Gente da comunidade: entrevista com o cientista argentino Galo Soler Illia.

Galo Soler Illia.
Galo Soler Illia.

Quantas vocações científicas despertaram, e quantos acidentes domésticos provocaram, os jogos infantis de química experimental, que, até um tempo atrás, não seguiam todas as normas de segurança para brinquedos, hoje obrigatórias? O cientista argentino Galo Juan de Ávila Arturo Soler Illia pertence a esse grupo. Ele conta que seu interesse pela ciência se acendeu (literalmente) com um pequeno incêndio provocado por um jogo de laboratório de Química na casa de seus pais –  dois advogados, militantes da Unión Cívica Radical. Esse era o partido, aliás, do avô de Galo Soler Illia, o Presidente Arturo Umberto Illia, que governou a Argentina de 1963 a 1966, até sofrer um golpe de Estado.

Hoje, Galo Soler Illia pode ser considerado um dos pesquisadores mais conhecidos do país vizinho, tanto na comunidade científica (consta entre os 30 cientistas argentinos melhor posicionados no Google Scholar pelas citações a trabalhos de sua autoria, e já recebeu os principais prêmios nacionais de ciência) quanto entre o público leigo (no campo da Nanotecnologia, ele é um divulgador muito ativo e didático presente em todas as mídias, e costuma ser fonte de informações para os jornalistas argentinos).

Galo Soler Illia nasceu em Buenos Aires em 31 de maio de 1970. Fez seus estudos primários numa escola particular construtivista, o Colegio Bayard. Para cursar os estudos secundários ingressou, em 1983, ao Colegio Nacional de Buenos Aires, instituição pública dependente da Universidad de Buenos Aires (UBA), caracterizada, entre outras coisas, pela alta exigência nos estudos, a riqueza das atividades extracurriculares e uma infraestrutura superior à das outras escolas públicas. Em 1988, formou-se pelo colégio com uma especialização em Ciências. Tanto no ensino primário quanto no secundário teve oportunidade de fazer atividades em laboratórios de ciência.

Entre 1989, Soler Illia começou a cursar a graduação em Ciências Químicas na UBA. Durante a graduação, começou a lecionar no Departamento de Química Inorgânica, Analítica e Química Física da UBA e a fazer pesquisa em um grupo de Química de Materiais e também em um laboratório montado na casa de um amigo. Em 1993, ele obteve o diploma de licenciado em Química, tendo uma média nas avaliações das disciplinas de 9,13/ 10. Na Argentina, a licenciatura habilita o diplomado a realizar todo tipo de atividade profissional na área de formação, inclusive docência e atividades de pesquisa, e o prepara para um ingresso a um curso de doutorado sem passar pelo mestrado.

De 1994 a 1998, Soler Illia realizou o doutorado em Química, também na UBA, sob orientação do doutor em Química Miguel Angel Blesa. Através da pesquisa sobre nanopartículas de hidróxidos metálicos mistos, ele gerou conhecimento sobre o complexo mecanismo de formação de partículas, o qual lhe seria muito útil nas pesquisas que realizou como pós-doc e como pesquisador profissional, voltadas à síntese de materiais com alto controle de suas características. Concomitantemente ao doutorado, continuou lecionando, como assistente, na UBA.

Em 1999, foi morar na França, junto a sua esposa, a também química Astrid Grotewold, e permaneceram no país galo até o ano de 2002. Soler Illia fez um pós-doutorado na Université Pierre et Marie Curie (Paris), com supervisão do doutor Clément Sanchez, contando com uma bolsa com duração de 2 anos do CONICET, principal entidade argentina de apoio à ciência e tecnologia. No pós-doc, o argentino desenvolveu métodos para produzir materiais com porosidade altamente controlada. Desse período, resultaram os artigos de Soler Illia mais citados até o momento, com mais de 1.800 citações em um dos papers, segundo o Google Scholar. No final do período francês, Soler Illia também trabalhou em aplicações de filmes finos mesoporosos para o centro de pesquisa e desenvolvimento da empresa Saint Gobain.

Galo Soler Illia voltou à Argentina no início de 2003, num período em que o país saía de uma enorme instabilidade política que provocou a passagem de 5 pessoas diferentes pela Presidência da República em apenas 11 dias. Além disso, o país ainda estava sob os efeitos da grave crise econômica que tivera seu ápice em 2001. Entretanto, rapidamente, Soler Illia conseguiu ingressar à carreira de pesquisador do CONICET trabalhando na Comisión Nacional de Energia Atómica (CNEA) e, sem perder tempo, fundou o Grupo Química de Nanomateriales, que, até hoje, atua no projeto e obtenção de materiais nanoestruturados. Em 2004, o cientista se tornou, por concurso, professor da UBA, do departamento em que fizera seus estudos de grado e doutorado.

No início de 2015, Soler Illia se tornou diretor do Instituto de Nanosistemas (INS) da Universidad Nacional de San Martín, localizada na área metropolitana de Buenos Aires. O INS se define como um espaço de pesquisa, desenvolvimento e criação interdisciplinar em nanociência e nanotecnologia, cujo objetivo final é resolver problemas prioritários da indústria e da sociedade em geral. No instituto, Soler Illia conta com uma equipe científica multidisciplinar de 4 pesquisadores (mais 4 em 2017), 6 estudantes de pós-graduação e pós-docs e 1 técnico de laboratório, além de uma equipe de gestão formada por 6 profissionais.

Atualmente, além de diretor do INS, Galo Soler Illia é pesquisador principal do CONICET e professor associado da UBA. É membro de conselhos assessores na Fundación Argentina de Nanotecnología (FAN) e no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (Brasil), e membro do conselho editorial do Journal of Sol-Gel Science and Technology (Springer). Além disso, o cientista tem uma coluna de divulgação científica sobre Nanotecnologia no programa televisivo “Científicos Industria Argentina”, que vai ao ar uma vez por semana no canal público argentino. Finalmente, Soler Illia acaba de ser nomeado, neste mês de novembro, membro do Conselho Presidencial Argentina 2030, integrado por intelectuais de diversos campos para assessorar o presidente da Argentina, Mauricio Macri.

Soler Illia, cujo índice h é de 44, possui uma produção de mais de 120 artigos publicados em periódicos científicos internacionais, com cerca de 11 mil citações, segundo o Google Scholar. Já orientou 7 teses de doutorado concluídas e é autor de 2 livros de divulgação sobre nanotecnologia. Também é autor de 4 pedidos de patentes.

Seu trabalho foi reconhecido com uma série de prêmios à ciência, tecnologia, inovação e divulgação científica, entre eles os principais da Argentina, como o Prêmio Houssay 2006 e 2009, da secretaria e depois ministério de ciência e tecnologia argentino; o Prêmio KONEX 2013, da fundação homônima, e o Premio Innovar 2011 e 2016, do Ministerio de Ciencia, Tecnología e Innovação Productiva. Também recebeu distinções da Academia Nacional de Ciencias Exactas, da FAN, da Asociación Argentina de Investigacão Fisicoquímica, do CONICET, das empresa BGH e Dupont, entre outras entidades. Em maio deste ano, Galo Soler Illia foi designado acadêmico titular da Academia Nacional de Ciencias Exactas, Físicas y Naturales, passando a compor um seleto grupo de apenas 36 cientistas.

Segue uma entrevista com o cientista argentino.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar no campo dos materiais.

Galo Soler Illia: – Sempre gostei de Química. Comecei com 5 anos, quando ganhei um jogo de Química e, fazendo um experimento, queimei a mesa de jantar da casa dos meus país. Depois, em meus estudos de nível secundário fui um pouco “nerd”, dedicando-me a escrever software para as aulas de Física do meu colégio. Escrever código despertou em mim uma curiosidade por saber como funcionavam as coisas e como os problemas podiam ser resolvidos. Aprendi muitíssimo. Perto do final do ensino secundário, decidi estudar Química, pois achei que era um curso muito versátil e maravilhoso que tinha grandes possibilidades em muitos campos. Nessa época, eu estava muito interessado na Biotecnologia, que era uma área nova. Mas na época em que comecei meus estudos de graduação na Universidade de Buenos Aires (UBA), a área de Química de Materiais começava a surgir. Ainda aluno, comecei a lecionar como ajudante no Departamento de Química Inorgânica, Analítica e Química Física da Faculdade de Ciências Exatas e Naturais, inspirado pelo exemplo de professores jovens e entusiastas que estavam voltando do exterior e geravam uma atmosfera de trabalho e exigência. Junto a meus melhores amigos, instalamos um laboratório em um quarto no terraço da casa de um deles. Ali crescíamos cristais e planejávamos síntese de moléculas. Como passávamos o dia todo na universidade e tínhamos algum tempo libre, eu achei um lugar para trabalhar, sem receber bolsa nem salário, em um grupo de Química de Materiais que acabava de começar. Tudo foi muito rápido e, quase sem perceber, finalizei meus estudos de graduação e iniciei o doutorado, fabricando micropartículas para catalizadores. Foi uma época muito linda da minha vida, da qual conservo minha curiosidade inata, minha vontade de explorar e construir matéria e um maravilhoso grupo de amigos, que se tornaram destacados colegas disseminados pelo mundo todo.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais, considerando todos os aspectos da atividade científica?

Galo Soler Illia: – Sempre me interessou construir materiais, o trabalho do químico de unir átomo com átomo, de fabricar novas arquiteturas. Centrei-me em compreender os fenômenos fisicoquímicos que ocorrem na produção de um material. Quando a gente conhece e compreende esses processos, passa de simplesmente “preparar” um material a poder projetá-lo e sintetizá-lo, por mais complexo que seja. E a gente pode aproveitar as propriedades dos elementos químicos a seu favor para obter as propriedades que a gente deseja. Vou dar três exemplos. Na minha tese, estudei a precipitação e agregação de nanopartículas de hidróxidos metálicos mistos, precursores de catalisadores. Descobrimos um mundo muito interessante e pudemos contribuir na compreensão da complexidade por trás de um mecanismo dinâmico de formação de partículas: a influência dos efeitos estruturais no formato das partículas, a importância da coordenação dos metais na formação de uma fase mista, a evolução da carga superficial e seu efeito na estabilidade de um coloide e muito mais, que me serviu futuramente como base sólida para minha pesquisa. Tive a sorte de poder trabalhar com Miguel Blesa, Alberto Regazzoni y Roberto Candal, três excelentes Mestres que me guiaram, estimularam e corrigiram.

Na minha segunda etapa, trabalhei em Paris, no laboratório de Clément Sanchez, e, usando o que tinha aprendido, pude desenvolver métodos para produzir materiais com porosidade altamente controlada, conhecidos como materiais mesoporosos organizados. Novamente, interessei-me pelos mecanismos de formação do material, que são complexos, pois demandam o controle do crescimento de pequenas espécies inorgânicas e sua automontagem com micelas. É uma pequena sinfonia físico-química, que é necessário aprender a tocar. Tivemos que usar, desenvolver e combinar técnicas de caracterização muito variadas para poder compreender quais fenômenos estavam ocorrendo e como eles controlavam a formação e organização dos sistemas de poros, a estabilidade e cristalinidade dos materiais, que são, entre outras, as variáveis importantes no desempenho final desses sólidos.

Na minha terceira etapa, de volta à Argentina, estabeleci um grupo de pesquisa na Comisión Nacional de Energía Atómica, em Buenos Aires, e me dediquei a construir arquiteturas mais complexas, baseadas em tudo que tinha aprendido. Minhas melhores contribuições nesse sentido se referem ao uso das forças e interações na nanoescala para fabricar nanocompósitos muito variados com propriedades ópticas e catalíticas projetadas e surpreendentes. Tudo isso demandou a criação de novos laboratórios, a formação de recursos humanos e a transferência de ciência básica a tecnologias. Particularmente, nos últimos anos temos trabalhado com empresas e aspiramos a gerar nanotecnologia na Argentina, estendendo os conhecimentos do nosso laboratório à sociedade.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos um pouquinho sobre sua interação com o Brasil. Você vem frequentemente ao país para colaborações, eventos, uso de labs, seminários? Tem trabalhos realizados com grupos do Brasil ou em laboratórios brasileiros?

Galo Soler Illia: – Retornei à Argentina em 2003 e, imediatamente, tive como referencia o que estava se gestando no Brasil. Desde aquela época, comecei a desenvolver projetos no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que é um farol para todos aqueles que trabalhamos em Materiais na América Latina. A interação com o pessoal do síncrotron foi muito importante para podermos caracterizar nossos materiais, e é impressionante ver como as instalações têm melhorado nestes anos. Faz poucos meses, tive a oportunidade de conhecer o prédio do Sirius, que é simplesmente impressionante, e será referência mundial. Também tive a oportunidade de conhecer diversas universidades proferindo cursos e colaborando na formação de graduandos e estudantes de pós-graduação. Além disso, geramos a Escola de Síntese de Materiais, que fazemos em Buenos Aires, e que terá sua oitava edição em 2017. Essa escola foi idealizada para gerar uma comunidade de cientistas latino-americanos com competências na síntese racional de materiais. Começamos com muitos estudantes brasileiros, graças ao apoio da Sociedade Argentino-Brasileira de Nanotecnologia, que depois, infelizmente, parou de funcionar. É muito belo ver como os estudantes de ambos os países trabalham juntos nos laboratórios e discutem e apresentam seus trabalhos em “portunhol”. A partir dessa escola, e com ajuda de vários colegas, estão surgindo redes de colaboração que, sem dúvida, vão nos proporcionar a base tecnológica para fazermos empreendimentos conjuntos de maior porte. Viajo várias vezes por ano ao Brasil e sempre admiro a força do país para impulsionar o desenvolvimento tecnológico local. Espero que, passados estes momentos de dificuldades, possamos continuar crescendo em conjunto.

Boletim da SBPMat: – Sempre convidamos os entrevistados desta seção do boletim a deixarem uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas. O que você diria a esses cientistas juniores?

Galo Soler Illia: – Olhando para atrás, posso fazer três recomendações aos jovens cientistas. Uma é que nunca percam sua imaginação e sua capacidade de se fazerem perguntas; a segunda é que trabalhem duro para encontrar as respostas, e a terceira é que aproveitem as surpresas. Às vezes, a gente está treinado para desenvolver um caminho e uma estratégia e a gente foca no rigor de demonstrar e formalizar o que a gente encontra. Porém, é essencial saber que esse caminho que a gente traça é cheio de cantinhos interessantes, e que, às vezes, um aspecto que não levávamos em consideração nos abre um panorama novo e inexplorado. Dizia Newton que a gente, enquanto científico, é às vezes como uma criança que na praia acha uma concha mais bonita do que outras e é feliz, mas, perante a gente, estende-se o enorme oceano da verdade. Meu conselho é: busquemos incessantemente nossas conchas, curtamos com elas e aproximemo-nos da compreensão das maravilhas do nosso universo. E tenhamos sempre em conta que desenvolver ciência em nosso continente é um belo desafio que vai agregar riqueza a nossos países e bem-estar a nossos irmãos.

Gente da comunidade: entrevista com Ado Jorio de Vasconcelos, que proferirá palestra plenária no XV Encontro da SBPMat.

Há 16 anos, nos Estados Unidos, o físico brasileiro Ado Jorio de Vasconcelos, em estágio de pós-doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT) no grupo da professora Mildred Dresselhaus, encabeçava um trabalho que geraria o primeiro resultado bem-sucedido da aplicação da Óptica, mais precisamente da espectroscopia Raman, na caracterização individual de nanotubos de carbono – cujas paredes, vale lembrar, têm apenas 1 átomo de espessura e cujo diâmetro costuma ser de 1 nanometro. Uma olhada no site do MIT, na página da professora Mildred, que vem estudando nanoestruturas de carbono no MIT há mais de 50 anos, reforça a relevância do trabalho realizado junto ao brasileiro: 5 das 6 publicações selecionadas pela professora emérita têm coautoria dele.

Quando começou o pós-doc, Ado Jorio tinha 28 anos de idade e acabava de obter o diploma de doutor em Física pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com uma tese sobre transições de fase em sistemas incomensuráveis, realizada com orientação do professor Marcos Assunção Pimenta. Antes disso, graduara-se em Física, também pela UFMG, depois de cursar 3 anos de Engenharia Elétrica.

Finalizado o pós-doutorado no MIT, Jorio voltou à UFMG ao ser aprovado em concurso público, tornando-se professor adjunto da universidade em 2002. De 2007 a 2009 ocupou um cargo no Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) para realizar atividades relacionadas ao desenvolvimento da nanometrologia. Em 2010, tornou-se professor titular da UFMG e, no mesmo ano, assumiu, até 2012, a direção da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica da universidade. Em 2013, esteve no ETH Zurich (Suíça) como professor visitante, realizando atividades docentes e de pesquisa. Em agosto deste ano, assumiu a direção da Pró-Reitoria de Pesquisa da UFMG.

Desde 2002, Jorio vem ampliando o tema de seu trabalho de pós-doutorado. O cientista mineiro tem realizado pesquisa em Óptica e desenvolvimento de instrumentação científica, visando ao estudo de nanoestruturas de carbono com aplicações muito diversas. Um exemplo dessa diversidade é um trabalho do qual Jorio participa, no qual técnicas do campo da Nanotecnologia são utilizadas para compreender detalhes da composição da “terra preta de índio”, um solo de altíssima fertilidade e capacidade de sequestrar carbono, encontrado em locais antigamente habitados por índios na Amazônia brasileira.

Atualmente, Jorio é dono de um dos índices H mais altos entre os cientistas do Brasil: 74, segundo o Google Scholar. Ele é também um dos pesquisadores mais citados no mundo, como atesta a inclusão de seu nome na mais recente lista internacional da Thomson Reuters, que destacou, dentre todos os artigos científicos indexados entre 2003 e 2013, o 1% de papers mais citados em cada área do conhecimento. Jorio é autor de mais de 180 artigos científicos e de 20 livros ou capítulos de livros, além de 8 pedidos de patente. De acordo com o Google Scholar, suas publicações reúnem mais de 30 mil citações.

Suas contribuições receberam uma série de reconhecimentos de prestigiadas entidades, como o Somiya Award da International Union of Materials Research Societies em 2009; o ICTP Prize do Abdus Salam International Centre for Theoretical Physics em 2011, e o Georg Forster Research Award da Humboldt Foundation em 2015, entre muitas outras distinções nacionais e internacionais.

No XV Encontro da SBPMat, Ado Jorio proferirá uma palestra plenária sobre um tema no qual é um dos principais especialistas do mundo, o uso de espectroscopia Raman para o estudo de nanoestruturas de carbono. O cientista brasileiro falará sobre a evolução que a técnica experimentou até chegar na escala nano. E promete revelar alguns truques que possibilitam o uso da luz, cujo comprimento de onda é de, no mínimo, centenas de nanometros, como sonda para investigar estruturas de apenas alguns nanometros.

Veja nossa entrevista com este membro da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais e plenarista do nosso evento anual.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar na área de Materiais.

Ado Jorio: – O caminho foi tortuoso! Entrei na universidade para cursar engenharia elétrica. Na época tocava em uma banda de rock progressivo, e procurei iniciação científica na área de música. Fui orientado a conversar com um professor do departamento de física, que gostava de música, estudava acústica e materiais. Aí começou minha trajetória, que acabou na ciência dos materiais.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais.

Ado Jorio: – Diria que são duas principais. A primeira, na área de nanotubos de carbono, demonstrei que a óptica poderia ser levada ao nível de nanotubos isolados. Isso abriu um campo de pesquisas muito amplo, porque os nanotubos podem ser de vários tipos, dependendo do seu diâmetro e quiralidade. Antes deste trabalho, as pessoas estudavam nanotubos. Após este trabalho, as pessoas passaram a estudar tipos específicos de nanotubos. Seria equivalente a dizer que pesquisadores estudavam o átomo, e se deram conta de que existem diversos tipos de átomos. O artigo que foi marco desta descoberta foi o [PRL86, 1118 (2001)]. A segunda contribuição foi o avanço da óptica para o estudo de nanoestruturas de carbono, de forma mais ampla. Trabalhei em diversas frentes, desde a instrumentação científica, para medidas ópticas abaixo do limite de difração, até o estudo e caracterização de defeitos, abordagem de materiais de interesse em ciências do solo, biotecnologia, biomedicina. Algumas referências importantes são os livros “Raman Spectroscopy in Graphene Related Systems” e “Bioengineering Applications of Carbon Nanostructures”.

Boletim da SBPMat: –  Sempre convidamos os entrevistados desta seção do boletim a deixarem uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas. Muitos desses leitores provavelmente almejam conseguir um dia um índice H como o seu. O que você diria a eles?

Ado Jorio: – Faça um grande esforço para participar de conferências, e faça excelentes apresentações, sempre! A ciência é um debate e você tem que ser ouvido. Nunca repita uma mesma apresentação. Cada público pede um foco. É certo que este conselho depende de financiamento, mas desde o início da minha carreira, sempre gastei dinheiro do meu salário financiando minhas viagens, e ainda faço isso.

Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem ou convite para sua palestra plenária aos leitores que participarão do XV Encontro da SBPMat.

Ado Jorio: – Depois de tudo o que foi dito acima, e considerando que título e resumo estarão disponíveis, só me resta já deixar aqui, de prontidão, meu agradecimento àqueles que me prestigiarem com sua presença. Será uma honra ter os colegas no auditório.

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Link para o resumo da plenária de Ado Jorio, intitulada “Innelastic light scattering in carbon nanostructures: from the micro to the nanoscale”: http://sbpmat.org.br/15encontro/speakers/abstracts/7.pdf

Seleção de bolsistas no CETENE em Biotecnologia e Nanotecnologia.

O Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste – INT/MCTI (CETENE) está selecionando novos bolsistas para o Programa de Capacitação Institucional (PCI)  nas áreas de Biotecnologia e Nanotecnologia.

A modalidade de bolsa é PCI-D(A-E) e os valores e condições estão detalhados no RN-041/2013 do CNPq (Anexo II).

Os interessados deverão enviar o Currículo Lattes para ascom@cetene.gov.br até o dia 10 de novembro de 2015.

É vedada a utilização para fins de estudo em cursos de pós-graduação.

NanoTradeShow reunirá desenvolvedores de nanotecnologia no Brasil para apresentarem soluções em diversos segmentos.

Atualmente o Brasil conta com cerca de 90 empresas que possuem tecnologia nano para os mais diversos mercados, dentre eles o agronegócio, mercado têxtil, alimentício, de plástico e borracha, tintas, petróleo e gás, saúde, cosméticos, embalagens, automotivo, eletrodomésticos e de aeronáutica.

Segundo estimativa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o mercado mundial de nanotecnologia deve movimentar aproximadamente US$ 3 trilhões até 2018. Visando explorar este cenário otimista, o Brasil receberá de 13 a 15 de outubro a Nano TradeShow, que trará cerca de 70 empresas desenvolvedoras nano para apresentar soluções  inovadoras para os mais diversos mercados.

De acordo com os promotores do evento, a Nano Tradeshow abrangerá um vasto leque de segmentos dentro da nanotecnologia, com e reunirá órgãos governamentais, universidades, institutos, entidades, empresas e laboratórios ligados desde as áreas da biotecnologia até a parte de nano óptica, nano sensores, nano dispositivos, nano partículas, dentre diversas outras.

“Teremos visitantes das mais diferentes indústrias interessados em tornar seu negócio mais competitivo. A ideia é facilitar o acesso das empresas à nanotecnologia e a todas as possibilidades que ela pode oferecer na inovação de produtos e no desenvolvimento econômico das companhias”, explica Viviane Ferreira, diretora da HEWE Eventos.

No mesmo local, em paralelo à feira, também será realizada a Conferência Internacional de Nanotecnologia e Inovação e o Workshop Brasil-Canadá. O evento reunirá CEO’s, presidentes, diretores, gerentes, engenheiros, profissionais das áreas de PD&I, produção, qualidade, químicos, físicos e biólogos de empresas que buscam a capacitação de seus profissionais e mais inovação em seus produtos.

A Nano TradeShow tem o patrocínio da CBMM – Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineiração, SEBRAE, DesenvolveSP e MCTI – Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação.

(Texto baseado em release da Nano TradeShow)

Postdoctoral Fellowship in Energy Science, Nanotechnology, Materials in the USA (Deadline: 30 Oct 2015).

The Consortium for Innovation on Nanotechology, Energy and Materials (CINEMA) aims to foster collaboration between Brazil and the United States in renewable energy and nanotechnology. Over 50 professors and researchers are looking to mentor and host Brazilian postdocs at US institutions.

A competitive stipend starting at US$ 44,310 will be offered to selected candidates for 1-2 years through Brazil’s Science without Borders program and the State Funding Agencies.

The CINEMA program is administered by the Renewable and Sustainable Energy Institute (RASEI), a joint institute between the National Renewable Energy Laboratory (NREL) and the University of Colorado Boulder.  Sponsors include MCTI, CNPq, CNPEM, and CONFAP.

Opportunities for fellowships exist at NREL, MIT, Stanford, the University of Colorado Boulder, Colorado School of Mines, and Colorado State University.

Check the website for details including research areas and how to apply: http://www.colorado.edu/rasei/cinema/application-information.

The next deadline is October 30, 2015 and occurs twice-yearly (February and October).

Entrevistas com palestrantes de plenárias do XIV Encontro: Nader Engheta.

Foto do prof. Nader Engheta sobreposta a algumas imagens relacionadas a pesquisas dele. Crédito: Felice Macera, fotógrafo da Universidade de Pennsylvania.

Materiais fabricados com a aplicação do estado-da-arte da ciência e engenharia de materiais e da nanotecnologia podem fazer com que ondas eletromagnéticas como a luz se comportem de modo extraordinário… e útil para aplicações em diversos segmentos.

Para falar sobre esse assunto, o XIV Encontro da SBPMat contará com a presença do professor Nader Engheta (Universidade de Pennsylvania, EUA), um reconhecido líder mundial da pesquisa em metamateriais – materiais criados pelo ser humano por meio de micro ou nanoengenharia, que interagem com as ondas eletromagnéticas de modos não encontrados na natureza. Os metamateriais podem esculpir as ondas para conseguir interações extraordinárias entre luz e matéria.

No Rio de Janeiro, Engheta falará sobre cenários “extremos” gerados a partir de metamateriais: luz viajando em máxima velocidade através de estruturas artificiais, dispositivos ópticos de um átomo de espessura, metamateriais que realizam operações matemáticas, circuitos miniaturizados – ópticos em vez de eletrônicos – compostos por metamateriais, e estruturas com índice de refração próximo de zero.

Já na sua infância em Teerã (capital do Irã), Nader Engheta desenvolveu uma curiosidade especial por compreender fenômenos relacionados a ondas. Foi essa curiosidade que o impulsionou a cursar a graduação em Engenharia Elétrica na Universidade de Teerã, obtendo o diploma de “Bachelor of Science”. Em 1978, foi aos Estados Unidos para continuar com a sua formação em Engenharia Elétrica no prestigiado Instituto de Tecnologia de California (Caltech). Inicialmente obteve o título de mestre e, em 1982, defendeu sua tese de doutorado, da área de eletromagnetismo. Depois de um pós-doutorado na mesma instituição, Engheta atuou como cientista na indústria por quatro anos, trabalhando novamente com eletromagnetismo.

Em 1987, foi contratado pela Universidade de Pennsylvania (Penn), onde ascendeu rapidamente na carreira de professor. Desde 2005, ocupa a cátedra H. Nedwill Ramsey de Engenharia Elétrica e de Sistemas, além de lecionar nos departamentos de Engenharia Elétrica e de Sistemas, de Física e Astronomia, Bioengenharia e Ciência e Engenharia de Materiais. Engheta é coeditor do livro “Metamaterials: Engineering and Physics Explorations“, da editora Wiley-IEEE, lançado em 2006, e autor de 28 capítulos de livros. Em 2012, foi coordenador da Gordon Research Conference on Plasmonics.

Dono de um número H de 69 segundo o Google Scholar, Engheta tem mais de 21.400 citações.

Suas contribuições à ciência e engenharia têm recebido importantes reconhecimentos e distinções de diversas entidades, como a sociedade internacional de óptica e fotônica, SPIE (“2015 SPIE Gold Medal”), a união internacional de ciência de rádio, URSI (“2014 Balthasar van der Pol Gold Medal”) e a organização internacional profissional de engenheiros elétricos e eletrônicos, IEEE (“2015 IEEE Antennas and Propagation Society Distinguished Achievement Award“, “2013 Benjamin Franklin Key Award”, “2012 IEEE Electromagnetics Award”, “IEEE Third Millennium Medal”), entre muitas outras entidades. Ele também é fellow da Materials Research Society (MRS), American Physical Society (APS), Optical Society of America (OSA), American Association for the Advancement of Science (AAAS), SPIE, and IEEE. Engheta também recebeu vários prêmios por sua atuação no ensino.  Em 2006, a prestigiada revista de divulgação científica Scientific American o escolheu como um dos 50 líderes em ciência e tecnologia por seu desenvolvimento de nanocircuitos ópticos inspirados em metamateriais.

Segue uma entrevista com este plenarista do XIV Encontro da SBPMat.

Boletim da SBPMat: – Em sua opinião, quais são suas contribuições mais significativas nos temas relacionados à sua palestra plenária no XIV Encontro da SBPMat? Explique-as muito brevemente, por favor, e, se possível, compartilhe referências dos artigos ou livros resultantes, ou comente se esses estudos produziram patentes, produtos, empresas derivadas etc.

Nader Engheta: – Eu tenho muito interesse na interação luz-matéria, e no meu grupo nós exploramos diferentes métodos para manipular e  otimizar a interação de ondas com estruturas materiais, tanto no domínio óptico como no das microondas. Estou muito feliz com todos os tópicos de pesquisa nos quais o meu grupo e eu temos trabalhado. Alguns desses tópicos incluem (1) O nanocircuito metatrônico óptico, no qual nós trouxemos a noção de elementos de circuito “aglomerado” (“lumped”) da eletrônica para o campo da nanofotônica, desenvolvendo um novo paradigma no qual as nanoestruturas materiais podem funcionar como elementos de circuito óptico. Em outras palavras, “materiais se tornam circuitos” operando com sinais ópticos. Dessa forma, a nanofotônica pode ser modulada de uma maneira análoga à da eletrônica. Isso permite processar sinais ópticos em nanoescala, (2) Metamateriais que podem fazer matemática: dando sequência a nosso trabalho em metatrônica óptica, nós estamos explorando como materiais projetados adequadamente (ex. materiais em camadas) podem interagir com luz de tal forma que seja possível realizar operações matemáticas com luz. Em outras palavras, nós estamos explorando as seguintes questões: Os materiais podem ser especialmente projetados para realizar processamento analógico com a luz em nanoescala? Na medida em que a luz propaga através de tais estruturas materiais projetadas adequadamente, os perfis dos sinais de saída poderiam se assemelhar aos resultados de certas operações matemáticas (tal como diferenciação ou integração) nos perfis dos sinais de entrada? Em outras palavras, nós podemos projetar materiais para operações matemáticas específicas para realizar um “cálculo fotônico” em nanoescala? (3) Cenários extremos na interação luz-matéria: isso pode incluir dimensionalidade extrema, como fotônica de grafeno como plataforma com espessura de um átomo para manipulação de luz, metamateriais extremos no qual parâmetros materiais tais como permissividade relativa e permeabilidade relativa atinjam valores próximos do zero. Essa categoria de materiais, que nós nomeamos materiais épsilon-próximo-do zero, mu-próximo do zero (MNZ) e épsilon-e-mu-próximo do zero (EMNZ) exibem características bastante interessantes em sua resposta à interação com ondas eletromagnéticas.

Referências:

  • N. Engheta, “Circuits with Light at Nanoscales:  Optical Nanocircuits Inspired by Metamaterials”, Science, 317, 1698-1702 (2007).
  • N. Engheta, A. Salandrino, A. Alu, “Circuit Elements at Optical Frequencies:  Nano-Inductor, Nano-Capacitor, and Nano-Resistor,” Physical Review Letters, 95, 095504 (2005).
  • N. Engheta, “Taming Light at the Nanoscale,”  Physics World , 23(9), 31-34 (2010).
  • A. Vakil and N. Engheta, “Transformation Optics Using Graphene,” Science, 332, 1291-1294 (2011).
  • A.Silva, F. Monticone, G. Castaldi, V. Galdi, A. Alu, and N. Engheta, “”Performing Mathematical Operations with Metamaterials,” Science, 343, 160-163 (2014).
  • M. G. Silveirinha and N. Engheta, “Tunneling of Electromagnetic Energy through Sub-Wavelength Channels and Bends Using Epsilon-Near-Zero (ENZ) Materials,” Physical Review Letters, 97, 157403 (2006).
  • N. Engheta, “Pursuing Near-Zero Response”, Science, 340, 286-287 (2013).
  • A.M. Mahmoud and N. Engheta, “Wave-Matter Interaction in Epsilon-and-Mu-Near-Zero Structures”, Nature Communications, 5:5638, December 5, 2014.

Boletim da SBPMat: – Ajude-nos a visualizar os metamateriais desenvolvidos por seu grupo. Escolha um de seus materiais fotônicos favoritos e conte-nos, brevemente, do que ele é feito, qual sua propriedade principal e quais seriam suas possíveis aplicações.

Nader Engheta: – Uma das estruturas desenvolvidas pelo meu grupo é o nanocircuito metatrônico para regime de IV médio (de 8 a 14 mícrons), no qual nós adaptamos e construímos adequadamente nanobastões de Si3N4 com larguras e espessuras específicas, separados por um espaço específico. Esses arranjos de nanobastões de Si3n4 funcionam como coleções de nanoindutores ópticos, nanocapacitores ópticos e nanorresistores ópticos no IV médio. Nós demonstramos que tais estruturas se comportam como circuitos ópticos de nanoescala, com funcionalidade análoga aos filtros eletrônicos, mas aqui essas estruturas materiais operam em regimes de IV médio. Nós demostramos como essas estruturas operam como filtros ópticos no IV médio, oferecendo aplicações interessantes para futuros dispositivos e componentes ópticos integrados.

Referência:

  • Y. Sun, B. Edwards, A. Alu, and N. Engheta, “Experimental Realization of Optical Lumped Nanocircuit Elements at Infrared Wavelengths,” Nature Materials, 11, 208-212 (2012)

Posteriormente, em colaboração com a minha colega professora Cherie Kagan e seu grupo na UPenn, nós ampliamos esse trabalho para o regime próximo ao IV (de 1 a 3 mícrons). Nesse caso, nós usamos o óxido de índio dopado com estanho (ITO) como o material de escolha, com projeto e padrão adequado de nanobastões de ITO. Nós também demonstramos que tais circuitos metatrônicos óticos baseados em ITO funcionam como uma plataforma interessante para circuitos e filtragem óptica. Isso pode ter interessantes possibilidades na fotônica de silício.

Referência:

  • H. Caglayan, S.-H. Hong, B. Edwards, C. Kagan, and N. Engheta, “Near-IR Metatronic Nanocircuits by Design,” Physical Review Letters, 111, 073904 (2013).

Boletim da SBPMat: – Se quiser, deixe uma mensagem ou convite para sua palestra plenária aos leitores que participarão do XIV Encontro da SBPMat.

Nader Engheta: – Uma das características mais excitantes de fazer ciência é a alegria da busca do desconhecido e a emoção da descoberta. Eu sempre acredito que nós devemos seguir nossa curiosidade e nossa paixão pela descoberta. Também, em ciência e tecnologia é importante manter o equilíbrio entre a complexidade e a simplicidade na busca por soluções às inquisições científicas.

Mais

Gente da nossa comunidade: entrevista com o cientista Oswaldo Luiz Alves.

O professor Oswaldo Luiz Alves. (Crédito: Gustavo Morita)

Foi nos clubes de ciência da escola pública e do bairro Perdizes, na cidade de São Paulo, que Oswaldo Luiz Alves começou a se interessar por ciência, durante a adolescência, fazendo experimentos de Química e Biologia. Aos 20 anos, formou-se em um dos primeiros cursos técnicos de Química Industrial da América do Sul, na Escola Técnica Oswaldo Cruz, contando com bolsa de estudo da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Durante o curso, realizou um estágio no Instituto Biológico, do governo do Estado de São Paulo, onde teve seus primeiros contatos com a técnica de espectroscopia de infravermelho.

Após uma experiência de um ano trabalhando na indústria, ingressou nos cursos de bacharelado e licenciatura em Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e concluiu ambos em 1973. Durante a graduação, foi monitor do Instituto de Química da universidade e bolsista de iniciação científica. Assim que se formou, Alves, na época com 25 anos, foi contratado como docente pelo Instituto de Química da Unicamp e, simultaneamente, iniciou seu doutorado sem realizar previamente o mestrado, desenvolvendo um trabalho de pesquisa sobre aplicação da espectroscopia vibracional (Raman e infravermelha) em complexos moleculares. Em 1979, partiu para a França com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para realizar um pós-doutorado no qual trabalhou novamente com espectroscopia vibracional, inclusive utilizando um dos primeiros espectrômetros de infravermelho por transformada de Fourier. Dessa maneira, Oswaldo Alves vivenciou na própria pele o início de uma época da Química de profícuo desenvolvimento e aplicação de novas técnicas de análise, sobretudo espectroscópicas, e suas aplicações. Além disso, Alves também se deixou motivar por outro movimento, iniciado na década de 1970, que ocorria fortemente na comunidade dos químicos na Europa: o desenvolvimento e estudo de novos materiais dentro da chamada Química do Estado Sólido.

De volta ao Brasil depois de quase dois anos na França, nos quais atuou como professor convidado na Universidade de Lille, encontrou um panorama diferente do europeu. Por aqui, quase nenhum químico trabalhava ainda na área de Estado Sólido. Assim, Alves se dedicou a introduzi-la e, em 1985, fundou o Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES) no Instituto de Química da Unicamp. Desde então, o cientista tem feito relevantes contribuições à Ciência e Tecnologia de Materiais, em temas diversos como materiais vítreos para telecomunicações, técnicas de síntese de materiais bidimensionais, desenvolvimento de sistemas químicos integrados, purificação de nanotubos de carbono e interação de novos nanomateriais baseados em carbono com biossistemas.

Atualmente com 67 anos, Oswaldo Alves é professor titular da Unicamp, onde atua como coordenador científico do LQES e do Laboratório de Síntese de Nanoestruturas e Interação com Biossistemas (NanoBioss/SisNano). Em 40 anos de docência, orientou mais de 50 mestrados e doutorados. Pesquisador 1 A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ele é autor de mais de 200 artigos publicados em periódicos científicos, os quais totalizam mais de 2.400 citações, além de mais de 20 patentes depositadas, 5 concedidas e uma licenciada, esta última referente a uma tecnologia voltada à remediação de efluentes de indústrias papeleiras e têxteis. No campo da divulgação científica, atua como editor científico de dois boletins de notícias, o “LQES News” e o “Nano em Foco”.

Oswaldo Alves é membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Academia de Ciências do Estado de São Paulo, comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e fellow da TWAS (The World Academy of Sciences for the advancement of science in developing countries) e da Royal Society of Chemistry. Recebeu prêmios de diversas entidades, como a Unicamp, a Associação Brasileira de Indústrias Químicas (Abiquim) e a Sociedade Brasileira de Química, da qual foi presidente de 1998 a 2000, além de fundador e primeiro diretor de sua divisão de Química de Materiais.

Segue uma entrevista com o cientista.

Boletim da SBPMat: – Como se despertou seu interesse pela ciência? O que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar em Química do Estado Sólido/Materiais?

Oswaldo Luiz Alves: – Lá se vão muitos anos. Antes de entrarmos para a Universidade participamos muito dos clubes de ciência de nossa escola pública e do nosso bairro na cidade de São Paulo (Perdizes). No clube de ciências do bairro tínhamos um pequeno laboratório com materiais doados por um dos bisnetos do cientista Vital Brazil, onde fizemos muitas experiências de Química e Biologia. Logo em seguida veio um estágio realizado no Instituto Biológico, este mais formal, como requisito do curso técnico de Química Industrial, onde trabalhamos com espectroscopia no infravermelho e polarografia (eletrodo gotejante de mercúrio) aplicadas à determinação de pesticidas. Quando entramos na Unicamp, em 1969, depois de uma experiência na indústria (Bayer do Brasil), para nós já estava claro que continuaríamos os estudos após a graduação, o que nos fez logo engajarmos em pesquisas com compostos de terras-raras, através de uma Bolsa de Iniciação Científica da FAPESP, já pensando em nos tornar professor universitário e pesquisador. Fizemos o doutoramento direto (isto não era muito comum nos anos 70) trabalhando com as espectroscopias Raman-laser e no infravermelho e cálculos teóricos de campos de força moleculares. Em 1979, fomos para a França realizar o pós-doc no Laboratoire de Spectrochimie Infrarouge et Raman do CNRS (CNPq Francês) para trabalhar com espectroscopia Raman com resolução espacial, efeito SERS e CARS e comissionar um dos  primeiros espectrômetros infravermelhos que operavam com transformada de Fourier. Nesta época ocorria na Europa e, principalmente na França (Bordeaux, Rennes e Orsay), uma fortíssima atividade em Química do Estado Sólido, dentro da perspectiva de materiais. Deixamo-nos contaminar!

Ao retornar ao Brasil vimos a oportunidade de fundar o Laboratório de Química do Estado Sólido – LQES (1985), com muita dificuldade, pois a quase totalidade da Química brasileira trabalhava em solução. Em função disso migramos para a comunidade de Física onde permanecemos por cerca de 10 anos, chegando, inclusive, a coordenar atividades ligadas aos materiais nas célebres reuniões da Sociedade Brasileira de Física (SBF) em Caxambu. De lá para cá, sempre estivemos envolvidos com Química do Estado Sólido e Materiais participando do Projeto Fibras Ópticas (Telebras) onde trabalhamos com vidros dopados com quantum dots para telecomunicações, vidros para óptica não linear e, no LQES, em atividades ligadas aos materiais bidimensionais (lamelares), nanocompósitos envolvendo polímeros condutores, sistemas químicos integrados, vitrocerâmicas e vidros porosos, nanopartículas de sílica com funcionalizações complexas, nanotubos de carbono, óxido de grafeno e carbon dots. Nestes três últimos temas nossos esforços estão voltados para o estudo da interação destes novos carbonos com biossistemas dentro da perspectiva da avaliação dos riscos das nanotecnologias (regulação).

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais?

Oswaldo Luiz Alves: – Sempre é muito difícil fazer estas avaliações, entretanto acredito que alguns pontos podem ser elencados.

Em termos da pesquisa científica, nossas principais contribuições foram as pesquisas com vidros dopados com quantum dots e vidros para óptica não linear, o desenvolvimento de técnicas de síntese de vários materiais bidimensionais e sua química de intercalação, o desenvolvimento de sistemas químicos integrados (vidro-polímero condutor, vidro-semicondutores), purificação de nanotubos de carbono (efeito dos debris oxidados) e interação de novos carbonos com biossistemas (efeito “corona” protêico e agregação) e nanopartículas de sílica com funcionalização antagônica para “drug-delivery“.

Criamos o Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES), laboratório pioneiro em pesquisas em Química do Estado Sólido no Brasil, onde atuamos até hoje como Coordenador Científico. Outra contribuição que acreditamos merece destaque foi a nossa atuação como Coordenador do “Programa de Química para Materiais Eletrônicos da FINEP” (final dos anos 80). Muitos dos mais importantes grupos de pesquisa em Materiais que atuaram, ou ainda atuam no Brasil em alto nível, em vários estados, receberam financiamentos deste exitoso programa. Merece ser mencionada nossa participação como fundador e primeiro Diretor da Divisão de Química de Materiais da Sociedade Brasileira de Química. Coordenamos o projeto FAPESP que financiou a construção da primeira linha de EXAFS (XAS), inclusive com participação direta nos programas de formação de usuários em uma técnica espectroscópica que nunca tinha sido utilizada no Brasil. Atualmente estamos atuando como Coordenador Científico do Laboratório de Síntese de Nanoestruturas e Interação com Biossistemas (NanoBioss/SisNano).

Em 2014 completamos 40 anos de docência no Instituto de Química da Unicamp onde formamos mais de 50 alunos (mestrado e doutorado) muitos dos quais hoje são lideres de pesquisa destacados no cenário nacional e internacional e que exercem suas atividades em vários estados brasileiros.

Atuamos como editor científico de dois boletins de notícias. O primeiro é o LQES News, quinzenal, veiculado há 14 anos, com linha editorial ligada aos desenvolvimentos da ciência, tecnologia e inovação (geral) e nanotecnologias. O segundo é o Boletim NANO em Foco, editado em parceria com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, mensal, veiculado há 7 anos, com uma linha editorial ligada aos produtos comerciais, riscos e regulação das nanotecnologias. Além disso, publicamos, também em parceria com a ABDI, a “Cartilha sobre Nanotecnologia (duas edições) destinada à introdução das nanotecnologias para o grande público.

Os diversos sistemas e materiais estudados e desenvolvidos no LQES permitiram o depósito de 27 patentes de processo e aplicação, inclusive algumas internacionais, e um licenciamento de uma tecnologia inovadora para o setor produtivo. Além disso, participamos, como consultor, de dois processos relacionados com o Programa de Subvenção Econômica para Empresas (Nanotecnologia) da FINEP, que levaram ao desenvolvimento de 8 produtos comerciais.

Ao longo destes muitos anos, tivemos a participação em várias atividades relacionadas com a política científica brasileira. Dentre elas destacamos: Coordenador dos CAs (Química) do CNPq e Fapesp. Membro do Conselho Deliberativo do CNPq (2 mandatos) e do Conselho Consultivo da Nanotecnologia (MCTI/SisNano) em todas as suas composições. Atuamos, até o momento, como consultor para a área das nanotecnologias da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). Prestamos consultoria ao Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo para a área de nanotecnologia. Fazemos parte do conselho cientifico da APAE de São Paulo.

Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem para nossos leitores que estão iniciando suas carreiras de  cientistas.

Oswaldo Luiz Alves: – Primeiramente, gostaria de dizer que a carreira científica é fascinante, sobretudo nos tempos em que vivemos, onde as quebras de paradigmas ocorrem amiúde. Outro aspecto, não menos fascinante, é o conviver com a intermulti e transdisciplinaridade que, ao mesmo tempo em que ampliam nossos conhecimentos apontam para nossas limitações. Nestas relações fica claro que o conhecimento sólido e aprofundado de conceitos, técnicas e ferramentas é fundamental. Trata-se de um processo que passa por uma atitude de abertura e pela aquisição de uma “língua franca” que possibilitam a interação de diferentes especialistas e expertises, na resolução de problemas, muito bem identificados, de ciência, tecnologia e inovação. Assim, sempre que possível, devemos procurar um equilíbrio entre atitudes de pesquisa paper oriented e knowledge oriented e, sobretudo, não nos esquecermos de fazer uma segunda leitura de nossos resultados de pesquisa buscando, assim, examinar sua possível conexão com as necessidades do cidadão brasileiro e do desenvolvimento nacional.

Entrevistas com plenaristas do XIII Encontro da SBPMat: Robert Chang (Northwestern University, EUA).

Prof. Chang e outros desenvolvedores de Nanocos, um jogo de cartas que incentiva estudantes a aprender conceitos de ciência e seu papel na escala nano.

Robert Chang é professor de Ciência e Engenharia de Materiais no primeiro departamento acadêmico de Ciência de Materiais do mundo, criado há mais de 50 anos na Northwestern University, na qual ele também é diretor do Instituto de Pesquisa em Materiais.

Ele recebeu o título de Bacharel em Ciências, com habilitação em Física, no Massachusetts Institute of Technology (MIT) e o de doutor em Física de Plasmas na Princeton University. Por 15 anos, ele conduziu pesquisas básicas na Bell Labs. Durante os últimos 28 anos na Northwestern University, também dirigiu diversos centros e programas de pesquisa e educação na área de materiais da National Science Foundation (NSF).

O professor Chang foi presidente da Sociedade de Pesquisa em Materiais dos Estados Unidos, a Materials Research Society (MRS) em 1989. Ocupa o cargo de Secretário Geral e Presidente Fundador da União Internacional de Sociedades de Pesquisa em Materiais (IUMRS, na sigla em inglês). Recebeu várias distinções por seu trabalho, como o Prêmio Woody, da MRS, em 1987, a bolsa Siu Lien Ling Wong, da Universidade Chinesa de Hong Kong, em 1999, e o Prêmio Director´s Distinguished Teaching Scholar da NSF, em 2005. Além de membro da Sociedade Americana de Vácuo e da MRS, ele é membro honorário das Sociedades de Pesquisa em Materiais da Índia, Japão e Coreia.

Ele é (co)autor de 400 artigos em publicações arbitradas, com aproximadamente 13.000 citações e um índice H de 56.

Segue a nossa entrevista com o professor Chang, que dará uma palestra plenária no XIII Encontro da SBPMat.

Boletim SBPMat: – No seu ponto de vista, quais sãos as suas principais contribuições para a área de Ciência e Engenharia de Materiais?

Robert Chang: 1. O processamento a plasma de materiais semicondutores;

2. Materiais baseados em carbono, como o diamante, fulerenos e nanotubos de carbono, e os dispositivos relacionados a eles;

3. Células solares de 3ª geração;

4. Materiais plasmônicos infravermelhos e sensores.

5. Filmes finos de óxidos para dispositivos eletrônicos e fotônicos.

Publicações mais importantes abaixo.

H. Cao, Y. G. Zhao, S. T. Ho, E. W. Seelig, Q. H. Wang, and R. P. H. Chang. Random Laser Action in Semiconductor Powder. Phys. Rev. Lett. 82, 2278 (1999); DOI:http://dx.doi.org/10.1103/PhysRevLett.82.2278.

Michael D. Irwin, D. Bruce Buchholz, Alexander W. Hains, Robert P. H. Chang, and Tobin J. Marks.p-Type semiconducting nickel oxide as an efficiency-enhancing anode interfacial layer in polymer bulk-heterojunction solar cells. PNAS, vol. 105 no. 8, 2783–2787 (2008); doi: 10.1073/pnas.0711990105.

Q. H. Wang, A. A. Setlur, J. M. Lauerhaas, J. Y. Dai, E. W. Seelig and R. P. H. Chang. A nanotube-based field-emission flat panel display. Appl. Phys. Lett. 72, 2912 (1998);http://dx.doi.org/10.1063/1.121493.

Quanchang Li, Vageesh Kumar, Yan Li, Haitao Zhang, Tobin J. Marks, and Robert P. H. Chang. Fabrication of ZnO Nanorods and Nanotubes in Aqueous Solutions. Chem. Mater., 2005, 17 (5), pp 1001–1006. DOI: 10.1021/cm048144q.

Boletim SBPMat: – E quais são as suas principais contribuições para a educação científica, especialmente na área de Ciência de Materiais?

Robert Chang: – Nos últimos 20 anos, eu conduzi o desenvolvimento do programa Materials World Modules para ensinar estudantes pré-universitários sobre materiais e nanotecnologia: materialsworldmodules.orgnclt.usgsasprogram.orgimisee.net.

Boletim SBPMat: – Poderia nos dar uma prévia da sua palestra plenária no Encontro da SBPMat? Do que o senhor pretende tratar?

Robert Chang: – Mobilizar cidadãos do mundo a solucionar problemas globais, juntos!

Boletim SBPMat: – Fique à vontade para deixar uma mensagem aos nossos leitores na comunidade de Pesquisa em Materiais, se quiser.

Robert Chang: – A pesquisa e a educação em materiais e nanotecnologia são a força que impulsionará todas as tecnologias futuras, inclusive nas áreas de energia, meio ambiente, saúde e segurança.