica do grafeno vêm sendo propostas. Algumas delas se baseiam na inserção de pequenas proporções de átomos metálicos que modulam as propriedades eletrônicas do material sem prejudicar as outras características. O método é semelhante à dopagem do silício, cotidianamente praticada na fabricação de semicondutores para a indústria eletrônica.

Representação do sistema estudado: folha de grafeno sobre substrato de carbeto de silício oxidado com camada de átomos metálicos (no caso, ouro) intercalados.
Representação do sistema estudado: folha de grafeno sobre substrato de carbeto de silício oxidado com camada de átomos metálicos (no caso, ouro) intercalados.

Recentemente reportado no periódico científico Carbon (fator de impacto 7,466), o trabalho da equipe brasileira investigou a estrutura e as propriedades eletrônicas de uma folha de grafeno sobre um substrato de carbeto de silício (SiC) – material frequentemente usado para depositar ou fazer crescer grafeno. Nesse sistema, o grafeno se mantém unido ao substrato sem ligações químicas, por meio de forças de atração fracas e dependentes da distância, chamadas de forças de Van der Waals.

Dado que, na produção de grafeno, a presença de oxigênio costuma oxidar a superfície do carbeto de silício, os cientistas brasileiros incluíram nas simulações uma camada de óxido de silício entre o grafeno e o substrato. Finalmente, com o objetivo de compreender detalhadamente o efeito da inserção de átomos metálicos em materiais desse tipo, os cientistas acrescentaram ao sistema, nas simulações, uma camada de átomos de ouro ou alumínio, embutida na camada de óxido (no caso, Si2O5), na região da interface com o grafeno.

Por meio das simulações, os pesquisadores constataram que a presença da camada metálica modula a concentração dos portadores de cargas positivas (os chamados buracos) e negativas (os elétrons), tanto na folha de grafeno quanto no Si2O5. Além disso, os átomos de ouro e alumínio embutidos no Si2O5, que é semicondutor, induzem a formação de regiões condutoras na superfície dessa camada, nas quais se concentra o excesso de elétrons ou de buracos induzido pela presença do ouro ou do alumínio, respectivamente. Como resultado, formam-se, na superfície do Si2O5, canais condutores pelos quais fluem as cargas.

Esta série de mapas bidimensionais mostra as concentrações de elétrons e buracos na folha de grafeno nos dois sistemas de grafeno sobre a superfície de carbeto de silício terminado em Si [(a) e (c)] e terminado em C [(b) e (d)]; na presença de uma monocamada de alumínio [(a) e (b)] e o outro contendo uma camada de ouro [(c) e (d)].
Esta série de mapas bidimensionais mostra as concentrações de elétrons e buracos na folha de grafeno nos dois sistemas de grafeno sobre a superfície de carbeto de silício terminado em Si [(a) e (c)] e terminado em C [(b) e (d)]; na presença de uma monocamada de alumínio [(a) e (b)] e o outro contendo uma camada de ouro [(c) e (d)].
Finalmente, a equipe comprovou que o efeito da “dopagem” (a mudança na concentração de elétrons e buracos) pode ser potencializado mediante a aplicação de um campo elétrico externo, perpendicular à interface entre o grafeno e o substrato.

A partir dessas evidências, que foram obtidas, principalmente, por meio de simulações computacionais baseadas na Teoria do Funcional da Densidade, o trabalho sugere um caminho para controlar a concentração e o fluxo de cargas elétricas em folhas de grafeno sobre substratos de carbeto de silício. O estudo também mostra que o sistema estudado (folha de grafeno sobre carbeto de silício oxidado com camada metálica intercalada) pode ser uma boa plataforma para fazer engenharia de propriedades eletrônicas.

“A principal contribuição do trabalho é mostrar uma forma eficiente de controlar as propriedades eletrônicas do grafeno sobre uma superfície sólida recoberta com uma camada metálica, mediante a aplicação de um campo elétrico externo”, diz o professor Roberto Hiroki Miwa (Universidade Federal de Uberlândia, UFU), autor correspondente do artigo da Carbon. “Mostramos que, além de controlar o nível de dopagem do grafeno, o que é fundamental para desenvolvimento de dispositivos eletrônicos em sistemas bidimensionais (2D), a presença da monocamada metálica permite a formação de canais condutores na superfície do carbeto de silício”, completa. De acordo com Miwa, o estudo pode contribuir para o desenvolvimento de sensores, transistores e outros dispositivos eletrônicos mais rápidos e precisos quanto ao transporte de carga e a emissão de sinais.

O início do trabalho foi motivado pelo interesse dos professores da UFU Roberto Hiroki Miwa e Ricardo Kagimura em entender as interfaces grafeno/óxidos no nível atômico. O foco do estudo foi amadurecendo conforme os autores se aprofundavam na literatura científica. À medida que o volume e complexidade dos cálculos foram aumentando, a dupla envolveu novos colaboradores: um estudante do doutorado em Física da UFU (Felipe David Crasto de Lima) e professores de outras instituições (José Eduardo Padilha de Sousa, da Universidade Federal do Paraná – campus Jandaia do Sul, e Renato Borges Pontes, da Universidade Federal de Goiás).

Os autores do artigo. A partir da esquerda: J. E. Padilha, R. B. Pontes, F. Crasto de Lima, R. Kagimura, R. H. Miwa.
Os autores do artigo. A partir da esquerda: J. E. Padilha, R. B. Pontes, F. Crasto de Lima, R. Kagimura, R. H. Miwa.

Para realizar os cálculos que embasam as simulações, os autores utilizaram recursos computacionais do Centro Nacional de Processamento de Alto Desempenho em São Paulo (CENAPD) e do supercomputador SDumont do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC). O trabalho contou com financiamento das agências federais CNPq e CAPES e da estadual FAPEMIG (Minas Gerais).

Boletim da SBPMat. 78ª edição.

 

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Boletim da
Sociedade Brasileira
de Pesquisa em Materiais

Edição nº 78. 28 de fevereiro de 2019.

Anuidades 2019 e novos sócios

Sócios da SBPMat já podem encontrar os boletos referentes à anuidade 2019 em suas áreas de sócios, inserindo login e senha no cabeçalho do site da SBPMat. Estudantes e profissionais que ainda não são sócios estão convidados a fazer parte. Mais informações.

Artigo em Destaque

Uma equipe de pesquisadores da UFPR desenvolveu um método simples, limpo e muito eficiente para produzir hidrogênio. Os cientistas utilizaram filmes finos de grafeno e nanopartículas metálicas como catalisadores de uma reação química espontânea que ocorre entre borohidreto e água. O trabalho foi reportado no Journal of Materials Chemistry A. Saiba mais.

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Cientista em Destaque

Entrevistamos Juliana Davoglio Estradioto. Esta jovem de 18 anos é detentora de uma coleção de prêmios nacionais e internacionais recebidos por trabalhos de pesquisa realizados durante o ensino médio no IFRS, nos quais desenvolveu materiais biodegradáveis a partir de resíduos agroindustriais e criou aplicações para eles. Veja nossa entrevista.

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Novidades dos Sócios SBPMat

– O sócio da SBPMat Sidney Ribeiro (IQ – UNESP Araraquara) foi nomeado editor associado da revista Frontiers in Chemistry- Inorganic Chemistry. Saiba mais.

Notícias da SBPMat

– O Programa University Chapters comemora o estabelecimento de sua 9ª unidade, formada por um grupo de 15 estudantes de diversas áreas da UFPE. Saiba mais.

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XVIII B-MRS Meeting/ Encontro da SBPMat
(Balneário Camboriú, SC, 22 a 26 de setembro de 2019)

Site do evento: www.sbpmat.org.br/18encontro/

Veja o convite à submissão de trabalhos, aqui.

Submissão de trabalhos. A submissão de resumos está aberta até 15 de abril. Notificações de aprovação, modificação ou rejeição serão enviadas até 31 de maio. Notificações finais para resumos que precisarem de modificação serão enviadas até 21 de junho. Veja as instruções para autores, aqui.

Simpósios. 23 simpósios propostos pela comunidade científica internacional compõem esta edição do evento. Veja a lista de simpósios, aqui.

Prêmios para estudantes. Para participar do Bernhard Gross Award, os autores deverão submeter um resumo estendido até 11 de julho, além do resumo convencional. Saiba mais, aqui.

Inscrições. Já estão abertas as inscrições. Saiba mais, aqui.

Local do evento. O encontro será realizado no turístico Balneário Camboriú (SC), no Hotel Sibara Flat & Convenções, localizado no centro da cidade, próximo a hotéis, restaurantes e lojas, e a apenas 100 metros do mar. Saiba mais, aqui.

Palestra memorial. A tradicional Palestra Memorial Joaquim da Costa Ribeiro será proferida pela professora Yvonne Primerano Mascarenhas (IFSC – USP).

Palestras plenárias. Destacados cientistas de instituições da Alemanha, Espanha, Estados Unidos e Itália proferirão palestras plenárias sobre temas de fronteira no evento. Também haverá uma plenária do brasileiro Antônio José Roque da Silva, diretor do CNPEM e do projeto Sirius. Saiba mais sobre as plenárias, aqui.

Organização. O chair do evento é o professor Ivan Helmuth Bechtold (Departamento de Física da UFSC) e o co-chair é o professor Hugo Gallardo (Departamento de Química da UFSC). O comitê de programa é formado pelos professores Iêda dos Santos (UFPB), José Antônio Eiras (UFSCar), Marta Rosso Dotto (UFSC) e Mônica Cotta (Unicamp). Conheça todos os organizadores, aqui.

Expositores e patrocinadores. 29 empresas já confirmaram participação no evento e apoio/patrocínio. Empresas interessadas em participar podem entrar em contato com Alexandre no e-mail comercial@sbpmat.org.br.

Dicas de Leitura

– Ao encapsular grafeno em nitreto de boro, cientistas conseguem imprimir padrões com nanolitografia, abrindo possibilidades de uso do material em nanoeletrônica (paper da Nature Nanotechnology). Saiba mais.

– Cientistas melhoram atividade de nanocatalisadores de alumínio ao revesti-los com MOFs usando estratégia inspirada no processo de petrificação natural da madeira (paper da Science Advances). Saiba mais.

– Materiais quânticos: Cientistas confirmam experimentalmente que material topológico de espessura atômica conduz eletricidade nas bordas, abrindo possibilidade de uso em computadores quânticos (paper da Science Advances). Saiba mais.

Oportunidades

Invitation to organize the official International Sol-Gel Society Conference in 2021. Saiba mais.

– Concurso para professor do Instituto de Física da UFU. Saiba mais.

– Processo seletivo para ingresso ao mestrado em Ciência e Engenharia de Materiais do PPGCEM-UFABC. Saiba mais.

Eventos

International Workshop on Advanced Magnetic Oxides (IWAMO 2019). Aveiro (Portugal). 15 a 17 de abril de 2019. Site.

2019 E-MRS Spring Meeting e IUMRS – ICAM. Nice (França). 27 a 31 de maio de 2019. Site.

20th International Symposium on Intercalation Compounds (ISIC). Campinas, SP (Brasil). 2 a 6 de junho de 2019. Site.

10th International Conference on Materials for Advanced Technologies (ICMAT 2019). Cingapura. 23 a 28 de junho de 2019. Site.

20th International Sol-Gel Conference. São Petersburgo (Rússia). 25 a 30 de agosto de 2019. Site.

XVIII B-MRS Meeting. Balneário Camboriú, SC (Brasil). 22 a 26 de setembro de 2019. Site.

19th Brazilian Workshop on Semiconductor Physics. Fortaleza, CE (Brasil). 18 a 22 de novembro de 2019. Site.

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Artigo em destaque: Filmes de grafeno e níquel, melhores catalisadores para a produção de hidrogênio.

O artigo científico de autoria de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Nanocatalysts for hydrogen production from borohydride hydrolysis: graphene-derived thin films with Ag- and Ni-based nanoparticles. Leandro Hostert, Eduardo G. C. Neiva, Aldo J. G. Zarbin, Elisa S. Orth. J. Mater. Chem. A, 2018,6, 22226-22233. DOI 10.1039/C8TA05834B.

Filmes de grafeno e níquel: melhores catalisadores para a produção de hidrogênio

Milhares de veículos movidos a gás hidrogênio já circulam em algumas regiões do mundo soltando apenas água pelo escapamento. Enquanto combustível ou fonte de energia, o hidrogênio é, de fato, uma opção extremamente limpa (não gera emissões nocivas) e eficiente (pode produzir mais energia do que qualquer outro combustível). Entretanto, o hidrogênio em forma pura não existe na natureza no planeta Terra. Ele precisa ser produzido, e a maior parte dos métodos de geração de hidrogênio conhecidos até o momento pecam tanto no aspecto econômico quanto no ecológico.

Uma alternativa a esses métodos foi recentemente apresentada por uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR), ligados ao programa de pós-graduação em Química. Esses cientistas brasileiros propuseram um método limpo, eficiente, simples e de baixo custo para produzir hidrogênio. A equipe desenvolveu novos catalisadores (compostos que modificam a velocidade de uma reação química sem ser consumidos nela), feitos de grafeno e nanopartículas metálicas, que tornaram viável a produção de hidrogênio por meio da hidrólise de borohidreto – uma reação química ainda pouco utilizada na geração de hidrogênio apesar do enorme potencial que apresenta por ser limpa e muito simples.

Fotografias e esquemas representativos da geração de H2 por hidrólise de borohidreto catalisada com filmes finos de grafeno e nanopartículas metálicas. Os filmes, de cerca de 500 nm de espessura, recobrem os dois lados de uma plaqueta de vidro, cobrindo 15 cm2, a qual fica imersa numa solução de borohidreto de sódio e água. Nas fotos podem ser vistas as bolhas de gás hidrogênio geradas na superfície do catalisador.
Fotografias e esquemas representativos da geração de H2 por hidrólise de borohidreto catalisada com filmes finos de grafeno e nanopartículas metálicas. Os filmes, de cerca de 500 nm de espessura, recobrem os dois lados de uma plaqueta de vidro, cobrindo 15 cm2, a qual fica imersa numa solução de borohidreto de sódio e água. Nas fotos podem ser vistas as bolhas de gás hidrogênio geradas na superfície do catalisador.

Nessa reação, que é realizada em temperatura ambiente, moléculas de borohidreto de sódio (NaBH4), reagem espontaneamente com moléculas de água gerando moléculas de hidrogênio (H2). O processo ocorre em apenas uma etapa, e é realizado com o auxílio de materiais catalisadores, que aceleram a velocidade da reação.

“O trabalho desenvolvido tem como principal contribuição a possibilidade de geração de H2 por meio de filmes finos de nanocompósitos de grafeno”, diz a professora Elisa Souza Orth, autora correspondente de um artigo sobre o trabalho, recentemente publicado no Journal of Materials Chemistry A (fator de impacto= 9,931). “Os nanocompósitos de materiais à base de carbono com nanopartículas metálicas têm mostrado muitas aplicações promissoras e mostramos que, para a hidrólise de borohidreto, menos explorada, eles também poderiam ser empregados com eficiência”, completa.

Dentre os filmes finos catalisadores produzidos pela equipe da UFPR, os que apresentaram melhor desempenho foram os de óxido de grafeno reduzido com nanopartículas de níquel (rGO/Ni). De fato, esse nanocompósito, produzido com um metal relativamente barato, o níquel, apresentou um desempenho superior ao da maior parte dos catalisadores já reportados na literatura científica, inclusive aqueles preparados com metais nobres, cujo custo é muito maior. Em linhas gerais, isso significa que pequenas quantidades de rGO/Ni (algumas dezenas de mg) geraram grandes volumes de hidrogênio (400 ml) em curtos prazos de tempo (5 horas).

Além disso, os filmes desenvolvidos pela equipe brasileira apresentaram mais uma característica importante para um catalisador: eles podem ser facilmente retirados do recipiente de reação, lavados e secados sem sofrer danos, possibilitando assim seu reuso. “Nesse trabalho, conseguimos reutilizar o mesmo nanocatalisador em 10 ciclos consecutivos, sem perder atividade”, conta a professora Orth.

Esses resultados foram possíveis graças à união das competências em fabricação de nanomateriais de carbono do Grupo de Química de Materiais, coordenado pelo professor Aldo José Gorgatti Zarbin com a expertise em processos de catálise do Grupo de Catálise e Cinética, liderado pela professora Orth. Esses dois grupos da UFPR têm um histórico de colaboração na aplicação de materiais de carbono; inicialmente, no estudo de pesticidas e, atualmente, no desenvolvimento de materiais multifuncionais com atividade catalítica extraordinária.

O doutorando Leandro Hostert em laboratório do programa de pós-graduação em Química da UFPR.
O doutorando Leandro Hostert em laboratório do programa de pós-graduação em Química da UFPR.

Além do desenvolvimento dos catalisadores e da sua aplicação na produção de hidrogênio, o trabalho publicado no Journal of Materials Chemistry A incluiu uma análise das diversas formas de se medir a atividade catalítica de um material. Os autores conseguiram uniformizar critérios e comparar diversos resultados obtidos no laboratório e encontrados na literatura científica. “Desenvolvemos um estudo cinético que complementa a discussão dessas reações complexas e pode ajudar a orientar para uma compreensão mais concisa da atividade catalítica”, explica Elisa Orth.

A pesquisa foi realizada dentro do doutorado em andamento de Leandro Hostert, orientado pela professora Orth, e contou com financiamento do CNPq, CAPES, Fundação Araucária, INCT Nanocarbono e L´Oréal–UNESCO-ABC por meio do Prêmio para Mulheres na Ciência (2015) e International Rising Talents (2016) recebidos por Elisa Orth.

Pós-doutorado em Polímeros no Centro de Tecnologia em Nanomateriais (CTNano).

Centro de Tecnologia em Nanomateriais – CTNano está selecionando 1 (um) pesquisador(a) em nível de Pós-Doutorado para atuar na frente de pesquisa em Polímeros. O(a) candidato(a) deve ter título de Doutor(a) em uma das seguintes áreas: Química / Engenharia Química / Física / Engenharia de Materiais;

Espera-se que o(a) candidato(a) tenha experiência em processamento/caracterização de termoplásticos e plásticos de engenharia (especialmente UHMWPE). É desejável conhecimento/experiência na operação de misturador interno (HAAKE). Também se espera que o(a) candidato(a) tenha dedicação exclusiva ao projeto e facilidade para trabalho em equipe interdisciplinar.

O(a) candidato(a) selecionado(a) atuará no desenvolvimento de nanocompósitos poliméricos aditivados com nanomateriais (grafeno, óxido de grafeno, nanotubos de carbono ou outros) para aplicações em sistemas de transporte de minérios. O plano de trabalho está inserido em um projeto de pesquisa com empresa da área de mineração.

O CTNano é referência nacional no desenvolvimento de aplicações utilizando nanomateriais de carbono em compósitos poliméricos, cimentícios, sensores e síntese de nanomateriais. Além disso, o CTNano dispõe de infraestrutura completa para a caracterização físico-química dos nanomateriais e nanocompósitos produzidos. Maiores informações sobre o Centro podem ser obtidas em: www.ctnano.com.br. O Centro está localizado no Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BHTec), na cidade de Belo Horizonte – MG, e é uma iniciativa dos Departamentos de Física, Química, Microbiologia e da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais.

A seleção será feita através da análise eliminatória dos CVs dos(as) candidatos(as). Os(as) aprovados(as) nesta etapa serão chamados(as) para entrevista. Interessados(as) devem enviar CV para: contato@ctnano.com.br com o assunto: “POSDOC Polímeros” até 01/05/2018. Os(as) selecionados(as) serão avisados(as), por email, de sua convocação para entrevista até 15/05/2018.

Artigo em destaque: Rumo ao diamante bidimensional.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Raman evidence for pressure-induced formation of diamondene. Luiz Gustavo Pimenta Martins, Matheus J. S. Matos, Alexandre R. Paschoal, Paulo T. C. Freire, Nadia F. Andrade, Acrísio L. Aguiar, Jing Kong, Bernardo R. A. Neves, Alan B. de Oliveira, Mário S.C. Mazzoni, Antonio G. Souza Filho, Luiz Gustavo Cançado. Nature Communications 8, Article number: 96 (2017). DOI:10.1038/s41467-017-00149-8. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41467-017-00149-8

Rumo ao diamante bidimensional

Materiais bidimensionais, aqueles cuja espessura vai de um átomo até alguns poucos nanometros, possuem propriedades únicas ligadas à sua dimensionalidade e são protagonistas do desenvolvimento da nanotecnologia e da nanoengenharia.

Uma equipe de cientistas de cinco instituições brasileiras e uma estadunidense deu um passo importante no desenvolvimento, ainda incipiente, da versão bidimensional do diamante. Esse trabalho sobre diamante 2D foi reportado em artigo publicado na Nature Communications (fator de impacto 12,124) com acesso aberto.

“Nosso trabalho apresentou uma evidência espectroscópica da formação de um diamante bidimensional, ao qual demos o nome de diamondeno”, destaca Luiz Gustavo de Oliveira Lopes Cançado, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e autor correspondente do paper. Ao escolher o nome do novo material, os cientistas seguiram a tradição de usar o sufixo “eno” para materiais bidimensionais, como ocorreu com o grafeno, versão 2D do grafite.

box ptAliás, foi a partir da compressão de folhas de grafeno que o diamondeno foi obtido pela equipe liderada pelo professor Cançado. Inicialmente, o time depositou duas camadas de grafeno uma em cima da outra e transferiu a bicamada de grafeno para um substrato de Teflon, escolhido por ser quimicamente inerte, impedindo a formação de ligações com o grafeno.

A amostra de grafeno bicamada sobre Teflon foi então submetida a altas pressões e simultaneamente analisada por espectroscopia Raman no Laboratório de Espectroscopia Vibracional e Altas Pressões do Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará (UFC). O sistema experimental utilizado foi uma célula de bigornas (anvil em inglês) de diamante com espectrômetro Raman acoplado. Esse equipamento permite aplicar altas pressões a pequenas amostras que se encontram imersas em um meio transmissor da pressão (neste caso, água). A pressão é aplicada através de duas peças de diamante (material escolhido por ser um dos mais duros e resistentes à compressão), as quais comprimem o meio transmissor, que repassa a pressão para a amostra. Ao mesmo tempo, o espectrômetro permite monitorar as mudanças que ocorrem na estrutura do material da amostra frente às diversas pressões aplicadas. “Na espectroscopia Raman, a luz se comporta como uma sonda que mede estados vibracionais do material”, explica Cançado. Como resultado da sondagem, o espectrômetro gera gráficos (espectros), por meio dos quais é possível identificar a estrutura do material que está sendo estudado.

Analisando os espectros, a equipe de cientistas observou mudanças no material bidimensional que indicaram a transição de uma estrutura de grafeno para uma estrutura de diamante. Os pesquisadores puderam concluir que o diamondeno foi obtido a uma pressão de 7 gigapascals (GPa), valor dezenas de milhares de vezes superior ao da pressão atmosférica. “A evidência que apresentamos nesse trabalho é uma assinatura no espectro vibracional obtido a partir de um material de carbono bidimensional que indica a presença de ligações do tipo sp3, típicas da estrutura do diamante”, precisa o professor Cançado.

Para explicar a formação do diamondeno, a equipe acudiu a cálculos de primeiros princípios seguindo a Teoria do Funcional da Densidade e simulações de Dinâmica Molecular. “Foram esses resultados teóricos que guiaram os experimentos e permitiram o entendimento dos resultados experimentais”, diz Cançado.

Esquema do mecanismo de formação do diamondeno a partir de duas camadas de grafeno submetidas a altas pressões (setas azuis) em água como meio transmissor de pressão. As bolas de cor cinza representam os átomos de carbono; as vermelhas, os átomos de oxigênio e as azuis, os átomos de hidrogênio.
Esquema do mecanismo de formação do diamondeno a partir de duas camadas de grafeno submetidas a altas pressões (setas azuis) em água como meio transmissor de pressão. As bolas de cor cinza representam os átomos de carbono; as vermelhas, os átomos de oxigênio, e as azuis, os átomos de hidrogênio.

De acordo com os resultados teóricos, quando o sistema de grafeno bicamada sobre substrato inerte com água como meio transmissor de pressão é submetido a altas pressões, as distâncias entre os elementos do sistema diminuem e ocorrem novas ligações entre eles. “Ao se aplicar esse nível de pressão sobre o grafeno, o mesmo pode ter suas ligações modificadas, passando da configuração sp2 para a configuração sp3”, explica o professor Cançado. Os átomos de carbono da camada superior de grafeno passam então a estabelecer ligações covalentes com quatro átomos vizinhos: os átomos da camada inferior e os grupos químicos oferecidos pela água (OH e H). Estes últimos são fundamentais para estabilizar a estrutura. Na camada inferior, em contato com o substrato inerte, a metade dos átomos de carbono fica ligada a apenas três átomos vizinhos. “As ligações pendentes dão origem a abertura de gap na estrutura eletrônica, e também a bandas de spin polarizado”, acrescenta Cançado.

Essa característica faz do diamondeno um material promissor para o desenvolvimento da spintrônica (vertente emergente da eletrônica na nanoescala que se baseia no aproveitamento do spin). De acordo com Cançado, o diamondeno também poderia ser utilizado em computação quântica, sistemas micro-eletromecânicos (MEMS), supercondutividade, eletrodos para tecnologias relacionadas à eletroquímica, substratos para engenharia de DNA e biossensores –  aplicações nas quais filmes finos de diamante já provaram ter bom desempenho.

Entretanto, ainda há um longo caminho a percorrer até demonstrar as aplicações do diamondeno. Em primeiro lugar, porque o diamondeno apresentado no artigo se desmancha em condições normais de pressão. Para superar essa limitação, o grupo do professor Cançado na UFMG está montando um sistema experimental que permitirá aplicar pressões muito maiores às amostras, da ordem dos 50 GPa, e analisa-las por espectroscopia Raman. “Com isso pretendemos produzir amostras estáveis de diamondeno, que permaneçam sob essa forma mesmo depois de ter a pressão reduzida ao nível de pressão ambiente”, conta Cançado.

Além disso, como a espectroscopia Raman fornece evidências indiretas da estrutura do material, seria necessário realizar medidas diretas do diamondeno para se conhecer em detalhe sua estrutura. “As técnicas mais promissoras neste caso seriam a difração de raios X em fontes de luz sincrotron ou a difração de elétrons”, sugere Cançado. “O fator complicador nesse experimento é a necessidade de se ter a amostra submetida a altas pressões”, completa.

História do diamondeno é brasileira

A ideia da formação do diamante 2D surgiu na pesquisa de doutorado de Ana Paula Barboza, realizada com orientação do professor Bernardo Ruegger Almeida Neves e defendida em 2012 no Departamento de Física da UFMG. Nesse trabalho, conta Cançado, foram utilizadas pontas de microscopia de força atômica (AFM) para se aplicar altas pressões sobre grafenos de uma, duas e várias camadas. Evidências indiretas da formação de um diamante bidimensional foram obtidas por meio de microscopia de força elétrica (EFM). O trabalho mostrou a importância da presença de duas camadas de grafeno e de água para a formação da estrutura bidimensional de tipo sp3. Os principais resultados da pesquisa foram reportados no artigo Room-temperature compression induced diamondization of few-layer graphene [Advanced Materials 23, 3014-3017 (2011)].

Autores principais do artigo. À esquerda, Luiz Gustavo Pimenta Martins (mestre pela UFMG e doutorando no MIT). À direita, o professor Luiz Gustavo Cançado (UFMG).
Autores principais do artigo. À esquerda, Luiz Gustavo Pimenta Martins (mestre pela UFMG e doutorando no MIT). À direita, o professor Luiz Gustavo Cançado (UFMG).

“A ideia de se medir o espectro Raman dos grafenos em condições de altas pressões (utilizando células de diamante tipo anvil) veio posteriormente, após o Luiz Gustavo Pimenta Martins, estudante de iniciação científica à época, ter desenvolvido um método bastante eficaz de transferência de grafenos para diferentes substratos”, relata o professor Cançado. Esse desenvolvimento foi realizado em uma visita que o estudante fez ao laboratório da professora Jing Kong, no Massachusetts Institute of Technology (MIT), após ter ganhado uma bolsa de estudos para mobilidade internacional do Prêmio Fórmula Santander. Durante seu mestrado no Departamento de Física da UFMG, realizado com orientação do professor Cançado e defendido em 2015, Pimenta Martins fez um extenso e sistemático trabalho de obtenção de espectros Raman de grafenos submetidos a altas pressões. “Foram muitas visitas à UFC e muito estudo até entendermos os mecanismos de formação do diamondeno”, conta Cançado.

A pesquisa reportada no paper da Nature Communications foi possível graças ao trabalho colaborativo de diversos grupos de pesquisa brasileiros com reconhecida expertise em diversos assuntos, além da participação da pesquisadora do MIT na preparação de amostras. Os cientistas dos departamentos de Física da UFMG e UFC aportaram sua reconhecida competência em espectroscopia Raman aplicada a nanomateriais de carbono e, no caso da UFC, em experimentos realizado sob altas pressões. Também participaram desses experimentos pesquisadores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará e da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Além disso, físicos teóricos da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e da UFMG realizaram os cálculos e simulações computacionais.

A pesquisa teve financiamento do CNPq, FAPEMIG, FUNCAP, Programa Fórmula Santander e UFOP.

Artigo em destaque: Nanoflocos de grafeno para uma argamassa super-resistente.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Enhanced properties of cement mortars with multilayer graphene nanoparticles. Rodrigo Alves e Silva, Paulo de Castro Guetti, Mário Sérgio da Luz, Francisco Rouxinol, Rogério Valentim Gelamo. Construction and Building Materials. Volume 149, 15. September 2017, pages 378-385. https://doi.org/10.1016/j.conbuildmat.2017.05.146

Nanoflocos de grafeno para uma argamassa super-resistente

Imagem de microscopia eletrônica de varredura de amostra da argamassa reforçada mostra, no centro da imagem, alguns nanoflocos de grafeno multicamada.
Imagem de microscopia eletrônica de varredura de amostra da argamassa reforçada mostra, no centro da imagem, alguns nanoflocos de grafeno multicamada.

Pesquisadores de instituições brasileiras adicionaram flocos nanométricos de grafeno à argamassa de cimento e obtiveram um compósito com resistência quase 150% maior do que a da argamassa convencional. Por meio de processos mais simples, rápidos e baratos do que os reportados anteriormente na literatura científica, a equipe gerou uma argamassa reforçada pronta para ser usada na construção civil. O trabalho foi reportado em artigo que acaba de ser publicado em um periódico da editora Elsevier dedicado à pesquisa em materiais para a construção, o Construction and Building Materials (fator de impacto: 3,169).

Quando comparada com a argamassa tradicional, a nova argamassa com grafeno pode ser usada em menor quantidade e tem menos probabilidade de trincar ao longo do tempo, explica o professor Rogério Valentim Gelamo, autor correspondente do artigo. Além disso, seu processo de fabricação não apresenta riscos à saúde ou ao meio ambiente e não é necessário nenhum procedimento complementar para seu manuseio e aplicação, completa.

O pó de nanoflocos de grafeno multicamada poderia ser vendido dentro de ampolas com a quantidade necessária para ser adicionada a 1 metro cúbico de argamassa, imagina o professor Gelamo. A argamassa reforçada custaria cerca de 16 reais a mais por metro cúbico. “O custo é realmente baixo e poderia ser aplicado ou comercializado por alguma empresa que tenha interesse, já que a fabricação em larga escala já é dominada em nosso Laboratório de Filmes Finos e Processos de Plasma da UFTM em Uberaba (MG) ”, afirma o professor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).

A ideia do trabalho surgiu quando Gelamo se propôs a procurar aplicações para o grafeno multicamada que ele tinha desenvolvido durante seu pós-doutorado no Centro de Componentes Semicondutores da Unicamp junto ao também pós-doc Francisco Rouxinol. O material e seu processo de obtenção tinham sido objetos de artigos e uma patente. Em 2010, Gelamo tornou-se professor adjunto do recém-criado Instituto de Ciências Tecnológicas e Exatas da UFTM. Ali, dando aulas para a primeira turma de Engenharia Civil, o professor Gelamo conheceu o aluno de graduação Rodrigo Alves e Silva, quem se entusiasmou com a ideia de usar o grafeno multicamada na argamassa. À dupla, somou-se outro professor da UFTM, Paulo Guetti. “Juntos desenvolvemos os primeiros experimentos com esses compósitos, que, para nossa surpresa, deram excelentes resultados logo nos primeiros ensaios”, lembra o professor Gelamo.

Os pesquisadores obtiveram o grafeno multicamada a partir de flocos de grafite cedidos pela empresa brasileira Nacional de Grafite e extraíram, com auxílio de álcool isopropílico, nanoflocos formados por até 40 camadas de grafeno sobrepostas, de um átomo de espessura cada uma, com espessura total de 0,7 nm a 20 nm. O resultado: nanoflocos de grafeno multicamada, quase sem defeitos, em forma de pó pronto para ser dispersado na argamassa.

“A ideia do nosso trabalho foi usar multicamadas de grafeno obtidas por processos mais simples, rápidos e baratos que aqueles utilizados para a obtenção de grafeno oxidado e reduzido quimicamente. Assim conseguimos unir praticidade e economia às excelentes propriedades térmicas e mecânicas das camadas de grafeno”, diz Gelamo. “Da forma como é obtido o grafeno atualmente (método de Hammer ou similar) muitos defeitos são criados na estrutura do grafeno, o que acaba por comprometer suas propriedades”, completa.

Numa segunda etapa, a equipe de cientistas preparou argamassa com a proporção convencional de água, cimento e areia, e a reforçou com cinco diferentes porcentagens de nanoflocos de grafeno multicamada, indo de 0% (argamassa sem grafeno) a 0,033%. “Nossa dispersão também foi feita de forma inovadora e simples, usando apenas solventes orgânicos misturados diretamente sobre o composto da argamassa ainda seca”, conta o professor Gelamo. Dessa maneira, a equipe conseguiu obter uma mistura sem as aglomerações de grafeno citadas na maioria dos artigos sobre compósitos de cimento e grafeno.

Com os cinco tipos de argamassa, a equipe fez amostras cilíndricas de 5 cm de diâmetro e 10 centímetros de comprimento e testou sua resistência à compressão e à tração (esticamento). Os ensaios foram realizados 3, 7, e 28 dias depois da preparação da argamassa, seguindo as respectivas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Todos os testes mostraram aumentos significativos na resistência da argamassa quando reforçada com o grafeno multicamada. Particularmente, o melhor resultado no teste de resistência à tração foi conseguido com as amostras contendo a maior porcentagem de grafeno, 7 dias depois de sua fabricação: 144,4% de aumento na resistência com relação às amostras de argamassa convencional. Quanto à resistência à compressão, o melhor resultado (um aumento de 95,7%) foi obtido com a adição de 0,021% de grafeno multicamada, 28 dias depois da preparação da argamassa.

A morfologia e composição das amostras e dos materiais utilizados na sua fabricação foram analisadas por meio de diversas técnicas. Essas análises ajudaram a equipe a compreender por que a adição dos nanoflocos de grafeno multicamada resultaram em aumentos tão significativos na resistência da argamassa. De acordo com os autores do artigo, a presença desse grafeno acelera a reação de hidratação da argamassa, gerando algumas mudanças na sua estrutura e composição que melhoram a propagação de tensões internas através do material, e evitam assim a ocorrência de trincas.

Mesmo com o sucesso obtido ao aplicar o grafeno multicamada na argamassa, o professor Gelamo continua à procura de outras aplicações para seus nanoflocos de grafeno por meio de parcerias com grupos do Brasil e do exterior. “Temos usado multicamadas de grafeno em dispositivos para emissão de campo, baterias, supercapacitores flexíveis e autossuportados, sensores químicos e biológicos, nanofluídos para usinagem, dentre outras aplicações”, conta ele. “Também temos funcionalizado as multicamadas de grafeno com plasmas reativos buscando alterar as propriedades desses materiais, com alguns trabalhos já publicados”, completa.

A pesquisa que originou o artigo da Construction and Building Materials foi realizada com apoio financeiro do CNPq, Capes e Fapemig.

Autores do artigo. A partir da esquerda do leitor, Rodrigo Alves e Silva (UFTM), Paulo de Castro Guetti (UFTM), Mário Sergio da Luz (UFTM), Francisco Paulo Rouxinol (Unicamp) e Rogério Valentim Gelamo (UFTM).
Autores do artigo. A partir da esquerda do leitor, Rodrigo Alves e Silva (UFTM), Paulo de Castro Guetti (UFTM), Mário Sergio da Luz (UFTM), Francisco Paulo Rouxinol (Unicamp) e Rogério Valentim Gelamo (UFTM).

Artigo em destaque: Nanofolhas e nanopartículas interconectadas para a eletrônica vestível.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Self-Assembled and One-Step Synthesis of Interconnected 3D Network of Fe3O4/Reduced Graphene Oxide Nanosheets Hybrid for High-Performance Supercapacitor Electrode. Rajesh Kumar, Rajesh K. Singh, Alfredo R. Vaz, Raluca Savu, Stanislav A Moshkalev. ACS APPLIED MATERIALS & INTERFACES. 2017, 9, 8880 – 8890. DOI: 10.1021/acsami.6b14704.

Nanofolhas e nanopartículas interconectadas para a eletrônica vestível

Uma equipe de pesquisadores da Unicamp e um cientista da Universidade Central de Himachal Pradesh (UCHP), da Índia, desenvolveram um supercapacitor flexível, de pequenas dimensões e alto desempenho, feito de um material híbrido composto por nanofolhas de óxido de grafeno (GO) e nanopartículas de óxido de ferro (Fe3O4). O trabalho foi recentemente reportado no periódico Applied Materials & Interfaces (fator de impacto 7,145), da American Chemical Society.

“A principal contribuição deste trabalho é para a nova e realmente promissora área de pesquisa em eletrônica flexível”, diz Rajesh Kumar, pesquisador no Centro de Componentes Semicondutores (CCS) da Unicamp e autor correspondente do artigo. “Como os capacitores estão entre os componentes principais dos dispositivos eletrônicos, estes microsupercapacitores baseados em óxido de grafeno eficientes e flexíveis podem ser usados, em um futuro próximo, como componentes de dispositivos eletrônicos flexíveis e vestíveis (celulares, relógios inteligentes, dispositivos para monitoramento da saúde e para armazenamento de energia etc.) ”, completa o pesquisador indiano.

A gênese do trabalho remonta a 2015, quando Rajesh Kumar, que vinha trabalhando com microsupercapacitores de óxido de grafeno em outros países, candidatou-se a uma bolsa de pós-doutorado para trabalhar no grupo do professor Stanislav Moshkalev, diretor do CCS – Unicamp. “Enxerguei uma grande oportunidade nesse grupo, desde que sua principal linha de pesquisa é nanofabricação e nanoeletrônica baseada em carbono nanoestruturado”, relata Kumar. O indiano conseguiu financiamento do CNPq, na modalidade de especialista visitante, para realizar um projeto no CCS – Unicamp. Inicialmente, fabricou umas finas folhas de óxido de grafeno chamadas buckypapers. Depois, trabalhando em interação com mais 5 pessoas do CCS – Unicamp, Kumar buscou novas estratégias para melhorar as propriedades do material.

A equipe da Unicamp encarou, então, o desafio de fabricar um material híbrido de grafeno e óxido de ferro de estrutura controlada por meio de um processo que não fosse complexo como os reportados na literatura científica. Os cientistas conseguiram fazê-lo mediante a simples exposição de óxido de grafite e cloreto férrico (FeCl3) à radiação de micro-ondas.

Imagem MEV do material híbrido tridimensional Fe3O4/rGO (esquerda) e esquema representativo da morfologia do material (direita).
Imagem MEV do material híbrido tridimensional Fe3O4/rGO (esquerda) e esquema representativo da morfologia do material (direita).

O material obtido apresentou uma interessante morfologia: uma rede tridimensional, na qual nanofolhas de grafeno interconectadas formam “túneis” que albergam nanopartículas de óxido de ferro cristalinas e multifacetadas, de 50 a 200 nm, fortemente anexadas às nanofolhas, como mostra a figura ao lado.

A morfologia, estrutura, composição, estabilidade térmica e outras propriedades foram analisadas usando diversas técnicas disponíveis no CCS – Unicamp e na universidade indiana.

Posteriormente, na Unicamp, a equipe testou a eficiência do material para atuar no armazenamento de eletricidade. Os testes demonstraram o alto desempenho do material como eletrodo de supercapacitor. Os cientistas concluíram que a especial morfologia deste material híbrido (particularmente, as nanopartículas facetadas que grudam bem nas nanofolhas, a separação entre as nanofolhas, os “túneis” que albergam as nanopartículas individualmente evitando aglomerações e a grande área superficial da rede de nanofolhas interconectadas) favoreceu o desempenho do material nessa aplicação.

“Estes microsupercapacitores poderão substituir, e certamente o farão, os capacitores tradicionais em dispositivos eletrônicos”, afirma Kumar. De acordo com o pesquisador, suas vantagens principais são a alta performance, resistência mecânica, tamanho reduzido e, principalmente, flexibilidade – uma propriedade essencial para a eletrônica vestível.

Além disso, o método desenvolvido pela equipe da Unicamp e UCHP pode se tornar uma boa alternativa para fabricar outros materiais híbridos baseados em carbono e óxidos metálicos.

O trabalho foi realizado com apoio financeiro do CNPq e FAPESP.

Fotos dos autores do artigo. A partir da esquerda do leitor, Rajesh Kumar (Unicamp), Rajesh Kumar Singh (CUHP), Alfredo Vaz (Unicamp), Raluca Savu (Unicamp) e Stanislav Moshkalev (Unicamp).
Fotos dos autores do artigo. A partir da esquerda do leitor, Rajesh Kumar (Unicamp), Rajesh Kumar Singh (UCHP), Alfredo Vaz (Unicamp), Raluca Savu (Unicamp) e Stanislav Moshkalev (Unicamp).

Artigo em destaque: Material avançado para supercapacitores supercapazes.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: One-step electrodeposited 3D-ternary composite of zirconia nanoparticles, rGO and polypyrrole with enhanced supercapacitor performance. Alves, Ana Paula P.; Koizumi, Ryota; Samanta, Atanu; Machado, Leonardo D.; Singh, Abhisek K.; Galvao, Douglas S.; Silva, Glaura G.; Tiwary, Chandra S.; Ajayan, Pulickel M. NANO ENERGY, volume 31, January 2017, 225–232. DOI: 10.1016/j.nanoen.2016.11.018.

Material avançado para supercapacitores supercapazes

Supercapacitores são dispositivos de estocagem de eletricidade que apresentam a útil particularidade de liberarem grandes quantidades de energia em curtos intervalos de tempo. Já são usados, por exemplo, em veículos elétricos ou híbridos, flashes de câmeras fotográficas e elevadores, mas ainda podem ser aperfeiçoados – em grande parte, com a contribuição da Ciência e Tecnologia de Materiais – para as aplicações atuais e potenciais. Em um esquema bem simplificado, um supercapacitor é formado por dois eletrodos, o positivo e o negativo, separados por uma substância contendo íons positivos e negativos (o eletrólito).

Um artigo recentemente publicado no periódico científico Nano Energy (fator de impacto 11,553) apresenta uma contribuição de uma equipe científica internacional e interdisciplinar ao desenvolvimento de materiais que melhoram o desempenho de supercapacitores. Mediante um processo simples e facilmente escalável, o time de pesquisadores do Brasil, Estados Unidos e Índia fabricou eletrodos de um material compósito formado por polipirrol (PPi), óxido de grafeno reduzido (rGO) e nanopartículas de óxido de zircônio (ZrO2). Ao combinarem os três materiais, os cientistas conseguiram gerar um eletrodo com grande área superficial e alta porosidade – características fundamentais para promover a interação dos íons do eletrólito com a superfície dos eletrodos e, dessa maneira, potencializar o desempenho do supercapacitor.

“Nossa contribuição diferenciada foi a síntese, em uma única e simples etapa de eletrodeposição, de um híbrido contendo grafeno, óxido de zircônio e polipirrol e a demonstração experimental de ganhos consideráveis em propriedades eletroquímicas, em paralelo à modelagem teórica visando obter uma compreensão do papel dos componentes do material”, diz Glaura Goulart Silva, professora do departamento de Química da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e autora correspondente do artigo.

Além de preparar amostras do compósito ternário (ou seja, formado por três elementos) PPi/rGO/ZrO2, a equipe fabricou, usando o mesmo método e para fins de comparação, amostras do compósito binário PPi/rGO, e amostras de polipirrol puro. Os três materiais foram analisados usando as técnicas de XPS (espectroscopia de fotoelétrons excitados por raios X), MEV (microscopia eletrônica de varredura), espectroscopia Raman e microscopia eletrônica de transmissão, para determinar sua composição, estrutura e morfologia.

Como pode ser observado nas imagens de MEV da figura abaixo, os cientistas notaram que a adição de óxido de grafeno e nanopartículas de zircônia mudara significativamente a morfologia do material. Enquanto o polipirrol puro tinha formado um filme trincado e com aspecto de aramado, o compósito com grafeno possuía uma morfologia granulosa e sem fendas, e o material com óxido de zircônio se apresentava com aspecto semelhante ao de folhas.

Finalizando a parte experimental do estudo, os cientistas realizaram uma série de testes para medir o desempenho dos três materiais enquanto supercapacitores. Os resultados mostraram que a capacidade de armazenar cargas elétricas (capacitância) tinha aumentado até 100% no compósito ternário com relação ao polipirrol. Além disso, esse desempenho, em vez de diminuir devido ao uso do eletrodo, aumentara 5% depois de 1.000 recargas nos compósitos binário e ternário.

O artigo foi o primeiro a apresentar a introdução de nanopartículas de óxido de zircônio em eletrodos de polipirrol e grafeno para supercapacitores. Assim, a equipe realizou modelagens computacionais para analisar o papel do óxido de zircônio no desempenho do compósito. As simulações confirmaram os efeitos benéficos das nanopartículas na estabilidade do material, diretamente relacionada ao alongamento da vida útil dos eletrodos.

Esquema ilustrativo de armazenamento de carga e interação dos íons próximos à superfície dos eletrodos de polipirrol puro (PPi), con óxido de grafeno reduzido (PPi/rGO) e polipirrol, PPi/rGO/ZrO2 (acima), baseado na morfologia associada às imagens de MEV da superfície dos eletrodos com os respectivos materiais sob substrato de fibra de carbono (abaixo). Imagem feita por Ana Paula Pereira Alves para sua tese de doutorado.
Esquema ilustrativo de armazenamento de carga e interação dos íons próximos à superfície dos eletrodos de polipirrol puro (PPi), con óxido de grafeno reduzido (PPi/rGO) e polipirrol, PPi/rGO/ZrO2 (acima), baseado na morfologia associada às imagens de MEV da superfície dos eletrodos com os respectivos materiais sob substrato de fibra de carbono (abaixo). Imagem feita por Ana Paula Pereira Alves para sua tese de doutorado.

 

“O potencial destes novos compósitos para uso em supercapacitores é muito grande devido às necessidades de aumento da densidade de energia fornecida pelo dispositivo, em paralelo à sua miniaturização”, afirma a professora Goulart Silva. “A alternativa desenvolvida no trabalho em questão permite um melhor desempenho em termos de estabilidade à ciclagem com ganhos na direção da segurança do supercapacitor. O uso de supercapacitores e baterias nos carros elétricos e híbridos é uma das frentes tecnológicas onde estes materiais podem encontrar aplicação”, completa.

A partir da esquerda do leitor: a professora Glaura Goulart Silva (UFMG), o professor Pulickel Ajayan (Rice University) e Ana Paula Pereira Alves, doutora recém- diplomada pela UFMG.
A partir da esquerda do leitor: a professora Glaura Goulart Silva (UFMG), o professor Pulickel Ajayan (Rice University) e Ana Paula Pereira Alves, doutora recém- diplomada pela UFMG.

O trabalho faz parte do doutorado em Química de Ana Paula Pereira Alves, realizado com orientação da professora Goulart Silva e defendido em fevereiro deste ano na UFMG com uma tese sobre síntese e caracterização de materiais avançados para supercapacitores. Na universidade mineira, Pereira Alves realizou, no doutorado, um treinamento intensivo em técnicas de síntese e análise físico-química de polímeros conjugados e de grafenos e em caracterização de supercapacitores. Em 2015, ela partiu para os Estados Unidos para realizar um estágio “sanduíche” de um ano, com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), no departamento de Ciência dos Materiais e Nanoengenharia da Rice University, no grupo de pesquisa do professor Pulickel Ajayan (pesquisador com índice h=139 segundo o Google Scholar), que é colaborador do grupo da professora Goulart Silva desde 2010. “O professor Ajayan tem sistematicamente proposto inovações radicais em sínteses e design de baterias e supercapacitores, com grande impacto internacional na área”, comenta ela.

O trabalho experimental reportado no artigo foi realizado na Rice University, com a presença de todos os autores, inclusive os oriundos do Brasil e da Índia, sem omitir a própria professora Goulart Silva, que passou ali o mês de fevereiro de 2016 com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). “O ambiente altamente interdisciplinar do Department of Materials Science and NanoEngineering da Rice permitiu que engenheiros, físicos e químicos se reunissem para trabalhar em um problema de grande importância na atualidade”.

A modelagem computacional foi realizada por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) – entre eles, o professor Douglas Galvão (Unicamp), que mantinha uma colaboração científica com o professor Ajayan desde antes do início desta pesquisa.

“Em minha opinião este trabalho é um excelente exemplo de sucesso, onde a competência dos grupos brasileiros se uniu à de um grupo altamente produtivo e impactante no cenário internacional e se complementaram”, diz Goulart Silva. “A estabilidade e ampliação dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento no Brasil são essenciais para que exemplos de trabalhos como esse sejam corriqueiros. Pesquisa é um investimento que precisa ser feito a longo termo, sem retrocessos, para assim permitir uma alta taxa de retorno em termos de materiais, tecnologias e pessoas altamente qualificadas. Ana Paula Alves é agora uma jovem doutora em busca de oportunidade para construir seu grupo de pesquisa e assim formar novos estudantes e contribuir para enfrentar os desafios do nosso país”, completa a professora da UFMG.

Artigo em destaque: Muita ciência e uma dose de acaso para chegar à receita de um nanocompósito multifuncional.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: One material, multiple functions: graphene/Ni(OH)2 thin films applied in batteries, electrochromism and sensors. Eduardo G. C. Neiva, Marcela M. Oliveira, Márcio F. Bergamini, Luiz H. Marcolino Jr & Aldo J. G. Zarbin. Scientific Reports 6, 33806 (2016). doi:10.1038/srep33806. Link para o artigo: http://www.nature.com/articles/srep33806

 

Muita ciência e uma dose de acaso para chegar à receita de um nanocompósito multifuncional

boxnioh2Artigo recentemente publicado no periódico científico Scientific Reports, do grupo Nature, reporta um estudo realizado em universidades do estado do Paraná (Brasil) sobre um material baseado no hidróxido de níquel Ni(OH)2 – composto de grande interesse tecnológico [ver box ao lado]. A equipe de autores desenvolveu um método inovador para fabricar um material formado por grafeno e nanopartículas de hidróxido de níquel, fez filmes finos com esse material e demonstrou a eficiência desses filmes quando usados como eletrodos de baterias recarregáveis, sensores de glicerol e materiais eletrocrômicos.

O trabalho foi realizado dentro da pesquisa de doutorado de Eduardo Guilherme Cividini Neiva, sob orientação do professor Aldo José Gorgatti Zarbin, no Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Neiva começou a realizar trabalhos de pesquisa sobre nanopartículas de níquel na graduação, orientado pelo professor Zarbin. No mestrado, ainda com Zarbin, o estudante desenvolveu uma rota de preparação de nanopartículas de níquel metálico para aplicações eletroquímicas. Finalizado o mestrado, Neiva e Zarbin se propuseram a dar continuidade à pesquisa no doutorado de Neiva, incluindo o grafeno na preparação das nanopartículas de níquel metálico para obter nanocompósitos de níquel e grafeno com propriedades diferenciadas. “A maior parte dos meus interesses científicos estão voltados na preparação de materiais com nanoestruturas de carbono, como nanotubos e grafeno”, contextualiza o professor Zarbin, que assina o artigo da Scientific Reports como autor correspondente.

Os primeiros trabalhos no laboratório já surpreenderam a dupla. Na presença do óxido de grafeno (usado como precursor do grafeno na preparação do material), o processo tomava um rumo diferente. Nesse momento, Neiva e Zarbin enxergaram o potencial dessas particularidades: se bem compreendidas, poderiam ser controladas e utilizadas para preparar nanocompósitos, não apenas de níquel metálico, mas também de hidróxido de níquel, o que abriria novas possibilidades de aplicação. “Há uma frase que gosto muito, do Louis Pasteur, que se aplica perfeitamente nesse caso: “o acaso favorece as mentes bem preparadas””, diz Zarbin.

Partindo dessa base, orientando e orientador criaram um processo simples e direto para fabricação de nanocompósitos de grafeno e hidróxido de níquel. Nesse processo inovador, ambos os componentes são sintetizados em conjunto, em uma única reação de apenas uma etapa. Usando essa técnica, Neiva fabricou os nanocompósitos. Amostras de hidróxido de níquel puro também foram produzidas, para poder compará-las com os nanocompósitos.

As amostras foram estudadas por meio de uma série de técnicas: difração de raios X, espectroscopia Raman, espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FT-IR), termogravimetria, microscopia eletrônica de varredura com emissão de campo (FEG-MEV), e também por meio de imagens de microscopia eletrônica de transmissão (TEM) realizadas pela professora Marcela Mohallem Oliveira, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). A comparação entre os dois materiais foi favorável ao nanocompósito. “O grafeno teve papel fundamental na estabilização das partículas em escala nanométrica, no aumento da estabilidade química e eletroquímica das nanopartículas, e no aumento da condutividade do material, fundamental para uma melhora nas aplicações desejadas”, comenta Aldo Zarbin.

Aldo José Gorgatti Zarbin (à esquerda de quem olha) e Eduardo Guilherme Cividini Neiva, autores principais do trabalho, no equipamento FEG-MEV do Grupo de Química de Materiais da UFPR.
Aldo José Gorgatti Zarbin (à esquerda de quem olha) e Eduardo Guilherme Cividini Neiva, autores principais do trabalho, no equipamento FEG-MEV do Grupo de Química de Materiais da UFPR.

A etapa seguinte consistiu no processamento dos nanocompósitos e das nanopartículas de hidróxido de níquel puro para obter filmes finos, formato que possibilita seu uso nas aplicações desejadas. “Depositar materiais na forma de filmes, recobrindo diferentes superfícies, é um desafio tecnológico imenso, que se torna maior e mais desafiador quando se trata de materiais multicomponentes e materiais insolúveis, infusíveis e intratáveis (todas características do material reportado nesse artigo)”, explica Zarbin.

Para superar esse desafio, Neiva utilizou uma rota de processamento, chamada de método interfacial líquido/líquido, desenvolvida em 2010 pelo grupo de pesquisa liderado por Zarbin, o Grupo de Química de Materiais da UFPR. Essa rota, além de ser simples e barata, afirma o professor Zarbin, permite depositar materiais complexos na forma de filmes homogêneos e transparentes sobre vários tipos de materiais, incluindo plásticos. “Essa rota se baseia na alta energia existente na interface de dois líquidos imiscíveis (água e óleo, por exemplo), onde o material é inicialmente estabilizado para minimizar essa energia, possibilitando sua posterior transferência para substratos de interesse”, detalha o cientista.

Com os nanocompósitos, Neiva obteve filmes finos transparentes de cerca de 100 a 500 nm de espessura, com nanopartículas de cerca de 5 nm de diâmetro homogeneamente distribuídas sobre as folhas de grafeno. O hidróxido de níquel puro, diferentemente, gerou filmes formados por nanopartículas esféricas porosas de 30 a 80 nm de diâmetro, distribuídas de modo heterogêneo, formando aglomerados em algumas regiões.

Na fase final do trabalho, os filmes depositados sobre vidro e ITO (óxido de índio e estanho), foram testados em três aplicações, nas quais o nanocompósito teve desempenho superior ao hidróxido de níquel puro.  Enquanto material para eletrodos de baterias alcalinas recarregáveis, o nanocompósito apresentou alta energia e alta potência – dois pontos positivos que não é fácil encontrar num mesmo material. O nanocompósito também demonstrou uma boa performance como sensor eletroquímico. De fato, experimentos idealizados pelos professores Márcio Bergamini e Luiz Marcolino Jr, também da UFPR, mostraram que o nanocompósito é um sensor sensível de glicerol (composto conhecido comercialmente como glicerina e usado em várias indústrias). Finalmente, o nanocompósito agiu como eficiente material eletrocrômico. Com essas características, os filmes do grupo da UFPR têm chances sair do laboratório e fazer parte de produtos inovadores. “Isso depende de parceiros que se interessem em escalonar o método e testar em dispositivos reais”, diz Zarbin.

Por enquanto, além de artigos científicos como o publicado na revista Scientific Reports, o trabalho gerou várias patentes, tanto sobre o método de deposição dos filmes finos quanto sobre suas aplicações em sensores de gases, eletrodos transparentes, dispositivos fotovoltaicos e catalisadores. “E já desenvolvemos uma bateria flexível, que só foi possível graças à técnica de deposição de filmes que desenvolvemos”, complementa o professor Zarbin.

O trabalho, que foi desenvolvido dentro dos projetos macro “INCT de nanomateriais de carbono” e “Núcleo de Excelência em Nanoquímica e Nanomateriais”, contou com financiamento das agências federais Capes e CNPq, e da Fundação Araucária, de apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico do estado do Paraná.

 

Esta figura, enviada pelos autores do paper, condensa as principais contribuições do trabalho. No centro, um balão com dois líquidos e o filme na interface representa o método de processamento de filmes finos. À esquerda consta um esquema do filme, com as nanopartículas de hidróxido de níquel sobre a folha de grafeno. Logo à direita do balão, uma fotografia do filme depositado sobre um substrato de quartzo mostra a homogeneidade e transparência do filme (é possível ler um texto que está debaixo dele). Finalmente, à direita, de cima pra baixo, as três aplicações são mostradas através de uma curva de descarga (bateria), de uma curva de variação de transmitância pelo potencial aplicado (eletrocromismo) e de uma curva analítica mostrando a variação linear da intensidade da corrente em função da concentração de glicerol no meio (sensor).