Em Fernando Galembeck, professor colaborador na Unicamp e diretor do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) de 2011 a 2015, o interesse por pesquisa começou a se manifestar na adolescência, quando, trabalhando no laboratório farmacêutico do pai, percebeu a importância econômica que os novos produtos, resultantes de esforços de pesquisa científica, tinham na empresa. Hoje com 72 anos, Fernando Galembeck, olhando para sua própria trajetória científica, pode contar várias histórias nas quais o conhecimento gerado por ele junto a seus colaboradores, além de ser comunicado por meio de artigos científicos, teses e livros, plasmou-se em patentes licenciadas e produtos criados ou aprimorados.
Galembeck gradou-se em Química em 1964 pela Universidade de São Paulo (USP). Após a graduação, permaneceu na USP trabalhando como professor (1965-1980) e, simultaneamente, fazendo o doutorado em Química (1965-1970) com um trabalho de pesquisa sobre dissociação de uma ligação metal-metal. Depois do doutorado, realizou estágios de pós-doutorado nos Estados Unidos, nas universidades do Colorado na cidade de Denver (1972-3) e da Califórnia na cidade de Davis (1974), trabalhando na área de Físico-Química de sistemas biológicos. Em 1976, de volta à USP, teve a oportunidade de criar um laboratório de coloides e superfícies no Instituto de Química. A partir desse momento, Galembeck foi se envolvendo cada vez mais com o desenvolvimento de novos materiais, especialmente os poliméricos, e seus processos de fabricação.
Em 1980, ingressou como docente na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), onde se tornou professor titular em 1988, cargo no qual permaneceu até sua aposentadoria em 2011. Na UNICAMP ocupou cargos de gestão, notadamente o de vice-reitor da universidade, além de diretor do Instituto de Química e coordenador do seu programa de pós-graduação. Em julho de 2011 assumiu a direção do recém-criado LNNano, no Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM).
Ao longo de sua carreira, exerceu funções dirigentes na Academia Brasileira de Ciências (ABC), Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Sociedade Brasileira de Química (SBQ), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e Sociedade Brasileira de Microscopia e Microanálise (SBMM), entre outras entidades.
Bolsista de produtividade de nível 1A no CNPq, Galembeck é autor de cerca de 250 artigos científicos publicados em periódicos internacionais com revisão por pares, os quais contam com mais de 2.300 citações, além de 29 patentes depositadas e mais de 20 livros e capítulos de livros. Orientou quase 80 trabalhos de mestrado e doutorado
Recebeu numerosos prêmios e distinções, entre eles o Prêmio Anísio Teixeira, da CAPES, em 2011; o Telesio-Galilei Gold Metal 2011, da Telesio-Galilei Academy of Science (TGAS); o Prêmio Almirante Álvaro Alberto de Ciência e Tecnologia 2006, do CNPq e Fundação Conrado Wessel; o Troféu José Pelúcio Ferreira, da Finep, em 2006; a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, em 2000, e a Comenda Nacional do Mérito Científico, em 1995, ambos da Presidência da República. Também recebeu uma série de reconhecimentos de empresas e associações científicas e empresariais, como a CPFL, Petrobrás, Union Carbide do Brasil, Associação Brasileira dos Fabricantes de Tintas, Associação Brasileira da Indústria Química, Sindicato da Indústria de Produtos Químicos para fins Industriais do Estado do Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Polímeros, Sociedade Brasileira de Química (que criou o Prêmio Fernando Galembeck de Inovação Tecnológica), Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo e da Electrostatic Society of America.
Segue uma entrevista com o cientista.
Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar em temas da área de Materiais.
Fernando Galembeck: – Meu interesse por atividade de pesquisa começou na minha adolescência quando eu percebi a importância do conhecimento novo, da descoberta. Eu percebi isso porque trabalhava, depois das aulas, no laboratório farmacêutico do meu pai e eu via a importância que tinham os produtos mais novos, os mais recentes. Eu via também como pesava economicamente para o laboratório o fato de depender de produtos importados que não eram fabricados no Brasil e que no país não havia competência para faze-los. Aí percebi o valor do conhecimento novo, a importância que tinha e o significado econômico e estratégico das descobertas.
Isso se incrementou quando eu fiz o curso de Química. Eu fui fazer o curso de Química porque um professor meu no colégio sugeriu que eu procurasse uma carreira ligada à pesquisa. Ele deve ter percebido alguma inclinação, alguma tendência minha. E eu fiz o curso de Química na Faculdade de Filosofia, num ambiente em que a atividade de pesquisa era muito forte. Por causa disso eu resolvi fazer o doutorado na USP. Naquela época não havia ainda cursos de pós-graduação regulares no Brasil. O orientador com quem eu defendi a tese, que foi o professor Pawel Krumholz, era um pesquisador muito bom e também tinha feito uma carreira muito importante trabalhando em empresa. Ele foi diretor industrial da Orquima, uma empresa muito importante na época. Isso aumentou meu interesse por pesquisa.
Trabalhei em Química por alguns anos e meu interesse por materiais veio de uma situação curiosa. Eu estava praticamente me formando, nas férias do meu último ano da graduação. Estava num apartamento, depois do almoço, descansando. Lembro-me de ter olhado as paredes do apartamento e percebido que, com tudo que eu tinha aprendido no curso de Química, eu não tinha muito a dizer sobre as coisas que eu enxergava: a tinta, os revestimentos etc. Aquilo era Química, mas também era Materiais, e naquela época não havia no curso de Química muito interesse por materiais. De fato, materiais se tornaram muito importantes em Química por causa dos plásticos e borrachas, principalmente, que nessa época ainda não tinham a importância que têm hoje. Estou falando de 1964, aproximadamente.
Bem, aí comecei a trabalhar em Físico-Química, depois trabalhei um pouco numa área mais voltada à Bioquímica, a Físico-Química Biológica, e, em 1976, recebi uma tarefa do Departamento na USP, que era a de instalar um laboratório de coloides e superfícies. Um dos primeiros projetos foi de modificação de superfície de plásticos, no caso, o teflon. E aí eu percebi que uma grande parte da Química de coloides e superfícies existia por causa de Materiais, porque ela se prestava para criar e desenvolver novos materiais. A partir daí eu fui me envolvendo cada vez mais com materiais, principalmente com polímeros, um pouco menos, com cerâmicos e, menos ainda, com metais.
Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais? Considere na sua resposta todos os aspectos da sua atividade profissional, inclusive os casos de transferência de conhecimento à indústria.
Fernando Galembeck: – Eu vou falar mais ou menos seguindo a história. Eu acho que o primeiro resultado importante na área de Materiais foi justamente uma técnica voltada à modificação de superfície de teflon, que é um material no qual é muito difícil alguma coisa grudar. Tanto que tem a expressão do “político teflon”, que é aquele em que nada que se joga gruda. Só que, em determinadas situações, a gente quer conseguir adesão no teflon, que determinada coisa grude. E por um caminho um pouco complicado, eu acabei percebendo que eu já sabia fazer uma modificação de teflon, mas que eu nunca tinha percebido que era importante. Eu conhecia o fenômeno; tinha observado ele durante minha defesa de tese. Eu sabia que acontecia uma transformação do teflon. Mas foi quando estava visitando um laboratório da Unilever em 1976, conversando com um pesquisador, que eu percebi que havia gente se esforçando para modificar a superfície do teflon e conseguir adesão. Aí, juntando o problema com a solução, logo que voltei ao Brasil tentei verificar se aquilo que eu tinha observado anteriormente realmente serviria, e deu certo. Isso deu origem à minha primeira publicação sozinho e a meu primeiro pedido de patente, numa época em que praticamente não se falava em patentes no Brasil, principalmente no ambiente universitário. Eu fiquei muito entusiasmado com o seguinte: fui procurado por empresas que tinham interesse em aproveitar aquilo que eu tinha feito; uma no próprio teflon, outra em outro polímero. Então eu me senti muito bem, porque tinha uma descoberta, tinha uma patente e tinha empresas que, pelo menos, queriam saber o que era para ver a possibilidade de utilizá-la. E mais uma coisa, logo depois da publicação do artigo eu recebi um convite para participar de um congresso nos Estados Unidos que abordava justamente a questão de modificação de superfícies. Superfícies de polímeros, de plásticos e borrachas, foi um assunto com o qual fiquei envolvido praticamente durante todo o resto da minha vida, até agora.
Eu vou mencionar um segundo fato, que até o momento não teve consequências do mesmo tipo. Eu descobri um método que permite fazer uma caracterização e uma separação de partículas muito pequenas. Foi um trabalho bastante interessante. Isso foi publicado, também gerou um depósito de patente, mas não teve uma consequência prática. Recentemente surgiram problemas ligados com nanopartículas, que é um assunto muito importante hoje em Materiais, e que representam uma possibilidade de aplicação daquilo que eu fiz há mais de 30 anos. O nome da técnica é osmossedimentação.
Em seguida veio um trabalho que fiz trabalhando em projetos junto com a Pirelli cabos. Com essa história de superfícies e polímeros acho que eu tinha me tornado mais ou menos conhecido e fui procurado pela Pirelli, que me contratou como consultor e também contratou projetos que fiz na Unicamp. Um resultado desses projetos, que eu acho mais importante, foi o desenvolvimento de um isolante para tensões elétricas muito altas. Esse não foi um trabalho só meu, mas sim de uma equipe bastante grande, da qual fiz parte. Tinha várias pessoas da Pirelli e várias na Unicamp. O resultado desse projeto foi que a Pirelli brasileira conseguiu ser contratada para fornecer os cabos de alta tensão do Eurotúnel, ainda nos anos 80. Eu acho que esse foi um caso bem importante que teve um produto e significou um resultado econômico importante. Aqui eu quero insistir que isso foi feito no Brasil, por uma equipe brasileira. A empresa não era brasileira, mas a equipe estava aqui.
Depois teve vários trabalhos feitos com nanopartículas, numa época em que a gente nem as chamava de nanopartículas; chamávamo-las de partículas finas ou simplesmente de partículas coloidais pequenas. O primeiro trabalho que eu publiquei sobre nanopartículas foi em 1978. Teve outras coisas feitas em seguida que, no fim, acabaram desaguando num trabalho sobre fosfato de alumínio, que deu origem a teses feitas no laboratório e publicações, e também foi licenciado por uma empresa chamada Amorphic Solutions, do grupo Bunge, que explora, basicamente, fosfato de alumínio. O assunto começou em meu laboratório, ficou no laboratório por vários anos, depois uma empresa do grupo Bunge aqui no Brasil se interessou, passou a participar, nós colaboramos. Isso se tornou um projeto bastante grande de desenvolvimento. A Bunge depois achou inviável tocar o projeto no Brasil e hoje está lá nos Estados Unidos. Eu acho uma pena que esteja lá, mas aí teve outras questões envolvidas, inclusive de desentendimento com a Unicamp, que é a titular das patentes. Se olhar a página da Amorphic Solutions na Internet você poderá ver várias aplicações do produto. Pelo que percebo, atualmente estão enfatizando o uso como material anticorrosivo para proteção de aço.
Mais ou menos na mesma época, num trabalho ligado também a nanopartículas, teve o desenvolvimento de nanocompósitos de borracha natural com argilas. Isso foi licenciado por uma empresa brasileira chamada Orbys, que lançou um produto chamado Imbrik, que é um produto que a empresa fornece, por exemplo, para fazer rolos de borracha para fabricação de papel.
Outro caso de produto. Eu tinha feito um projeto com a Oxiteno, que fabrica matérias primas para látex, os tensoativos. Ela queria ter uma ideia de quanto se consegue mudar o látex mudando o tensoativo. Eu fiz um projeto com eles, que considero um dos mais interessantes daqueles em que estive envolvido. O resultado foi que percebemos que, mudando um pouco o tensoativo, nós mudávamos muito o látex. Esses látex são usados em tintas, adesivos, resinas. Então a gente via que tinham uma variabilidade enorme. Esse trabalho foi divulgado, foi publicado. Não deu patente porque foi um trabalho de entendimento. Então, uma outra empresa, a Indústrias Químicas Taubaté (IQT) me procurou para fazer um látex catiônico, mas por um caminho novo. Látex catiônicos em geral são feitos com sais de amônio quaternários, os quais têm algumas restrições ambientais. A empresa queria uma alternativa que não tivesse essas restrições. No fim do projeto nós fizemos os látex catiônicos sem as restrições ambientais e a IQT colocou o produto no mercado.
Teve outro caso, que também foi muito interessante, apesar de que acabou morrendo. Aqui no Brasil havia uma grande fabricante de polietileno tereftalato, o PET, que é usado para muitas coisas, inclusive para garrafas. Eles souberam do trabalho que eu tinha feito com nanocompósitos, aquele da Orbys que eu mencionei, e me procuraram querendo fazer nanocompósitos do PET. Nós tivemos que procurar escapar daquilo que já estava patenteado no exterior e conseguimos um caminho totalmente novo. A empresa chamava-se Rhodia-Ster, e hoje ela faz parte de uma outra empresa, italiana, chamada Mossi e Ghisolfi. A empresa se entusiasmou e acabou patenteando isso no Brasil, e, em seguida depois, no exterior. Numa certa altura, eles resolveram que iam tocar o trabalho internamente, e o fizeram durante alguns anos. Um dia o meu contato na empresa me telefonou para me dizer o seguinte: “Olha, nós estávamos trabalhando com duas tecnologias; uma era essa aí com a Unicamp e a outra, em outro país. As duas estão funcionando, mas agora a empresa chegou num ponto em que optou por completar o desenvolvimento de uma”. Quando chegam na fase final de um desenvolvimento de materiais, os custos dos projetos ficam muito altos. Tem que usar grandes quantidades de materiais, fazer muitos testes com clientes. Então, a empresa decidiu tocar uma, que infelizmente não era aquela na qual eu tinha trabalhado. No fim das contas, foi um pouco frustrante, mas acho que foi interessante porque durante esse tempo todo, a empresa apostou bastante no caminho que a gente tinha iniciado aqui. Além disso, cada projeto desses significa recursos para o laboratório, significa dinheiro para contratar gente, empregos etc. Então, esses projetos acaba dando muitos benefícios, mesmo quando não chegam até o fim.
Agora, pulando alguns pedaços, vou chegar no último resultado, que é bem recente, de depois que eu sai da Unicamp e vim para o CNPEM. Um objetivo do CNPEM é o aproveitamento de materiais de fonte renovável para fazer materiais avançados. Tem toda uma filosofia por trás disso, relacionada ao esgotamento de recursos naturais, à sustentabilidade… Nós temos trabalhado bastante para conseguir fazer coisas novas com materiais derivados da biomassa, e o principal interesse está na celulose. Ela é o polímero mais abundante do mundo, mas é um polímero muito difícil de trabalhar. Você não consegue processar celulose como processa polietileno, por exemplo. Uma de nossas metas tem sido procurar formas de plastificar a celulose; ou seja, trabalhar a celulose da forma mais parecida possível àquela que usamos para trabalhar com polímeros sintéticos. Um resultado recente dentro dessa ideia é que nós conseguimos fazer adesivos de celulose em que o único polímero é a própria celulose, o que é uma coisa nova. Foi depositado um pedido de patente no começo do ano, nós estamos submetendo isso agora para publicação e pretendemos trabalhar com empresas interessadas no assunto. Já estamos discutindo um projeto para uma aplicação específica dessa celulose modificada, com uma empresa.
Esse é o caso mais recente. No meio do caminho, vários outros projetos foram feitos com empresas, em questões do interesse das empresas. Revestir uma coisa, colar outra, modificar um polímero para conseguir um certo resultado. Mas essas foram respostas a demandas das empresas, não foram pesquisas iniciadas no laboratório.
Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem para nossos leitores que estão iniciando suas carreiras de cientistas.
Fernando Galembeck: – Em primeiro lugar, em qualquer carreira que a pessoa escolher, ela tem que ter uma dose de paixão. Não importa se a pessoa vai trabalhar no mercado financeiro, em saúde ou o que quer que ela vá fazer; antes de mais nada, o que manda é o gosto. A pessoa querer fazer uma carreira porque ela vai dar dinheiro, porque vai dar status… Eu acho que é ruim escolher assim. Se a pessoa fizer as coisas com gosto, com interesse, o dinheiro, o prestígio, o status virão por outros caminhos. O objetivo é que a pessoa faça uma coisa que a deixe feliz, que se sinta bem fazendo-a, que a deixe realizada. Isso vale não só para a carreira científica, mas para qualquer outra carreira também. Na científica, é fundamental.
Outra coisa é que tem que estar preparado para o trabalho duro. Não existe caminho fácil. Eu conheço pessoas jovens que procuram muito a grande sacada que vai lhes trazer sucesso com relativamente pouco trabalho. Bom, eu acho melhor não esperarem isso. Pode até acontecer, mas esperar isso é mais ou menos a mesma coisa do que esperar ganhar a Mega-Sena para ficar rico.
Eu já tenho mais de 70 anos, então já vi muita gente e muita coisa acontecer. Algo que me chama a atenção é como jovens que pareciam muito promissores acabam não dando muito certo. Francamente, eu penso que uma coisa que não é boa é um jovem dar certo muito cedo, porque eu tenho a impressão de que ele acostuma com a ideia de que sempre vai dar certo. E o problema é que não tem nada, nem ninguém, nem nenhuma empresa que sempre dê muito certo. Sempre vai ter o momento do fracasso, o momento da frustação. Se a pessoa está preparada para isso, quando chega o momento, ela supera, enquanto outros são destruídos – não conseguem superar. Por isso tem que ter cuidado para não se iludir com o sucesso, achar que, porque deu certo uma vez, sempre dará certo. Tem que estar preparado para lutar.
Quando eu fiz faculdade, pensar em fazer pesquisa parecia uma coisa muito estranha, coisa de maluco. As pessoas não sabiam muito bem o que era isso nem por que uma pessoa iria fazer isso. Tinha gente que dizia que a pesquisa era como um sacerdócio. Eu trabalhei sempre com pesquisa, associada com ensino, associada com consultoria e, sem que eu nunca tenha procurado ficar rico, consegui ter uma situação econômica que eu acho que é muito confortável. Mas eu insisto, meu objetivo era fazer o desenvolvimento, fazer o material, não o dinheiro que eu iria ganhar. O dinheiro veio, ele vem. Então, eu sugiro que as pessoas focalizem o trabalho, os resultados e a contribuição que o trabalho delas pode dar para outras pessoas, para o ambiente, para a comunidade, para o país, para o conhecimento. O resto virá por acréscimo.
Resumindo, a minha mensagem é: trabalhem seriamente, dedicadamente e com paixão.
Finalmente, eu gostaria de dizer que acho que o trabalho de pesquisa, o trabalho de desenvolvimento ajuda muito a pessoa a crescer como pessoa. Ele afasta a pessoa de algumas ideias que não são muito proveitosas e bota a pessoa dentro de atitudes que são importantes e realmente ajudam. Uma vez um estudante perguntou para Galileu: “Mestre, o que é o método?”. A resposta de Galileu foi: “O método é a dúvida”. Eu acho que isso é muito importante em atividade de pesquisa, a qual, em Materiais, em particular, é especialmente interessante porque o resultado final é uma coisa que a gente pega na mão. Na atividade de pesquisa a pessoa tem que estar o tempo todo se perguntando: “Eu estou pensando isto, mas será que estou pensando certo?”, ou “Fulano escreveu aquilo, mas qual é a base do que ele escreveu?”. Essa é uma atitude muito diferente da atitude dogmática, que é comum no domínio da política e da religião, e muito diferente da atitude da pessoa que tem que enganar, como o advogado do mafioso ou do traficante. O pesquisador tem que se comprometer com a verdade. Claro que também existem pessoas que se dizem pesquisadores e promovem a desinformação. Alguns anos atrás, falava-se de uma coisa chamada de “Bush science”, expressão que remete ao presidente Bush. A “Bush science” eram os argumentos criados por pessoas que ganhavam dinheiro como cientistas, mas que produziam argumentos para dar sustentação às políticas de Bush. Ou seja, o problema existe em ciência também, mas aí voltamos àquilo que falei no início. A pessoa não pode entrar nisto porque vai ganhar dinheiro, vai ter prestígio ou vai ser convidado para jantar com o presidente; ela tem que entrar nisto pelo interesse que ela tem pelo próprio assunto.