Há 16 anos, nos Estados Unidos, o físico brasileiro Ado Jorio de Vasconcelos, em estágio de pós-doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT) no grupo da professora Mildred Dresselhaus, encabeçava um trabalho que geraria o primeiro resultado bem-sucedido da aplicação da Óptica, mais precisamente da espectroscopia Raman, na caracterização individual de nanotubos de carbono – cujas paredes, vale lembrar, têm apenas 1 átomo de espessura e cujo diâmetro costuma ser de 1 nanometro. Uma olhada no site do MIT, na página da professora Mildred, que vem estudando nanoestruturas de carbono no MIT há mais de 50 anos, reforça a relevância do trabalho realizado junto ao brasileiro: 5 das 6 publicações selecionadas pela professora emérita têm coautoria dele.
Quando começou o pós-doc, Ado Jorio tinha 28 anos de idade e acabava de obter o diploma de doutor em Física pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com uma tese sobre transições de fase em sistemas incomensuráveis, realizada com orientação do professor Marcos Assunção Pimenta. Antes disso, graduara-se em Física, também pela UFMG, depois de cursar 3 anos de Engenharia Elétrica.
Finalizado o pós-doutorado no MIT, Jorio voltou à UFMG ao ser aprovado em concurso público, tornando-se professor adjunto da universidade em 2002. De 2007 a 2009 ocupou um cargo no Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) para realizar atividades relacionadas ao desenvolvimento da nanometrologia. Em 2010, tornou-se professor titular da UFMG e, no mesmo ano, assumiu, até 2012, a direção da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica da universidade. Em 2013, esteve no ETH Zurich (Suíça) como professor visitante, realizando atividades docentes e de pesquisa. Em agosto deste ano, assumiu a direção da Pró-Reitoria de Pesquisa da UFMG.
Desde 2002, Jorio vem ampliando o tema de seu trabalho de pós-doutorado. O cientista mineiro tem realizado pesquisa em Óptica e desenvolvimento de instrumentação científica, visando ao estudo de nanoestruturas de carbono com aplicações muito diversas. Um exemplo dessa diversidade é um trabalho do qual Jorio participa, no qual técnicas do campo da Nanotecnologia são utilizadas para compreender detalhes da composição da “terra preta de índio”, um solo de altíssima fertilidade e capacidade de sequestrar carbono, encontrado em locais antigamente habitados por índios na Amazônia brasileira.
Atualmente, Jorio é dono de um dos índices H mais altos entre os cientistas do Brasil: 74, segundo o Google Scholar. Ele é também um dos pesquisadores mais citados no mundo, como atesta a inclusão de seu nome na mais recente lista internacional da Thomson Reuters, que destacou, dentre todos os artigos científicos indexados entre 2003 e 2013, o 1% de papers mais citados em cada área do conhecimento. Jorio é autor de mais de 180 artigos científicos e de 20 livros ou capítulos de livros, além de 8 pedidos de patente. De acordo com o Google Scholar, suas publicações reúnem mais de 30 mil citações.
Suas contribuições receberam uma série de reconhecimentos de prestigiadas entidades, como o Somiya Award da International Union of Materials Research Societies em 2009; o ICTP Prize do Abdus Salam International Centre for Theoretical Physics em 2011, e o Georg Forster Research Award da Humboldt Foundation em 2015, entre muitas outras distinções nacionais e internacionais.
No XV Encontro da SBPMat, Ado Jorio proferirá uma palestra plenária sobre um tema no qual é um dos principais especialistas do mundo, o uso de espectroscopia Raman para o estudo de nanoestruturas de carbono. O cientista brasileiro falará sobre a evolução que a técnica experimentou até chegar na escala nano. E promete revelar alguns truques que possibilitam o uso da luz, cujo comprimento de onda é de, no mínimo, centenas de nanometros, como sonda para investigar estruturas de apenas alguns nanometros.
Veja nossa entrevista com este membro da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais e plenarista do nosso evento anual.
Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar na área de Materiais.
Ado Jorio: – O caminho foi tortuoso! Entrei na universidade para cursar engenharia elétrica. Na época tocava em uma banda de rock progressivo, e procurei iniciação científica na área de música. Fui orientado a conversar com um professor do departamento de física, que gostava de música, estudava acústica e materiais. Aí começou minha trajetória, que acabou na ciência dos materiais.
Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais.
Ado Jorio: – Diria que são duas principais. A primeira, na área de nanotubos de carbono, demonstrei que a óptica poderia ser levada ao nível de nanotubos isolados. Isso abriu um campo de pesquisas muito amplo, porque os nanotubos podem ser de vários tipos, dependendo do seu diâmetro e quiralidade. Antes deste trabalho, as pessoas estudavam nanotubos. Após este trabalho, as pessoas passaram a estudar tipos específicos de nanotubos. Seria equivalente a dizer que pesquisadores estudavam o átomo, e se deram conta de que existem diversos tipos de átomos. O artigo que foi marco desta descoberta foi o [PRL86, 1118 (2001)]. A segunda contribuição foi o avanço da óptica para o estudo de nanoestruturas de carbono, de forma mais ampla. Trabalhei em diversas frentes, desde a instrumentação científica, para medidas ópticas abaixo do limite de difração, até o estudo e caracterização de defeitos, abordagem de materiais de interesse em ciências do solo, biotecnologia, biomedicina. Algumas referências importantes são os livros “Raman Spectroscopy in Graphene Related Systems” e “Bioengineering Applications of Carbon Nanostructures”.
Boletim da SBPMat: – Sempre convidamos os entrevistados desta seção do boletim a deixarem uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas. Muitos desses leitores provavelmente almejam conseguir um dia um índice H como o seu. O que você diria a eles?
Ado Jorio: – Faça um grande esforço para participar de conferências, e faça excelentes apresentações, sempre! A ciência é um debate e você tem que ser ouvido. Nunca repita uma mesma apresentação. Cada público pede um foco. É certo que este conselho depende de financiamento, mas desde o início da minha carreira, sempre gastei dinheiro do meu salário financiando minhas viagens, e ainda faço isso.
Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem ou convite para sua palestra plenária aos leitores que participarão do XV Encontro da SBPMat.
Ado Jorio: – Depois de tudo o que foi dito acima, e considerando que título e resumo estarão disponíveis, só me resta já deixar aqui, de prontidão, meu agradecimento àqueles que me prestigiarem com sua presença. Será uma honra ter os colegas no auditório.
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Link para o resumo da plenária de Ado Jorio, intitulada “Innelastic light scattering in carbon nanostructures: from the micro to the nanoscale”: http://sbpmat.org.br/