Artigo em destaque: Projetando estruturas para manipular a luz.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Oxide-cladding aluminum nitride photonic crystal slab: Design and investigation of material dispersion and fabrication induced disorder. Melo, EG; Carvalho, DO; Ferlauto, AS; Alvarado, MA; Carreno, MNP; Alayo, MI. Journal of Applied Physics 119, 023107 (2016). DOI: 10.1063/1.4939773.

Projetando estruturas para manipular a luz

Cristais fotônicos são nanoestruturas que possibilitam a manipulação da luz visível e das demais formas de radiação eletromagnética, graças à organização de sua estrutura em padrões periódicos.

Além de haver materiais com essas características na natureza, como a opala, cristais fotônicos são criados pelo ser humano, podendo ser classificados como metamateriais. Suas características (materiais que os compõem, formato, dimensões) são projetadas com o objetivo de se conseguir o controle da luz. Por meio de processos de nanofabricação, essas estruturas se tornam reais e são utilizadas em diversos dispositivos chamados “nanofotônicos”. Todavia, a fabricação dessas estruturas não é tarefa simples.

Os autores do artigo. Da esquerda para a direita, posando no laboratório: professor Marcelo Nélson Paez Carreño, Emerson Gonçalves de Melo, Maria Elisia Armas Alvarado e professor Marco Isaías Alayo Chávez. Nas inserções: à esquerda, Daniel Orquiza de Carvalho e, à direita, André Santarosa Ferlauto.

Com um estudo baseado principalmente em simulações computacionais, uma equipe de cientistas de instituições brasileiras, liderada por pesquisadores da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EPUSP), gerou contribuições científicas que podem ser utilizadas para melhorar a fabricação de cristais fotônicos de modo a otimizar seu desempenho na manipulação de luz. “O trabalho apresenta uma análise bastante detalhada dos efeitos causados por processos de nanofabricação sobre as características ópticas de cristais fotônicos planares fabricados em nitreto de alumínio com cobertura de dióxido de silício”, diz Emerson Melo, primeiro autor de um paper sobre o trabalho, que foi recentemente publicado no prestigiado periódico Journal of Applied Physics (JAP).

“A ideia surgiu da oportunidade de combinar as excelentes características ópticas e físicas do nitreto de alumínio (AlN), tais como sua transparência em uma grande faixa de comprimentos de onda (do infravermelho próximo ao ultravioleta), seus efeitos não lineares e sua grande estabilidade a variações de temperatura, com as vantagens proporcionadas por cristais fotônicos, como a construção de guias de onda, curvas e cavidades ressonantes de alta eficiência em dimensões nanométricas, além dos diversos efeitos ópticos proporcionados por cristais fotônicos, como baixíssimas velocidades de grupo e intensificação dos efeitos não lineares dos materiais”, conta Emerson, que é estudante de doutorado em Microeletrônica – Fotônica na EPUSP, dentro do Grupo de Novos Materiais e Dispositivos do Laboratório de Microeletrônica do Departamento de Engenharia de Sistemas Eletrônicos. A pesquisa de doutorado de Emerson, cujo orientador é o professor Marco Isaías Alayo Chávez, visa ao estudo, fabricação e caracterização de dispositivos nanofotônicos como guias de onda, cavidades ressonantes, moduladores e chaveadores ópticos em cristais fotônicos de nitreto de alumínio.

O estudo que gerou o paper publicado no JAP iniciou com uma etapa experimental. Filmes finos de nitreto de alumínio e dióxido de silício (SiO2) foram fabricados pelo grupo da EPUSP e, com a colaboração de pesquisadores da UFMG e da UNESP, foram analisados por meio da técnica de elipsometria espectroscópica (VASE) a fim de obter suas funções dielétricas, as quais seriam usadas posteriormente como dados na investigação teórica.

À esquerda, diagrama de uma estrutura de cristal fotônico com alguns dos defeitos de fabricação estudados. À direita, diagrama da célula unitária do cristal fotônico ideal projetado pelos cientistas.

Depois, o grupo da EPUSP projetou um cristal fotônico, ideal em termos de desempenho e de possibilidades de fabricação, composto por uma camada de nitreto de alumínio entre duas camadas de dióxido de silício, com furos redondos dispostos em padrões que se repetem ao longo do “sanduíche”. Usando métodos analíticos e numéricos, os pesquisadores da USP simularam alguns “efeitos colaterais” dos processos de fabricação de cristais fotônicos desse tipo (por exemplo, variações nos tamanhos e posições dos furos) e analisaram teoricamente como essas imperfeições afetariam o desempenho do cristal fotônico.

A investigação teórica de Emerson e os outros pesquisadores da EPUSP concentrou-se nas imperfeições geradas nas duas etapas principais do processo de nanofabricação normalmente empregado em cristais fotônicos como o estudado: litografia por feixe de elétrons e corrosão seca assistida por plasma. “Os resultados apresentados permitem avaliar que o processo de litografia por feixe de elétrons tem maior influência no desempenho de dispositivos que exploram a dispersão da radiação eletromagnética através do cristal fotônico, tais como prismas, chaveadores e moduladores ópticos”, diz Emerson. “Já a qualidade do processo de corrosão seca tem um impacto mais profundo nas características de dispositivos em que são introduzidos defeitos pontuais ou lineares na rede periódica do cristal fotônico para inserir modos harmônicos na banda proibida fotônica. Nesse caso, a corrosão seca deverá ser muito bem controlada para fabricação de dispositivos nos quais guias de onda e cavidades ressonantes encontram-se entre seus principais elementos”, completa.

Além de avançar na compreensão do papel dos processos de nanofabricação de cristais fotônicos no desempenho de dispositivos nanofotônicos, os autores do paper conseguiram definir uma metodologia para projetar cristais fotônicos planares com núcleo e cobertura em filmes finos de materiais dielétricos. “A metodologia inclui o levantamento das funções dielétricas dos materiais através da técnica de elipsometria espectroscópica para a análise dos efeitos de dispersão dos materiais, a obtenção dos parâmetros geométricos que maximizam a banda proibida fotônica e a análise dos impactos causados por desvios introduzidos no processo de fabricação”, detalha Emerson.

A pesquisa teve apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

XV Brazilian Materials Research Society Meeting: aberta a submissão de trabalhos.

Está aberta, até 30 de maio, a submissão de resumos para apresentação de trabalhos na décima quinta edição do evento anual organizado pela Sociedade Brasileira de Pesquisa em Materiais (SBPMat). O evento será realizado de 25 a 29 de setembro deste ano na cidade de Campinas (SP), no centro de convenções Expo D. Pedro.

Interdisciplinar e internacional, o evento é dedicado à apresentação e discussão, em idioma inglês, dos avanços científicos e tecnológicos alcançados no campo dos materiais. Nas últimas edições, o encontro tem reunido cerca de 2.000 participantes de diversos pontos do Brasil e de dezenas de outros países.

Esta edição do evento conta com 21 simpósios temáticos, dentro dos quais pesquisadores e estudantes do Brasil e do exterior podem submeter resumos de seus trabalhos para apresentação oral ou em forma de pôster. Os simpósios cobrem um amplo leque de temas de pesquisa em Materiais, tais como: nanomateriais, biomateriais, superfícies, materiais orgânicos eletrônicos, eletrocerâmicas, metais avançados, nanocelulose, técnicas experimentais e computacionais para estudo de materiais, e desempenho de materiais sob condições extremas, entre outros. Nos temas dos simpósios também estão contempladas as aplicações dos materiais nos segmentos de energia, saúde, transporte, neurociências, eletrônica e fotônica, entre outros. Além dos simpósios temáticos, o evento inclui um workshop totalmente organizado por estudantes do programa University Chapters da SBPMat, que também aceita resumos, em assuntos como empreendedorismo, publicação de artigos científicos e ética científica.

Os melhores trabalhos de cada simpósio apresentados por estudantes de graduação ou pós-graduação serão destacados no final do evento com o Prêmio Bernhard Gross, que homenageia um dos pioneiros da pesquisa em Materiais no Brasil.

Os simpósios do XV Brazilian MRS Meeting são coordenados por pesquisadores da Alemanha, Brasil, Canadá, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Portugal e Suécia, entre outros países. As coordenadoras gerais do evento são as professoras da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Ana Flávia Nogueira (Instituto de Química) e Mônica Alonso Cotta (Instituto de Física).

Além das sessões nas quais se desenvolvem os simpósios mediante a apresentação dos trabalhos aceitos e das palestras convidadas, o evento terá oito palestras plenárias, nas quais cientistas internacionalmente renomados abordarão assuntos de grande impacto científico e social e mostrarão resultados que estão na fronteira do conhecimento.

Informações sobre o XV Brazilian MRS Meeting e sobre a cidade de Campinas, e instruções para envio dos resumos e para participação no Prêmio Bernhard Gross: http://sbpmat.org.br/15encontro/home/.

Boletim da SBPMat – edição 42.

 

Saudações %primeiro_nome%!

Edição nº 42 – 29 de fevereiro de 2016 

Notícias da SBPMat: XV Encontro - Campinas (SP), 25-29/09/2016 

Plenárias: Veja quem são os cientistas que proferirão as palestras plenárias em nosso evento e comece e se entusiasmar. Aqui.

Expositores: O contato para empresas interessadas em participar do evento com estandes e outras formas de divulgação é comercial@sbpmat.org.br (Alexandre).

Simpósios: A lista de simpósios aprovados para compor o evento será divulgada no site do encontro até o dia 07/03.

Datas importantes: A submissão de resumos estará aberta até 30 de maio. As notificações de aceitação de trabalhos serão enviadas aos autores até 10 de julho.

Local do evento:Veja vídeo sobre a cidade de Campinas e folder sobre o centro de convenções Expo D. Pedro.

Organizadores: Coordenam esta edição do evento as professoras da Unicamp Ana Flávia Nogueira (Instituto de Química) e Mônica Alonso Cotta (Instituto de Física “Gleb Wataghin”). Saiba quem são os membros da comissão local, aqui.

Notícias da SBPMat: diretoria e conselho 

Os membros da diretoria executiva e do conselho eleitos no final de 2015 tomaram posse de seus cargos no dia 29 de janeiro, em uma reunião realizada na cidade de Campinas. Conheça os cientistas que vão dirigir nossa sociedade nos próximos anos.

Artigo em destaque 

Em artigo publicado na Nanoscale, cientistas da UFRGS, com a colaboração de um pesquisador da Alemanha, reportaram um método “verde” para fabricação de nanopartículas feitas de uma liga de paládio e cobre. Os autores também comunicaram que a composição da nanoliga influi na sua capacidade de se oxidar e reduzir. Os resultados podem ser aplicados no design de nanomateriais mais eficientes para diversas aplicações. Veja nossa matéria de divulgação.

Gente da nossa comunidade 
Nosso entrevistado nesta edição é o professor Roberto Mendonça Faria (IFSC-USP). Apaixonado por desvendar mistérios dos materiais por meio da pesquisa científica, Faria fez contribuições significativas ao estudo dos polímeros ferroelétricos, polímeros eletrônicos e células solares orgânicas. Além de presidente da SBPMat e diretor do IFSC – USP, Faria já foi coordenador de um Instituto do Milênio, de um INCT e do polo São Carlos do IEA – USP. Na entrevista, ele nos falou sobre sua trajetória científica, as realizações conseguidas enquanto presidente da SBPMat e seus planos para o futuro imediato dentro da nossa sociedade e na internacional IUMRS, onde acaba de assumir a segunda vice-presidência. Na mensagem aos jovens, o professor Faria destacou a importância de “fabricar conhecimento”. Veja nossa entrevista.
Ruth Kiminami, professora do DEMa-UFSCar, é incluída em livro publicado pela Wiley que apresenta perfis de 100 mulheres cientistas e engenheiras de sucesso da área de cerâmica e vidro do mundo. Saiba mais.
Ex-presidentes da SBPMat Elson Longo e José Arana Varela constam entre os 50 pesquisadores atuantes no Brasil com mais citações segundo o Google Scholar. Saiba mais.
Especial: Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) 
Vários equipamentos de caracterização recebendo feixes de nêutrons para interagir com a matéria formarão o Laboratório Nacional de Nêutrons, que, após sua inauguração, prevista para 2022, estará aberto à comunidade científica dia e noite, 80% do ano. Os feixes de nêutrons virão do RMB, um reator nuclear de pesquisa de 30 MW, atualmente em desenvolvimento sob responsabilidade da CNEN. O laboratório ficará em Iperó (SP). Veja nossa matéria, com entrevista ao coordenador do projeto, José Augusto Perrotta.

Dicas de leitura
  • Estabilização de superóxido de lítio abre possibilidades de baterias com melhor desempenho (divulgação de artigo da Nature). Aqui.
  • Novo método de nanoescultura para fabricação de estruturas cristalinas de 1-2 nm usando STEM (divulgação de artigo da Small). Aqui. 
  • No mercado (ou quase): didímio metálico é obtido no Brasil pela primeira vez, possibilitando produção nacional de superímãs. Aqui.
Oportunidades
  • Curso online sobre escrita científica – produção de artigos de alto impacto, com videoaulas, apostilas e testes. Aqui.
Próximos eventos da área
  • 5th International Conference on Surface Metrology. Póznan (Polônia). 4 a 7 de abril de 2016.  Site.
  • 9th Brazilian-German Workshop on Applied Surface Science. Maresias, SP (Brasil). 10 a 15 de abril de 2016. Site.
  • 43rd International Conference on Metallurgical Coatings and Thin Films (ICMCTF). San Diego (EUA). 25 a 29 de abril de 2016. Site.
  • 5ª escola de SAXS. Campinas, SP (Brasil). 2 a 6 de maio de 2016. Site.
  • 40th WOCSDICE ‐ Workshop on Compound Semiconductor Devices and Integrated Circuits held in Europe & 13th EXMATEC ‐ Expert Evaluation and Control of Compound Semiconductor Materials and Technologies. Aveiro (Portugal). 6 a 10 de junho de 2016. Site.
  • Photonic Colloidal Nanostructures: Synthesis, Properties, and Applications (PCNSPA Conference 2016). São Petersburgo (Rússia). 27 de junho a 1 de julho de 2016.  Site.
  • 1st International Symposium on Advanced Photonic Materials. São Petersburgo (Rússia). 27 de junho a 1º de julho de 2016. Site.
  • XXV International Conference on Raman Spectroscopy (ICORS2016). Fortaleza, CE (Brasil). 14 a 19 de agosto de 2016.  Site.
  • XV Encontro da SBPMat. Campinas, SP (Brasil). 25 a 29 de setembro de 2016. Site.
  • Aerospace Technology 2016. Estocolomo, Suécia. 11 a 12 de outubro de 2016. Site.
      
Você pode divulgar novidades, oportunidades, eventos ou dicas de leitura da área de Materiais, e sugerir papers, pessoas e temas para as seções do boletim. Escreva para comunicacao@sbpmat.org.br.
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Artigo em destaque: Domando a reatividade de nanoligas.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Charge transfer effects on the chemical reactivity of PdxCu1−x nanoalloys. M. V. Castegnaro, A. Gorgeski, B. Balke, M. C. M. Alves and J. Morais. Nanoscale, 2016,8, 641-647. DOI: 10.1039/C5NR06685A.

Domando a reatividade de nanoligas

Quando, em 2009, o grupo do Laboratório de Espectroscopia de Elétrons (LEe-) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) decidiu começar a desenvolver “em casa” as nanopartículas metálicas que necessitava para seus estudos, deparou-se com alguns problemas. Muitos dos métodos de síntese reportados na literatura científica não forneciam os resultados esperados ao serem realizados no laboratório gaúcho.

Autores do trabalho. Da esquerda para direita e de cima para baixo: Marcus Vinicius Castegnaro, Andreia Gorgeski, dr. Benjamin Balke, professora Maria do Carmo Martins Alves e professor Jonder Morais.

Motivados fortemente pela curiosidade, como sempre, relata o professor Jonder Morais, pesquisador do LEe-, os membros do grupo conseguiram, depois de muita dedicação, desenvolver novas rotas de síntese que, além de reprodutíveis, são amigáveis com o meio ambiente, eficientes e de baixo custo. “Os primeiros artigos começaram a ser publicados em revistas internacionais em 2013, inicialmente com nanopartículas de paládio (Pd), platina (Pt) e prata (Ag) aplicadas à decomposição catalítica do óxido nítrico. Na sequência, publicamos alguns trabalhos focados em estudos in situ, que visam determinar os mecanismos de formação e crescimento de nanopartículas monometálicas. Recentemente começamos a relatar resultados obtidos com sistemas mais complexos, como as nanoligas de paládio e cobre (Pd-Cu)”, conta o professor Morais.

Nesse último grupo se inserem os resultados recentemente reportados em um artigo publicado na prestigiada revista Nanoscale, cujos autores principais são o professor Jonder Morais e Marcus Vinicius Castegnaro, estudante do curso de doutorado em Física da UFRGS orientado por Morais. A pesquisa englobou desde a produção dos nanomateriais até a sondagem de suas aplicações. “Foi fundamental contar com alunos dedicados, dispostos a enfrentar o desafio de preparar rigorosamente suas próprias amostras, e correlacionar as propriedades eletrônicas e estruturais para entender as propriedades finais em termos de reatividade química”, comenta Morais.

No trabalho publicado na Nanoscale, nanopartículas compostas por ligas de paládio e cobre foram produzidas aplicando um método simples, desenvolvido pela equipe do LEe-. Esse processo é realizado em condições amenas para o meio ambiente e a saúde (meio aquoso, temperatura e pressão ambiente, e uso de substâncias inócuas e baratas como o ácido ascórbico e o citrato de sódio). Várias amostras foram sintetizadas por essa rota, contendo três quantidades diferentes de átomos de paládio e cobre.

As nanopartículas sintetizadas passaram por uma série de análises realizadas na UFRGS, na cidade de Porto Alegre, viajaram a Campinas para outra série de análises em equipamentos do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e atravessaram o oceano até a Universidade Johannes Gutenberg, na Alemanha, para realização de algumas medidas complementares. A partir da caracterização, os autores do estudo concluíram que as nanopartículas tinham um tamanho de, aproximadamente, 4 nm e eram altamente cristalinas, entre outras características. Além disso, por meio de experimentos realizados pela técnica de XANES in situ, a equipe de cientistas expôs as nanopartículas a monóxido de carbono (CO) a 450 °C e sondou a reatividade das nanoligas, ou seja, sua capacidade de reagirem quimicamente.

Depois de estudarem os resultados da caracterização, os autores do artigo puderam concluir que a composição da liga influi na capacidade das nanoligas de se reduzirem (ganharem elétrons) e de se oxidarem (perderem elétrons). De fato, quanto maior a quantidade de paládio, a redução ocorre com mais facilidade, e a oxidação, com mais dificuldade.

Esquema representativo da correlação entre a transferência parcial de carga entre os átomos de Pd e Cu (observada por XPS) e a reatividade frente à exposição a CO (sondada por XANES in situ) para as nanoligas Pdx¬Cu1-x. Observou-se que quanto maior a quantidade de Pd presente na nanoliga, maior é a reatividade da amostra frente à redução por CO, e maior é a resistência à oxidação dos átomos que a compõem.

“Os resultados publicados, obtidos pela associação de diversas técnicas experimentais, são relevantes para a compreensão da origem da alta reatividade catalítica de nanoligas de paládio e cobre (Pd-Cu), bem como para elucidar comportamentos similares apresentados por outros sistemas bimetálicos”, destaca Jonder Morais. “Principalmente, tais resultados podem ser utilizados no “design” de novos nanomateriais mais eficientes para diversas aplicações, como por exemplo, na indústria petroquímica, em células a combustível ou no controle da emissão de gases poluentes”, conclui.

Reator Multipropósito Brasileiro: um laboratório nacional de nêutrons para a comunidade de pesquisa em Materiais.

Prédio do reator e laboratórios.

No final de setembro de 2015, no contexto do XIV Encontro da SBPMat, cerca de 40 pesquisadores da área de Materiais participavam de um simpósio sobre o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), projeto que está sendo desenvolvido pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e que, quando inaugurado em Iperó (SP), agregará uma importante ferramenta de pesquisa às atuais facilidades de que o Brasil dispõe.

De fato, o RMB fornecerá feixes de nêutrons que, na interação com amostras e com a mediação de diversas técnicas experimentais, poderão fornecer informações únicas sobre a estrutura dos materiais. Para isso, o projeto RMB prevê a construção de uma série de laboratórios com equipamentos de difratometria (de alta resolução, de alta intensidade, Laue, de tensão residual); espalhamento de baixo ângulo; análise de gamas prontos; espectrometria de três eixos e neutrongrafia, entre outras técnicas. Essa infraestrutura de pesquisa deve constituir um laboratório aberto à comunidade científica e funcionando dia e noite, mais de 300 dias por ano: o Laboratório Nacional de Nêutrons.

Como seu nome indica, o RMB atenderá vários objetivos. Além de fornecer feixes de nêutrons para pesquisa científica, será usado em testes de irradiação de materiais e combustíveis utilizados em usinas nucleares geradoras de eletricidade e submarinos propulsados por reatores nucleares, por exemplo. O reator também terá a importante missão de produzir radioisótopos e fontes radioativas para a saúde, indústria, agricultura e meio ambiente, substituindo importações e até mesmo gerando exportações.

Entrevista com o coordenador técnico

Para explicar com um pouco mais de detalhe o projeto RMB, e, em particular, suas aplicações na Ciência e Tecnologia de Materiais, entrevistamos José Augusto Perrotta, coordenador técnico do empreendimento RMB. Mestre em Engenharia Nuclear pelo Instituto Militar de Engenharia (IME) e doutor em Tecnologia Nuclear pela Universidade de São Paulo (USP), Perrotta trabalha como tecnologista na CNEN desde 1983.

Boletim da SBPMat: – Comente brevemente todas as possibilidades que o futuro RMB oferecerá à comunidade de Ciência e Tecnologia de Materiais. De que maneira os feixes de nêutrons poderão ser aproveitados para pesquisa e desenvolvimento nessa área?

Núcleo de produção e pesquisa.

José Perrotta: – O RMB é um empreendimento que possui como parte central um reator nuclear de pesquisa multipropósito e vários laboratórios para realizar as pesquisas, serviços e produtos propostos.

O reator foi concebido com um alto fluxo de nêutrons para:

  1. Produzir radioisótopos na qualidade e quantidade necessárias às aplicações brasileiras;
  2. Ter capacidade de irradiar e testar combustíveis nucleares utilizados nas várias aplicações e condições de irradiação do programa nuclear brasileiro;
  3. Ter capacidade de irradiar materiais com nêutrons e verificar seu desempenho sob irradiação;
  4. Ter possibilidade de irradiar amostras para realizar análise química por ativação de nêutrons;
  5. Extrair feixes de nêutrons para pesquisas de estrutura de materiais em várias áreas de aplicação.

Com relação ao item (ii), o reator é preparado para receber amostras de combustíveis e circuitos de irradiação que simulem as condições de reatores PWR, ou seja, testar combustíveis dos reatores de potência utilizados ou desenvolvidos no país.

Com relação ao item (iii), dentro do núcleo do reator existem duas posições com alto fluxo de nêutrons para irradiação de materiais. Nessas posições podem ser colocadas amostras em cápsulas com ambiente (temperatura e meio da inserção da amostra) controlado. Nessas posições podem ser testadas amostras de materiais estruturais e amostras de componentes de reatores de potência utilizados no país.

O reator e infraestrura do reator (piscinas, células quentes e blindagens de transporte) são projetados para atendimento dos dois itens anteriores (ii e iii).

Um Laboratório de Análise Pós-Irradiação está projetado com células quentes e toda infraestrutura para análises mecânicas, físicas e de microscopia das amostras irradiadas, tanto para as amostras de combustíveis irradiados quanto de materiais estruturais.

Com relação ao item (iv), está projetado um laboratório de radioquímica e análise por ativação. O laboratório é conectado ao reator por tubos pneumáticos que permitem enviar amostras para irradiação no reator e trazê-las de volta ao laboratório para análise. Foram definidas várias posições de irradiação no reator, variando a gama de fluxo de nêutrons em que as irradiações podem ser realizadas. O laboratório possui células quentes para recebimento e manuseio das amostras irradiadas antes de sua destinação aos equipamentos de análise (radioquímica ou espectrometria gama). O laboratório será gerenciado como um laboratório nacional o que permitirá sua utilização pela comunidade científica brasileira.

Com relação ao item (v), o reator está projetado com um tanque refletor de água pesada que, mecanicamente, permite a extração de feixe de nêutrons. Esses nêutrons são térmicos e para obter nêutrons frios está projetado um pequeno tanque com deutério a 19 ºK (fonte fria). Serão extraídos nêutrons térmicos em duas posições, e nêutrons frios em outras duas posições. Cada tubo de extração pode conter até três guias de nêutrons. Essas guias conduzirão o feixe de nêutrons para posições em um saguão de experimentos no prédio do reator, e para um prédio chamado prédio das guias de nêutrons. Nessas guias de nêutrons poderão ser acoplados os equipamentos de base científica e tecnológica para as análises das amostras com o feixe de nêutrons. Existe um tubo de extração adicional de nêutrons térmicos para realizar imagens com feixe de nêutrons (neutrongrafia). O saguão de experimentos no prédio do reator e o prédio de guias formarão o que denominamos “Laboratório Nacional de Nêutrons”.

Boletim da SBPMat: – Haverá estações experimentais para Ciência e Tecnologia de Materiais, análogas às do LNLS? Quais? Estarão abertas a toda a comunidade científica? Operarão constantemente enquanto o reator estiver funcionando?

José Perrotta: – As linhas de nêutrons, como mencionado são cinco: três com nêutrons térmicos e 2 com nêutrons frios. Quatro das linhas podem ter até três guias. Nessas guias serão colocados os equipamentos (ou estações) experimentais.

As seguintes estações podem vir a ser utilizadas no início de operação do Laboratório Nacional de Nêutrons (LNN):

  1. Prédio das Guias de Nêutrons.
  • Para nêutrons térmicos: Difratômetro de Alta Resolução; Difratômetro de Alta Intensidade; Difratômetro Laue; Difratômetro de Tensão Residual
  • Para nêutrons frios: Espalhamento de Baixo Ângulo; Análise de Gamas Prontos
  1. Saguão de Experimentos no Prédio do Reator.
  • Nêutrons Térmicos: Espectrômetro de Três Eixos; Neutrongrafia
A tabela apresenta a potência de outros reatores nucleares de pesquisa do mundo. O RMB terá 30 MW. Dados fornecidos por José Perrotta.

O RMB trará para a comunidade de pesquisa do país um importante laboratório de utilização de feixe de nêutrons. Este laboratório, por suas características técnicas, é complementar ao Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que também tem um projeto de grande vulto que é o Sirius. É proposta do empreendimento RMB que o Laboratório de Feixe de Nêutrons seja, a exemplo do LNLS, um laboratório nacional. Isto facilitará o acesso da sociedade científica brasileira à instalação.

O funcionamento das linhas de nêutrons está associado à operação do reator. O reator operará 24 horas por dia, em ciclos de 25 a 28 dias, de forma a atingir uma disponibilidade superior a 80% do tempo anual (acima de 300 dias em operação plena). O LNN poderá operar durante todo esse tempo.

Um ponto importante é que o LNN terá independência operacional em relação à operação do reator, ou seja, a operação do reator oferece o feixe de nêutrons e não interfere na operação do LNN.

Boletim da SBPMat: – Do ponto de vista da Ciência e Tecnologia dos Materiais, quais serão as vantagens do futuro RMB com relação aos demais reatores que atualmente existem no Brasil?

José Perrotta: – O Brasil possui quatro reatores nucleares de pesquisa em operação. O mais antigo, e também o de maior potência (5 MW), é o reator IEA-R1 do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) em São Paulo que foi inaugurado em 1957. Outros dois reatores de pesquisa de baixa potência, o reator IPR-R1 do Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear (CDTN) em Belo Horizonte (100 kW) e o reator Argonauta do Instituto de Engenharia Nuclear (IEN) no Rio de Janeiro (500 W), foram construídos na década de 60. Esses três reatores, de projetos norte-americanos, foram construídos dentro dos campi universitários da USP, UFMG, e UFRJ, respectivamente, e originaram os principais institutos de pesquisas nucleares da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), os quais se desenvolveram à proporção do tamanho dos reatores e de suas aplicações. Esses reatores e os institutos da CNEN que cresceram ao seu redor foram fundamentais no desenvolvimento e utilização de tecnologia nuclear que temos hoje no país, e na formação dos recursos humanos associados. O quarto reator nuclear de pesquisa, o reator IPEN/MB-01 localizado no IPEN, é uma instalação do tipo unidade crítica (100 W) e foi construído na década de 80, já com tecnologia nacional, visando o desenvolvimento autônomo da tecnologia para reatores nucleares de potência.

O reator do RMB é de 30 MW e possui concepção e projeto modernos. Os reatores hoje existentes no país não possuem fluxos de nêutrons para garantir operação comercial ou características adequadas para uma pesquisa de alto nível. Além de ser uma instalação mais moderna, o fluxo de nêutrons do RMB é uma ordem de grandeza superior ao do reator IEA-R1 e possui funções que hoje não são atendidas por esse reator. Os outros três reatores são de baixíssimo fluxo de nêutrons.

Boletim da SBPMat: – Você poderia estimar quando ocorreria a inauguração do RMB e seus laboratórios de pesquisa?

José Perrotta: – O empreendimento RMB pode ser executado em um período de 6 a 7 anos. No estágio atual de desenvolvimento isto ocorreria em 2022, caso sejam disponibilizados os recursos integrais para o projeto. É importante destacar que, além da necessidade de recursos financeiros intensivos para sua realização, o empreendimento, por ter instalações nucleares e radiativas, requer licenças ambientais e nucleares para sua construção e operação. Isso implica em tempos adicionais para sua implantação.

Financiadores e parceiros no desenvolvimento do RMB

A execução do projeto do RMB ocorre sob responsabilidade da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). O empreendimento é coordenado pela Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento da CNEN e desenvolvido por meio de seus institutos de pesquisa: Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), Instituto de Engenharia Nuclear (IEN), Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN), Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste (CRCN-NE) e Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD).

Ao longo das etapas de desenvolvimento do RMB, a CNEN conta e contará com parcerias e contratação de empresas nacionais e estrangeiras. Alguns dos parceiros que participaram até o momento: a Marinha do Brasil e o governo do Estado de São Paulo, na cessão do terreno onde será localizado o RMB; o Centro de Tecnologia da Marinha em São Paulo (CTMSP), e a Comissão Nacional de Energia Atômica (CNEA) da Argentina que desenvolve o reator nuclear de pesquisa RA-10, similar ao RMB, na Argentina. Empresas contratadas: a empresa argentina INVAP, que projetou o reator de pesquisa OPAL da Austrália, e a empresa brasileira Intertechne desenvolveram o projeto básico de engenharia do empreendimento.

Com custo estimado em US$ 500 milhões, o RMB é patrocinado pelo Governo Federal através do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação (MCTI).

Gente da nossa comunidade: entrevista com o pesquisador Roberto Mendonça Faria.

O entrevistado desta edição do Boletim da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Materiais (SBPMat) é o professor Roberto Mendonça Faria, que acaba de entregar a presidência da SBPMat depois de 4 anos de mandato (mas promete permanecer ativo na sociedade).

Roberto Mendonça Faria nasceu em Adamantina, uma pequena cidade localizada no oeste do estado de São Paulo, em maio de 1952. No início dos estudos secundários, já orientado para as Exatas e estimulado por um bom professor de Física, ele começou a olhar a ciência como possível profissão. Em 1976, Faria concluía o bacharelado em Física na Universidade de São Paulo (USP).

No mesmo ano, ainda apaixonado por essa área na qual a humanidade estava dando grandes passos no caminho do conhecimento, Faria iniciou sua carreira acadêmica. Começou a lecionar em cursos de graduação da USP e entrou no curso de mestrado em Física dessa universidade. Ali, orientado pelo professor Bernhard Gross, pioneiro da pesquisa em Materiais no Brasil, aprendeu os pilares da atividade científica e desenvolveu um fascínio por desvendar mistérios dos materiais (no caso a condutividade induzida por radiação no polímero conhecido como Teflon). Logo após a obtenção do diploma de mestre, em 1980, começou o curso de doutorado em Física da USP, mais uma vez contando com o professor Gross como orientador. Em 1984, defendeu sua tese sobre absorção dielétrica e condutividade induzida por radiação no polímero PVDF.

Em 1985 começou a dar aulas em cursos de pós-graduação da USP. Entre 1987 e 1989, permaneceu na França em estágio de pós-doutorado na Université Montpellier 2. Em 1990, obteve o título de livre-docente pela USP, em concurso público, após defender uma tese sobre transições de fase em copolímeros ferroelétricos. Em 1999, tornou-se professor titular do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, onde ocupou diversos cargos de gestão ao longo dos anos, como a chefia do departamento de Física e Ciência dos Materiais (1994-1996), a coordenação do programa de pós-graduação em Física (1997-1998) e a direção geral do IFSC (2002 – 2006).

Roberto Faria também foi coordenador de dois projetos de grande porte em nível nacional. O primeiro foi o Instituto Multidisciplinar de Materiais Poliméricos do Milênio, um dos 17 projetos selecionados dentro do Programa Institutos do Milênio do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Esse instituto reuniu cerca de 140 pesquisadores de 17 instituições das cinco regiões do país e vigorou entre 2002 e 2008. O segundo projeto deu continuidade a um dos focos de pesquisa do primeiro, o estudo dos polímeros eletrônicos e suas aplicações. Iniciado em 2009, o Instituto Nacional de Eletrônica Orgânica foi aprovado e estabelecido no contexto do programa Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) do MCT.

Indo além das fronteiras da sua área de atuação científica, Faria foi coordenador, entre 2010 e 2014, do polo de São Carlos do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, órgão destinado à pesquisa e discussão abrangente e interdisciplinar de questões fundamentais da ciência e da cultura. Além disso, no contexto de seu interesse em contribuir com o desenvolvimento econômico do país por meio da pesquisa, coordenou a realização do livro “Ciência, Tecnologia e Inovação para um Brasil competitivo”, publicado em 2012.

Nos últimos anos, Faria tem tido ativa participação em entidades científicas internacionais da área de Materiais. Em 2014, foi um dos coordenadores gerais do evento “Spring Meeting of the European Material Research Society – 2014“, realizado na cidade francesa de Lille. Em 2015, foi eleito segundo vice-presidente da International Union of Materials Research Societies(IUMRS).

Faria é membro da Academia de Ciência do Estado de São Paulo e da Academia Brasileira de Ciências, e pertence ao conselho editorial da revista “Materials Science – Poland”. Em 40 anos de pesquisa científica em materiais poliméricos, particularmente aqueles com atividade eletrônica e suas aplicações em dispositivos, o professor Faria produziu cerca de 180 artigos publicados em periódicos indexados, contando com cerca de 2.000 citações, e orientou 47 dissertações de mestrado e teses de doutorado.

Segue uma entrevista com o pesquisador.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar na área de Materiais.

Roberto Mendonça Faria: – Antes do de cursar o Científico, atual Ensino Médio, imaginava seguir a área das Exatas (como na época eram chamadas as Engenharias, a Física, a Química, a Matemática, etc.), porém não tinha nenhuma pretensão de fazer uma carreira científica, muito menos de ser um cientista. Contudo, já no primeiro ano do Científico comecei a mudar de ideia, estimulado por um excelente professor de Física, Roberto Stark. Formei-me em Física e logo tive a sorte de ter sido guiado por dois grandes mestres: o professor Bernhard Gross e o professor Guilherme Fontes Leal Ferreira. Como todo recém-formado em física da minha época, eu era apaixonado pelos extraordinários avanços experimentais e teóricos da física do século XX. Porém, meu primeiro trabalho de investigação foi sobre um tema aparentemente modesto: a interação da radiação ionizante com filmes finos de polímeros isolantes. Sob a orientação do professor Gross aprendi definitivamente como abordar um problema científico e também a manejar o rigor metodológico necessário para desvendar os efeitos e fenômenos que surgiam dos experimentos realizados. Esses primeiros anos de pesquisa foram de crucial importância para minha carreira. Nunca mais perdi o fascínio em desvendar as propriedades e os enigmas da matéria condensada, e fico feliz porque a Ciência e a Engenharia dos Materiais é de muita importância para o desenvolvimento do Brasil.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais?

Roberto Mendonça Faria: – Há diferentes maneiras de se medir as contribuições ao avanço do conhecimento científico e tecnológico. A visão mais objetiva e mais seguida internacionalmente é a bibliométrica conduzida pelo Journal of Citation Reports (JCR) da Thomson Reuters. Essa métrica tem muitos méritos, mas é exageradamente numerológica. Outro fato que pesa nas avaliações científicas vem do pragmatismo do mundo atual. Hoje exige-se que os trabalhos científicos estejam voltados a aplicações específicas. Nesse contexto, as pesquisas que envolvem estudos mais fundamentais tendem a perder a visibilidade que merecem. Ou seja, trabalhos científicos de grande valor muitas vezes são pouco citados. Uma análise da minha produção a partir da JCR pode levar à conclusão de que minhas contribuições mais relevantes estão ligadas a aplicações, mas eu particularmente acho que as minhas maiores contribuições estão mais relacionadas a trabalhos fundamentais nas áreas de transição de fase de polímeros ferroelétricos e de mecanismos de transporte elétricos em polímeros eletrônicos.

Uma das áreas interessantes que tenho trabalhado nos últimos anos é a de células solares orgânicas. Junto com meu grupo de pesquisa, creio que demos uma contribuição significativa à compreensão de fenômenos envolvendo o transporte de portadores elétricos no interior da célula. Publicamos dois trabalhos de 2013 para cá nos quais desenvolvemos uma equação analítica que governa a curva de corrente elétrica em função da voltagem de uma célula solar quando sob iluminação. Essa equação analítica vale muito bem em casos especiais, e explicou muitos dos efeitos optoeletrônicos dos dispositivos que construímos e medimos em nossos laboratórios. Um dos trabalhos foi publicado na revista Applied Physics Letters, em 2013, e o outro na Solar Energy Materials and Solar Cells, em 2015.

Por outro lado, sempre me dediquei a montar laboratórios de pesquisa e a formar recursos humanos. Venho também contribuindo com vários programas de pós-graduação, direta e indiretamente, e tenho me dedicado há mais de vinte anos ao fortalecimento da área de Eletrônica Orgânica no país, sobretudo na formação de uma rede de pesquisa nessa área: o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Eletrônica Orgânica. Procuro sempre que possível incentivar projetos de parcerias com a iniciativa privada e com institutos de pesquisa que visam projetos aplicados. Na área de políticas públicas creio que minha participação maior foi a de coordenar o documento da CAPES com a SBPC, denominado “Ciência, Tecnologia e Inovação para um Brasil Competitivo” que contribuiu à criação da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPII).

Boletim da SBPMat: – Você acaba de concluir seu mandato como presidente da SBPMat, função que exerceu durante 4 anos. Compartilhe com nossos leitores uma análise dos resultados conseguidos pelas diretorias que você presidiu.

Roberto Mendonça Faria: – A SBPMat é uma sociedade relativamente nova, mas tem uma missão importante a realizar em prol do desenvolvimento do país. O Brasil dispõe de uma riqueza extraordinária que a ele é oferecida pela natureza. Porém, o país pouco se aproveita dessa riqueza porque coloca pouco conhecimento sobre seus recursos naturais. Houve uma revolução na agricultura depois que o país resolveu colocar conhecimento sobre essa dádiva que a natureza lhe ofereceu. Hoje o agronegócio é um dos pilares, talvez o mais forte, da nossa economia. Temos que fazer o mesmo com as matérias-primas que abundam em nosso território. A publicação “Science Impact – A special report on materials science in Brazil”, em parceria com o Institute of Physics (IOP) , foi um dos projetos que deu certo e que me gratificou muito. Esse tipo de iniciativa ajuda a criar consciência de que o Brasil tem vocação natural para ser líder em vários segmentos relacionados a Materiais, e gerar muito mais riqueza do que gera atualmente.

Outra valiosa contribuição que as duas gestões anteriores da SBPMat deram à Ciência e Engenharia de Materiais no Brasil foi a consolidação e internacionalização definitiva do encontro anual, que sempre é realizado no final de setembro.

Não posso deixar de destacar que a criação do Boletim Eletrônico bilíngue foi uma realização que deu certo, principalmente pela competência com que vem sendo produzido.

Boletim da SBPMat: – Você acaba de assumir, por dois anos, a segunda vice-presidência da IUMRS. Comente seus planos, expectativas…

Roberto Mendonça Faria: – Estou iniciando essa atividade. Meus planos são, em primeiro lugar, inserir cada vez mais a Ciência dos Materiais brasileira no cenário internacional. Ao mesmo tempo, pretendo usar o apoio da IUMRS para estimular a pesquisa de materiais em outros países da América Latina. O Brasil e a América Latina têm muitos problemas que são oriundos de suas economias ainda deficientes. Tenho convicção de que pesquisas em áreas de materiais são instrumentos valiosos para melhorar as condições de vida dessas populações. Hoje, como membro do Conselho da SBPMat, quero, com o auxílio da IUMRS, levar essa discussão não só no Brasil, mas em vários países da América Latina.

Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas.

Roberto Mendonça Faria: Deixei para registrar aqui que uma das realizações (ainda em andamento) que traz orgulho à nossa gestão foi a criação do programa University Chapters . Vou pedir ao Conselho que me permita trabalhar em conjunto com o professor Rodrigo F. Bianchi dentro desse programa. Não tenho dúvidas de que quanto mais pesquisadores formarmos, mais o Brasil ganhará com isso.

Acredito que o trabalho junto aos jovens que estão iniciando a atividade científica é um dos mais valiosos para um pesquisador sênior. Temos o dever de mostrar aos jovens o quanto é importante para o país o trabalho de “fabricar conhecimento”, sobretudo nas áreas científicas e tecnológicas. Não há ainda um só exemplo de país que tenha erradicado a pobreza sem que tenha desenvolvido uma educação forte e uma ciência e tecnologia competitiva. Portanto, fica aos jovens a mensagem de acreditarem no seu trabalho e de procurar sempre realizá-lo da forma mais competente possível.

Boletim da SBPMat – edição 41.

 

Saudações %primeiro_nome%!

Edição nº 41 – 29 de janeiro de 2016 

Notícias da SBPMat: XV Encontro - Campinas (SP), 25-29/09/2016 

Simpósios: A organização do evento está recebendo, até o dia 03/02, propostas de simpósios em temas de Ciência e Tecnologia de Materiais. A submissão de propostas é aberta à comunidade científica. Saiba mais.

Local do evento: Veja, no site no evento, o vídeo sobre a cidade de Campinas e o folder sobre o centro de convenções Expo D. Pedro. 

Organizadores: Coordenam esta edição do evento as professoras da Unicamp Ana Flávia Nogueira (Instituto de Química) e Mônica Alonso Cotta (Instituto de Física “Gleb Wataghin”). Saiba quem são os membros da comissão local, aqui.

Artigo em destaque 

O desempenho de células solares orgânicas, dispositivos capazes de gerar eletricidade a partir da luz do sol, pode ser analisado de maneira mais precisa a partir de um estudo totalmente desenvolvido no Instituto de Física de São Carlos, da USP. O trabalho incluiu uma série de experimentos e a elaboração de um modelo analítico, e gerou um artigo publicado no periódico Solar Energy Materials and Solar CellsVeja nossa matéria de divulgação.

Gente da nossa comunidade 
Entrevistamos Osvaldo Novais de Oliveira Junior, professor da USP no Instituto de Física de São Carlos, que assume hoje a presidência da SBPMat. Conversamos com ele sobre sua história, carreira e planos para a SBPMat. Osvaldo Novais não pertence ao grupo de pessoas que descobre cedo uma vocação profissional, mas isso não o impediu de desenvolver uma carreira científica com ótimos resultados, como um índice H de 53. Apaixonado pelo conhecimento, ele fez contribuições importantes na área de Materiais, em particular no estudo e aplicação de filmes de Langmuir e no desenvolvimento de línguas eletrônicas, além de participar da criação do primeiro software para revisão gramatical do português e de estudar e divulgar como escrever bons papers em inglês. Em uma mensagem aos mais jovens, o cientista frisou a importância do domínio das linguagens (português, inglês, matemática) como base para uma aprendizagem contínua. Veja nossa entrevista.
Edgar D. Zanotto e Victor C. Pandolfelli, ambos professores titulares do Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar, receberam homenagem especial do Magnífico Reitor, professor Targino de Araújo Filho, na cerimônia de encerramento das festividades dos 45 anos da UFSCar. Saiba mais.
Dicas de leitura
  • Foi fabricado pela primeira vez o borofeno: material bidimensional metálico, condutor, feito de átomos de boro (divulgação de artigo da Science). Aqui.
  • Estranho, mas real: estruturas que se expandem volumetricamente tanto ao ser esticadas quando ao ser comprimidas (divulgação de artigo da Nature Materials, seçao “News and views”, coassinado por pesquisador da Unicamp). Aqui.
  • Materiais para saúde: respondendo ao estímulo de luz UV, cápsulas de hidrogel podem liberar RNA sob medida (divulgação de artigo da Advanced Healthcare Materials). Aqui.
Oportunidades
  • Concurso para professor do Departamento de Química Orgânica do Instituto de Química da Unicamp (SP). Aqui.
  • Seleção de professor no Departamento de Física da PUC-Rio (RJ). Aqui.
  • Concurso para professor em várias áreas de Engenharia na Universidade Federal de Lavras (MG). Aqui.
  • Concurso para professor do IQ – Unicamp (área de Ensino de Química): inscrições prorrogadas. Aqui.
  • Concursos para docentes em Engenharia de Materiais na UFABC (SP). Aqui.
  • Postdoctoral fellowship in confocal microscopy and cell membrane modelsAqui.
  • Processo de seleção para mestrado e doutorado em Química do PGQu – IQ – UFRJ. Aqui.
  • Processo de seleção para o doutorado em Ciências Exatas (Materiais) da UFG-Catalão. Aqui.
Próximos eventos da área
  • 5th International Conference on Surface Metrology. Póznan (Polônia). 4 a 7 de abril de 2016.  Site.
  • 9th Brazilian-German Workshop on Applied Surface Science. Maresias, SP (Brasil). 10 a 15 de abril de 2016. Site.
  • 43rd International Conference on Metallurgical Coatings and Thin Films (ICMCTF). San Diego (EUA). 25 a 29 de abril de 2016. Site.
  • 40th WOCSDICE ‐ Workshop on Compound Semiconductor Devices and Integrated Circuits held in Europe & 13th EXMATEC ‐ Expert Evaluation and Control of Compound Semiconductor Materials and Technologies. Aveiro (Portugal). 6 a 10 de junho de 2016. Site.
  • Photonic Colloidal Nanostructures: Synthesis, Properties, and Applications (PCNSPA Conference 2016). São Petersburgo (Rússia). 27 de junho a 1 de julho de 2016.  Site.
  • XXV International Conference on Raman Spectroscopy (ICORS2016). Fortaleza, CE (Brasil). 14 a 19 de agosto de 2016.  Site.
  • XV Encontro da SBPMat. Campinas, SP (Brasil). 25 a 29 de setembro de 2016. Site.
  • Aerospace Technology 2016. Estocolomo, Suécia. 11 a 12 de outubro de 2016. Site.
      
Você pode divulgar novidades, oportunidades, eventos ou dicas de leitura da área de Materiais, e sugerir papers, pessoas e temas para as seções do boletim. Escreva para comunicacao@sbpmat.org.br.
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Artigo em destaque: Contribuição analítica à energia sustentável.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Influence of charge carriers mobility and lifetime on the performance of bulk heterojunction organic solar cells. D.J. Coutinho, G.C. Faria, D.T. Balogh, R.M. Faria. Solar Energy Materials and Solar Cells, Volume 143, Pages 503-509 (December 2015). DOI:10.1016/j.solmat.2015.07.047

Contribuição analítica à energia sustentável

Um trabalho totalmente desenvolvido no Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (IFSC-USP) fez contribuições significativas à análise do desempenho de células solares orgânicas, dispositivos capazes de transformar em eletricidade a luz do sol, que é uma fonte de energia renovável, limpa, segura e praticamente inesgotável. Resultados do estudo foram recentemente publicados no periódico Solar Energy Materials & Solar Cells, cujo fator de impacto é de 5,337.

Composição da célula solar de heterojunção de volume utilizada nos experimentos reportados no artigo. Na camada ativa, a configuração dos materiais aceitador (azul) e doador (vermelho) de elétrons.

Com estrutura análoga à de um sanduíche, a célula solar orgânica é composta por camadas de espessura nanométrica feitas de diversos materiais que cumprem funções específicas no dispositivo.

A chamada “camada ativa”, aquela que protagoniza as principais etapas da transformação da luz (fluxo de fótons) em corrente elétrica (fluxo de partículas com carga elétrica), é feita de materiais orgânicos (suas moléculas possuem átomos de carbono) semicondutores. Na rede de átomos dos semicondutores tradicionais, os elétrons situados na chamada “banda de valência” pulam de seus estados quando absorvem fótons, deixando vagas chamadas “buracos” (holes) e ocupando novos lugares na chamada “banda de condução”. Nos semicondutores orgânicos, o mecanismo de geração dos pares elétron-buraco é semelhante, com a diferença de que, em vez da transição direta de uma banda para outra, ocorre a formação do éxciton molecular (um sistema contendo uma carga negativa e uma positiva), que se dissocia com facilidade produzindo as cargas livres (elétrons e buracos).

Para que aconteça a etapa seguinte na conversão de luz em eletricidade, a camada ativa das células solares orgânicas deve possuir muitas regiões de interface entre dois tipos de materiais: o doador e o aceitador de elétrons (geralmente um polímero eletrônico e um derivado do fulereno, respectivamente). Se o éxciton, em sua vida de alguns picossegundos, consegue chegar até alguma região de interface, as forças que mantém elétron e buraco unidos são quebradas para que aconteça a doação do elétron pelo polímero ao fulereno. Nesse momento, não havendo armadilhas no caminho que impeçam seu movimento, elétrons e buracos fluem em direções opostas, atraídos e coletados por elementos eletrodos, gerando corrente elétrica que poderá ser utilizada em um circuito externo.

Nessa sucessão de etapas, perdas de eficiência na conversão de energia solar em elétrica podem acontecer devido a diversos fatores. Um exemplo é a recombinação de elétrons e buracos depois da dissociação do éxciton, a qual impede que esses transportadores de cargas fluam livremente. Outro exemplo é o dos defeitos ou impurezas em materiais da camada ativa, que agem como armadilhas dos transportadores de cargas, diminuindo sua mobilidade.

No artigo publicado na Solar Energy Materials and Solar Cells, são reportados os resultados de uma série de experimentos realizados com o objetivo de estudar em detalhe a mobilidade e tempo de vida de portadores de cargas (elétrons e buracos) em função da temperatura, numa célula solar orgânica de heterojunção de volume, fabricada no IFSC. Nesse tipo de dispositivo, o material doador de elétrons e o aceitador convivem numa configuração particular (um filme nanométrico de estrutura bifásica) que aumenta a área de interface entre os dois materiais com relação a outras possíveis configurações.

Os autores também apresentam no artigo os resultados de medidas de corrente elétrica em função da tensão externa aplicada (J-V) sob iluminação – um dos experimentos mais relevantes na caracterização de células solares. De fato, esse experimento é necessário para calcular a eficiência de uma célula solar.

Célula solar orgânica durante caracterização elétrica sob iluminação artificial equivalente a um sol. No protótipo da figura acima, em uma placa de 5 X 5 cm, cinco dispositivos são ligados em série produzindo aproximadamente 2V no total. A eficiência individual de cada dispositivo deste estudo é em torno de 4%.

Para ajustar e analisar os resultados experimentais, os autores desenvolveram um modelo baseado num conjunto de equações. O modelo veio preencher uma lacuna na literatura científica, já que, até sua publicação, essas análises eram feitas a partir de aproximações, sendo imprecisas, ou por meio de métodos numéricos, que exigem árduo e demorado trabalho.

“Não existe ainda hoje uma descrição formal para a curva J-V”, comenta Roberto Mendonça Faria, professor titular do IFSC-USP e autor correspondente do paper. “Nosso artigo teve o mérito de elaborar uma expressão analítica para J-V que reproduz com sucesso as características de uma célula solar orgânica para o caso em que as mobilidades dos portadores positivos e negativos são iguais”, destaca ele, acrescentando que, com essa expressão, é possível fazer uma análise mais precisa do desempenho das células, mesmo para casos onde as mobilidades de elétrons e buracos não sejam exatamente iguais.

À esquerda, Roberto Mendonça Faria (último autor do artigo) e, à direita , Douglas José Coutinho (primeiro autor).

O artigo também apresenta as análises que a equipe do IFSC conseguiu fazer a partir dos resultados experimentais e do modelo, principalmente a respeito de alguns fatores que levam a perdas de eficiência na conversão de luz em eletricidade.

Dessa maneira, os autores do artigo fizeram uma contribuição ao desafio de produzir energia de modo sustentável. “A produção de energia é vital para que a sociedade humana continue seu progresso econômico e social, mas não pode continuar com seus efeitos secundários, e terríveis, de poluir o planeta e contribuir ao efeito do aquecimento global”, afirma Faria.

Os resultados reportados no artigo fazem parte das pesquisas de mestrado e doutorado de Douglas José Coutinho, realizadas com orientação do professor Faria e com financiamento das agências brasileiras de apoio à pesquisa FAPESP e CNPq (inclusive por meio do INCT de Eletrônica Orgânica, INEO).

Gente da nossa comunidade: entrevista com o pesquisador Osvaldo Novais de Oliveira Junior.

Hoje, 29 de janeiro de 2016, ocorre em Campinas a posse da nova diretoria executiva da SBPMat, presidida por Osvaldo Novais de Oliveira Junior, professor do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador da área de Materiais há 35 anos, período no qual gerou mais de 460 artigos publicados em periódicos indexados, 7 patentes e 16 capítulos de livros, entre outras publicações. No total, a produção científica do professor Osvaldo recebeu, até o momento, mais de 8.500 citações segundo a Web of Science (índice h = 46) e 12.100 (h = 53) conforme o Google Scholar.

Osvaldo Novais de Oliveira Jr. nasceu em 13 de agosto de 1960 em Barretos, uma cidade do norte do Estado de São Paulo que, na época, tinha em torno de 60 mil habitantes. Ganhou ainda adolescente o apelido de Chu, que o acompanha até hoje, inclusive fazendo parte de seu endereço eletrônico profissional.

Iniciou seus estudos universitários na Fundação Educacional de Barretos. Em 1980, enquanto cursava ali a Licenciatura em Física, fez transferência para o Bacharelado em Física na USP de São Carlos (IFSC/USP),  e começou a desenvolver trabalhos de pesquisa no “Grupo de Eletretos”, hoje chamado “Grupo de Polímeros Bernhard Gross”. No contexto desse grupo iniciou seu mestrado em 1983, com orientação do professor Guilherme Fontes Leal Ferreira, obtendo em 1984 o título de mestre em Física Aplicada. No ano seguinte começou a dar aulas no Bacharelado em Física da USP de São Carlos e continuou desenvolvendo atividades de pesquisa no Grupo de Polímeros

De São Carlos mudou-se, em 1986, para a cidade galesa de Bangor, no Reino Unido, para fazer doutorado na Universidade do País de Gales – hoje Universidade de Bangor. Em 1990 obteve o título de doutor em Engenharia Eletrônica ao defender sua tese sobre propriedades elétricas de filmes de Langmuir, orientada pelo professor David Martin Taylor.

De volta ao Brasil em 1991, agregou a suas atividades docentes na USP de São Carlos, aulas nos cursos de pós-graduação em Física Aplicada. Em 1993, foi nomeado professor associado na USP.

No mesmo ano, iniciou suas primeiras pesquisas acadêmicas em processamento de línguas naturais, área que lida, basicamente, com problemas relacionados à geração e compreensão automática de textos por meio de computadores. O professor Osvaldo Novais foi parte da equipe fundadora do Núcleo Interinstitucional de Linguística Computacional (NILC) e participou do desenvolvimento do primeiro software para revisão gramatical do português brasileiro, o qual foi chamado “ReGra”. O revisor fez parte de várias versões do processador de texto Microsfot Word a partir de 1999. Do trabalho no NILC e de cursos de escrita científica, resultou o livro produzido pelo professor Osvaldo e outros sete autores sobre escrita científica em inglês (Writing Scientific Papers in English Successfully: Your Complete Roadmap).

Osvaldo Novais foi pesquisador visitante na Universidade de Massachusetts, Lowell (UMass Lowell), nos Estados Unidos, entre 2000 e 2001, e professor visitante da Universidade de Aveiro (Portugal) em 2006. Também nesse ano, recebeu o Prêmio Scopus, outorgado pela Elsevier do Brasil e a Capes, como um dos 16 pesquisadores brasileiros com maior produção científica, com base no número de publicações, citações e orientações (hoje são 40 trabalhos de mestrado e doutorado concluídos).

Em 2008, tornou-se professor titular da USP, após ser aprovado em concurso.

Atualmente, além de suas atividades de professor e pesquisador no IFSC-USP, o professor Osvaldo Novais é membro da coordenação de Física na FAPESP, editor regional para América do Sul do periódico científico “Display and Imaging” e editor associado do “Journal of Nanoscience and Nanotechnology”.

Segue uma entrevista com o pesquisador.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um pesquisador e a trabalhar na área de Materiais.

Osvaldo Novais: – Minhas escolhas profissionais ocorreram quase sempre sem planejamento, e sem uma motivação específica. Iniciei o curso de Licenciatura em Ciências na Fundação Educacional de Barretos, pois não havia conseguido passar no vestibular de Engenharia Eletrônica, que eu imaginava ser a profissão de que eu gostaria. Após ter decidido mudar de área ao final do primeiro ano, e passar em vestibulares de Filosofia e Psicologia, por razões financeiras e familiares acabei continuando o curso de Ciências e optei por Licenciatura em Física no terceiro ano. Uma transformação importante ocorreu com a transferência para o Bacharelado em Física na USP de São Carlos, e já na Iniciação Científica tinha me decidido ser um professor e pesquisador. Minha escolha pela área de polímeros aconteceu por indicação de uma amiga, que tinha grande admiração pelos docentes do então Grupo de Eletretos. Pois iniciei um trabalho de iniciação nesse Grupo, hoje denominado Grupo de Polímeros Bernhard Gross, e aqui estou há 35 anos.

A despeito de não ter escolhido carreira e nem área de pesquisa por vocação ou convicção, tive muita sorte porque considero o estudo de Materiais ao mesmo tempo fascinante e essencial para a sociedade. Pesquisadores em Materiais podem se divertir com os desafios, e contribuírem para fazer deste um mundo melhor. A formação de pesquisador também permitiu que eu possa atuar em diferentes áreas, importante para quem é apaixonado por conhecimento, como sou.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais?

Osvaldo Novais: – Acho que minha maior contribuição seja a de ter participado da construção de uma rede de pesquisas em Materiais, principalmente em filmes orgânicos nanoestruturados. Essa rede tem hoje pesquisadores em várias regiões do Brasil, incluindo conexões internacionais também. No que concerne a contribuições científicas específicas, eu talvez pudesse destacar o estudo de propriedades elétricas de filmes de Langmuir e uso desses filmes como modelos de membrana celular. Outro destaque poderia ser dado a sensores (como as línguas eletrônicas) e biossensores produzidos com filmes nanoestruturados, com a ressalva de que os protagonistas dessas contribuições tenham sido alunos e pós-doutorandos de meu grupo de pesquisa.

Boletim da SBPMat: – Em paralelo a sua atuação na pesquisa em Materiais, você desenvolve estudos sobre processamento de línguas naturais dentro do NILC, núcleo do qual você é membro fundador. Fale-nos um pouquinho sobre essa atividade.

Osvaldo Novais: – Por necessidade, acabei me interessando por escrita científica em inglês, num trabalho inicialmente informal que deu origem a projetos de ferramentas de software de auxílio à escrita. Com o convite para compor a equipe que desenvolveu o primeiro revisor gramatical para o português nos anos 1990, formou-se o NILC, que é hoje referência no mundo todo para o processamento automático de português. Digo isso sem constrangimento, pois os méritos dessa conquista são todos de uma equipe de cientistas da computação e de linguistas, de várias universidades do Brasil, que há anos realizam pesquisa e desenvolvimento do mais alto nível. Minha participação só foi importante no início.

Por duas décadas minhas pesquisas em processamento de línguas naturais (PLN) junto ao NILC eram totalmente desconectadas da área de Física, mas nos últimos anos temos empregado metodologias de Física Estatística para o tratamento de textos. Com o novo paradigma de pesquisa baseado em uso intensivo de dados (chamado “Big Data”), há agora a possibilidade de juntar nanotecnologia – área eminentemente de materiais – com PLN e inteligência artificial, por exemplo nos sistemas de diagnóstico apoiados por computador. Este é um tópico fascinante que permite exercitar a convergência de tecnologias, que dará a tônica da pesquisa e desenvolvimento no século XXI.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos, de modo muito resumido, quais são seus planos para a SBPMat enquanto presidente da sociedade no período 2016-2018.

Osvaldo Novais: – Acho que o plano mais relevante é dar continuidade ao excelente trabalho que as diretorias anteriores realizaram, que fez da SBPMat uma das sociedades científicas mais pujantes no Brasil. Isso inclui manter o excelente nível de nossos encontros anuais, e fortalecer a inserção internacional que a SBPMat tem logrado. Outras metas da nova diretoria são a de incrementar a interação de pesquisadores em materiais com as indústrias instaladas no Brasil, incentivar a participação de jovens pesquisadores na sociedade, e promover programas de divulgação científica e tecnológica, enfatizando o papel central da pesquisa em Materiais para o desenvolvimento tecnológico e social.

Boletim da SBPMat: – Sempre convidamos os entrevistados desta seção do boletim a deixarem uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas. Gostaria de falar algo em particular para esses futuros cientistas/ cientistas juniores?

Osvaldo Novais: – Minha mensagem é a de que se dediquem com afinco para obter uma formação científica sólida, com ênfase no domínio das linguagens do conhecimento, quais sejam as línguas naturais (português e inglês no nosso caso) e as linguagens dos formalismos matemáticos. É essa formação sólida que permitirá a nossos jovens cientistas aprenderem continuamente, o que é essencial numa sociedade de transformações tão rápidas. E que possam perseguir sonhos com a solução de problemas científicos e tecnológicos, que é uma das atividades mais divertidas e renovadoras.