Notícias da SBPMat: Interações internacionais em reuniões em San Francisco.

“Golden Gate Bridge, SF (cropped)” by Bernard Gagnon – Own work. Licensed under CC BY-SA 3.0 via Wikimedia Commons.

Entre 6 e 10 de abril deste ano, o professor Roberto Mendonça Faria, presidente da nossa SBPMat, esteve em San Francisco (Califórnia, Estados Unidos), participando do “2015 MRS Spring Meeting”, um dos dois encontros anuais da Materials Research Society (MRS). Na ocasião, representando a SBPMat, o professor Faria realizou uma série de reuniões.

Numa delas, participaram o presidente, a vice-presidente e o diretor executivo da MRS, respectivamente, Oliver Kraft, Kristi S. Anseth e Todd M. Osman. Nessa reunião, os diretivos das duas sociedades acordaram a continuidade do contrato que disponibiliza as publicações da MRS aos sócios da SBPMat e discutiram formas de estabelecer colaborações entre os programas University Chapters de ambas as sociedades. Além disso, o presidente da SBPMat convidou os três diretivos da MRS a participarem do décimo quarto encontro da sociedade.

Em outra reunião, participaram, além do professor Faria, o professor Robert Chang, secretário geral da International Union of Materials Research Societies (IUMRS), e o professor José Alberto Giacometti, membro do Conselho da SBPMat. Os três professores definiram que serão coorganizadores do “simpósio U” do XIV Encontro da SBPMat, intitulado “Importance of social implications of nanotechnologies in Science popularization“. O simpósio já conta com dois palestrantes convidados: Guillermo Foladori (Universidad Autónoma de Zacatecas, México) e Noela Invernizzi (Universidade Federal do Paraná, Brasil). Na reunião, o professor Chang, que foi plenary speaker no XIII Encontro da SBPMat, confirmou sua presença no encontro deste ano.

Numa terceira reunião, o presidente da SBPMat conversou com representantes do Institute of Physics (IOP), e ambas as partes manifestaram o desejo de levar adiante o projeto da publicação “Science Impact”, a qual, de acordo com o professor Faria, está tendo uma excelente repercussão.

Gente da nossa comunidade: entrevista com o pesquisador Fernando Galembeck.

Em Fernando Galembeck, professor colaborador na Unicamp e diretor do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) de 2011 a 2015, o interesse por pesquisa começou a se manifestar na adolescência, quando, trabalhando no laboratório farmacêutico do pai, percebeu a importância econômica que os novos produtos, resultantes de esforços de pesquisa científica, tinham na empresa. Hoje com 72 anos, Fernando Galembeck, olhando para sua própria trajetória científica, pode contar várias histórias nas quais o conhecimento gerado por ele junto a seus colaboradores, além de ser comunicado por meio de artigos científicos, teses e livros, plasmou-se em patentes licenciadas e produtos criados ou aprimorados.

Galembeck gradou-se em Química em 1964 pela Universidade de São Paulo (USP). Após a graduação, permaneceu na USP trabalhando como professor (1965-1980) e, simultaneamente, fazendo o doutorado em Química (1965-1970) com um trabalho de pesquisa sobre dissociação de uma ligação metal-metal. Depois do doutorado, realizou estágios de pós-doutorado nos Estados Unidos, nas universidades do Colorado na cidade de Denver (1972-3) e da Califórnia na cidade de Davis (1974), trabalhando na área de Físico-Química de sistemas biológicos. Em 1976, de volta à USP, teve a oportunidade de criar um laboratório de coloides e superfícies no Instituto de Química. A partir desse momento, Galembeck foi se envolvendo cada vez mais com o desenvolvimento de novos materiais, especialmente os poliméricos, e seus processos de fabricação.  

Em 1980, ingressou como docente na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), onde se tornou professor titular em 1988, cargo no qual permaneceu até sua aposentadoria em 2011. Na UNICAMP ocupou cargos de gestão, notadamente o de vice-reitor da universidade, além de diretor do Instituto de Química e coordenador do seu programa de pós-graduação. Em julho de 2011 assumiu a direção do recém-criado LNNano, no Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM).

Ao longo de sua carreira, exerceu funções dirigentes na Academia Brasileira de Ciências (ABC), Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Sociedade Brasileira de Química (SBQ), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e Sociedade Brasileira de Microscopia e Microanálise (SBMM), entre outras entidades.

Bolsista de produtividade de nível 1A no CNPq, Galembeck é autor de cerca de 250 artigos científicos publicados em periódicos internacionais com revisão por pares, os quais contam com mais de 2.300 citações, além de 29 patentes depositadas e mais de 20 livros e capítulos de livros. Orientou quase 80 trabalhos de mestrado e doutorado

Recebeu numerosos prêmios e distinções, entre eles o Prêmio Anísio Teixeira, da CAPES, em 2011; o Telesio-Galilei Gold Metal 2011, da Telesio-Galilei Academy of Science (TGAS); o Prêmio Almirante Álvaro Alberto de Ciência e Tecnologia 2006, do CNPq e Fundação Conrado Wessel; o Troféu José Pelúcio Ferreira, da Finep, em 2006; a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, em 2000, e a Comenda Nacional do Mérito Científico, em 1995, ambos da Presidência da República. Também recebeu uma série de reconhecimentos de empresas e associações científicas e empresariais, como a CPFL, Petrobrás, Union Carbide do Brasil, Associação Brasileira dos Fabricantes de Tintas, Associação Brasileira da Indústria Química, Sindicato da Indústria de Produtos Químicos para fins Industriais do Estado do Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Polímeros, Sociedade Brasileira de Química (que criou o Prêmio Fernando Galembeck de Inovação Tecnológica), Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo e da Electrostatic Society of America.

Segue uma entrevista com o cientista.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar em temas da área de Materiais.

Fernando Galembeck: – Meu interesse por atividade de pesquisa começou na minha adolescência quando eu percebi a importância do conhecimento novo, da descoberta. Eu percebi isso porque trabalhava, depois das aulas, no laboratório farmacêutico do meu pai e eu via a importância que tinham os produtos mais novos, os mais recentes. Eu via também como pesava economicamente para o laboratório o fato de depender de produtos importados que não eram fabricados no Brasil e que no país não havia competência para faze-los. Aí percebi o valor do conhecimento novo, a importância que tinha e o significado econômico e estratégico das descobertas.

Isso se incrementou quando eu fiz o curso de Química. Eu fui fazer o curso de Química porque um professor meu no colégio sugeriu que eu procurasse uma carreira ligada à pesquisa. Ele deve ter percebido alguma inclinação, alguma tendência minha. E eu fiz o curso de Química na Faculdade de Filosofia, num ambiente em que a atividade de pesquisa era muito forte. Por causa disso eu resolvi fazer o doutorado na USP. Naquela época não havia ainda cursos de pós-graduação regulares no Brasil. O orientador com quem eu defendi a tese, que foi o professor Pawel Krumholz, era um pesquisador muito bom e também tinha feito uma carreira muito importante trabalhando em empresa. Ele foi diretor industrial da Orquima, uma empresa muito importante na época. Isso aumentou meu interesse por pesquisa.

Trabalhei em Química por alguns anos e meu interesse por materiais veio de uma situação curiosa. Eu estava praticamente me formando, nas férias do meu último ano da graduação. Estava num apartamento, depois do almoço, descansando. Lembro-me de ter olhado as paredes do apartamento e percebido que, com tudo que eu tinha aprendido no curso de Química, eu não tinha muito a dizer sobre as coisas que eu enxergava: a tinta, os revestimentos etc. Aquilo era Química, mas também era Materiais, e naquela época não havia no curso de Química muito interesse por materiais. De fato, materiais se tornaram muito importantes em Química por causa dos plásticos e borrachas, principalmente, que nessa época ainda não tinham a importância que têm hoje. Estou falando de 1964, aproximadamente.

Bem, aí comecei a trabalhar em Físico-Química, depois trabalhei um pouco numa área mais voltada à Bioquímica, a Físico-Química Biológica, e, em 1976, recebi uma tarefa do Departamento na USP, que era a de instalar um laboratório de coloides e superfícies. Um dos primeiros projetos foi de modificação de superfície de plásticos, no caso, o teflon. E aí eu percebi que uma grande parte da Química de coloides e superfícies existia por causa de Materiais, porque ela se prestava para criar e desenvolver novos materiais. A partir daí eu fui me envolvendo cada vez mais com materiais, principalmente com polímeros, um pouco menos, com cerâmicos e, menos ainda, com metais.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais? Considere na sua resposta todos os aspectos da sua atividade profissional, inclusive os casos de transferência de conhecimento à indústria.

Fernando Galembeck: – Eu vou falar mais ou menos seguindo a história. Eu acho que o primeiro resultado importante na área de Materiais foi justamente uma técnica voltada à modificação de superfície de teflon, que é um material no qual é muito difícil alguma coisa grudar. Tanto que tem a expressão do “político teflon”, que é aquele em que nada que se joga gruda. Só que, em determinadas situações, a gente quer conseguir adesão no teflon, que determinada coisa grude. E por um caminho um pouco complicado, eu acabei percebendo que eu já sabia fazer uma modificação de teflon, mas que eu nunca tinha percebido que era importante. Eu conhecia o fenômeno; tinha observado ele durante minha defesa de tese. Eu sabia que acontecia uma transformação do teflon. Mas foi quando estava visitando um laboratório da Unilever em 1976, conversando com um pesquisador, que eu percebi que havia gente se esforçando para modificar a superfície do teflon e conseguir adesão. Aí, juntando o problema com a solução, logo que voltei ao Brasil tentei verificar se aquilo que eu tinha observado anteriormente realmente serviria, e deu certo. Isso deu origem à minha primeira publicação sozinho e a meu primeiro pedido de patente, numa época em que praticamente não se falava em patentes no Brasil, principalmente no ambiente universitário. Eu fiquei muito entusiasmado com o seguinte: fui procurado por empresas que tinham interesse em aproveitar aquilo que eu tinha feito; uma no próprio teflon, outra em outro polímero. Então eu me senti muito bem, porque tinha uma descoberta, tinha uma patente e tinha empresas que, pelo menos, queriam saber o que era para ver a possibilidade de utilizá-la. E mais uma coisa, logo depois da publicação do artigo eu recebi um convite para participar de um congresso nos Estados Unidos que abordava justamente a questão de modificação de superfícies. Superfícies de polímeros, de plásticos e borrachas, foi um assunto com o qual fiquei envolvido praticamente durante todo o resto da minha vida, até agora.

Eu vou mencionar um segundo fato, que até o momento não teve consequências do mesmo tipo. Eu descobri um método que permite fazer uma caracterização e uma separação de partículas muito pequenas. Foi um trabalho bastante interessante. Isso foi publicado, também gerou um depósito de patente, mas não teve uma consequência prática. Recentemente surgiram problemas ligados com nanopartículas, que é um assunto muito importante hoje em Materiais, e que representam uma possibilidade de aplicação daquilo que eu fiz há mais de 30 anos. O nome da técnica é osmossedimentação.

Em seguida veio um trabalho que fiz trabalhando em projetos junto com a Pirelli cabos. Com essa história de superfícies e polímeros acho que eu tinha me tornado mais ou menos conhecido e fui procurado pela Pirelli, que me contratou como consultor e também contratou projetos que fiz na Unicamp. Um resultado desses projetos, que eu acho mais importante, foi o desenvolvimento de um isolante para tensões elétricas muito altas. Esse não foi um trabalho só meu, mas sim de uma equipe bastante grande, da qual fiz parte. Tinha várias pessoas da Pirelli e várias na Unicamp. O resultado desse projeto foi que a Pirelli brasileira conseguiu ser contratada para fornecer os cabos de alta tensão do Eurotúnel, ainda nos anos 80. Eu acho que esse foi um caso bem importante que teve um produto e significou um resultado econômico importante. Aqui eu quero insistir que isso foi feito no Brasil, por uma equipe brasileira. A empresa não era brasileira, mas a equipe estava aqui.

Depois teve vários trabalhos feitos com nanopartículas, numa época em que a gente nem as chamava de nanopartículas; chamávamo-las de partículas finas ou simplesmente de partículas coloidais pequenas. O primeiro trabalho que eu publiquei sobre nanopartículas foi em 1978. Teve outras coisas feitas em seguida que, no fim, acabaram desaguando num trabalho sobre fosfato de alumínio, que deu origem a teses feitas no laboratório e publicações, e também foi licenciado por uma empresa chamada Amorphic Solutions, do grupo Bunge, que explora, basicamente, fosfato de alumínio. O assunto começou em meu laboratório, ficou no laboratório por vários anos, depois uma empresa do grupo Bunge aqui no Brasil se interessou, passou a participar, nós colaboramos. Isso se tornou um projeto bastante grande de desenvolvimento. A Bunge depois achou inviável tocar o projeto no Brasil e hoje está lá nos Estados Unidos. Eu acho uma pena que esteja lá, mas aí teve outras questões envolvidas, inclusive de desentendimento com a Unicamp, que é a titular das patentes. Se olhar a página da Amorphic Solutions na Internet você poderá ver várias aplicações do produto. Pelo que percebo, atualmente estão enfatizando o uso como material anticorrosivo para proteção de aço.

Mais ou menos na mesma época, num trabalho ligado também a nanopartículas, teve o desenvolvimento de nanocompósitos de borracha natural com argilas. Isso foi licenciado por uma empresa brasileira chamada Orbys, que lançou um produto chamado Imbrik, que é um produto que a empresa fornece, por exemplo, para fazer rolos de borracha para fabricação de papel.

Outro caso de produto. Eu tinha feito um projeto com a Oxiteno, que fabrica matérias primas para látex, os tensoativos. Ela queria ter uma ideia de quanto se consegue mudar o látex mudando o tensoativo. Eu fiz um projeto com eles, que considero um dos mais interessantes daqueles em que estive envolvido. O resultado foi que percebemos que, mudando um pouco o tensoativo, nós mudávamos muito o látex. Esses látex são usados em tintas, adesivos, resinas. Então a gente via que tinham uma variabilidade enorme. Esse trabalho foi divulgado, foi publicado. Não deu patente porque foi um trabalho de entendimento. Então, uma outra empresa, a Indústrias Químicas Taubaté (IQT) me procurou para fazer um látex catiônico, mas por um caminho novo. Látex catiônicos em geral são feitos com sais de amônio quaternários, os quais têm algumas restrições ambientais. A empresa queria uma alternativa que não tivesse essas restrições. No fim do projeto nós fizemos os látex catiônicos sem as restrições ambientais e a IQT colocou o produto no mercado.

Teve outro caso, que também foi muito interessante, apesar de que acabou morrendo. Aqui no Brasil havia uma grande fabricante de polietileno tereftalato, o PET, que é usado para muitas coisas, inclusive para garrafas. Eles souberam do trabalho que eu tinha feito com nanocompósitos, aquele da Orbys que eu mencionei, e me procuraram querendo fazer nanocompósitos do PET. Nós tivemos que procurar escapar daquilo que já estava patenteado no exterior e conseguimos um caminho totalmente novo. A empresa chamava-se Rhodia-Ster, e hoje ela faz parte de uma outra empresa, italiana, chamada Mossi e Ghisolfi. A empresa se entusiasmou e acabou patenteando isso no Brasil, e, em seguida depois, no exterior. Numa certa altura, eles resolveram que iam tocar o trabalho internamente, e o fizeram durante alguns anos. Um dia o meu contato na empresa me telefonou para me dizer o seguinte: “Olha, nós estávamos trabalhando com duas tecnologias; uma era essa aí com a Unicamp e a outra, em outro país. As duas estão funcionando, mas agora a empresa chegou num ponto em que optou por completar o desenvolvimento de uma”. Quando chegam na fase final de um desenvolvimento de materiais, os custos dos projetos ficam muito altos. Tem que usar grandes quantidades de materiais, fazer muitos testes com clientes. Então, a empresa decidiu tocar uma, que infelizmente não era aquela na qual eu tinha trabalhado. No fim das contas, foi um pouco frustrante, mas acho que foi interessante porque durante esse tempo todo, a empresa apostou bastante no caminho que a gente tinha iniciado aqui. Além disso, cada projeto desses significa recursos para o laboratório, significa dinheiro para contratar gente, empregos etc. Então, esses projetos acaba dando muitos benefícios, mesmo quando não chegam até o fim.

Agora, pulando alguns pedaços, vou chegar no último resultado, que é bem recente, de depois que eu sai da Unicamp e vim para o CNPEM. Um objetivo do CNPEM é o aproveitamento de materiais de fonte renovável para fazer materiais avançados. Tem toda uma filosofia por trás disso, relacionada ao esgotamento de recursos naturais, à sustentabilidade… Nós temos trabalhado bastante para conseguir fazer coisas novas com materiais derivados da biomassa, e o principal interesse está na celulose. Ela é o polímero mais abundante do mundo, mas é um polímero muito difícil de trabalhar. Você não consegue processar celulose como processa polietileno, por exemplo. Uma de nossas metas tem sido procurar formas de plastificar a celulose; ou seja, trabalhar a celulose da forma mais parecida possível àquela que usamos para trabalhar com polímeros sintéticos. Um resultado recente dentro dessa ideia é que nós conseguimos fazer adesivos de celulose em que o único polímero é a própria celulose, o que é uma coisa nova. Foi depositado um pedido de patente no começo do ano, nós estamos submetendo isso agora para publicação e pretendemos trabalhar com empresas interessadas no assunto. Já estamos discutindo um projeto para uma aplicação específica dessa celulose modificada, com uma empresa.

Esse é o caso mais recente. No meio do caminho, vários outros projetos foram feitos com empresas, em questões do interesse das empresas. Revestir uma coisa, colar outra, modificar um polímero para conseguir um certo resultado. Mas essas foram respostas a demandas das empresas, não foram pesquisas iniciadas no laboratório.

Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem para nossos leitores que estão iniciando suas carreiras de cientistas.

Fernando Galembeck: – Em primeiro lugar, em qualquer carreira que a pessoa escolher, ela tem que ter uma dose de paixão. Não importa se a pessoa vai trabalhar no mercado financeiro, em saúde ou o que quer que ela vá fazer; antes de mais nada, o que manda é o gosto. A pessoa querer fazer uma carreira porque ela vai dar dinheiro, porque vai dar status… Eu acho que é ruim escolher assim. Se a pessoa fizer as coisas com gosto, com interesse, o dinheiro, o prestígio, o status virão por outros caminhos. O objetivo é que a pessoa faça uma coisa que a deixe feliz, que se sinta bem fazendo-a, que a deixe realizada. Isso vale não só para a carreira científica, mas para qualquer outra carreira também. Na científica, é fundamental.

Outra coisa é que tem que estar preparado para o trabalho duro. Não existe caminho fácil. Eu conheço pessoas jovens que procuram muito a grande sacada que vai lhes trazer sucesso com relativamente pouco trabalho. Bom, eu acho melhor não esperarem isso. Pode até acontecer, mas esperar isso é mais ou menos a mesma coisa do que esperar ganhar a Mega-Sena para ficar rico.

Eu já tenho mais de 70 anos, então já vi muita gente e muita coisa acontecer. Algo que me chama a atenção é como jovens que pareciam muito promissores acabam não dando muito certo. Francamente, eu penso que uma coisa que não é boa é um jovem dar certo muito cedo, porque eu tenho a impressão de que ele acostuma com a ideia de que sempre vai dar certo. E o problema é que não tem nada, nem ninguém, nem nenhuma empresa que sempre dê muito certo. Sempre vai ter o momento do fracasso, o momento da frustação. Se a pessoa está preparada para isso, quando chega o momento, ela supera, enquanto outros são destruídos – não conseguem superar. Por isso tem que ter cuidado para não se iludir com o sucesso, achar que, porque deu certo uma vez, sempre dará certo. Tem que estar preparado para lutar.

Quando eu fiz faculdade, pensar em fazer pesquisa parecia uma coisa muito estranha, coisa de maluco. As pessoas não sabiam muito bem o que era isso nem por que uma pessoa iria fazer isso. Tinha gente que dizia que a pesquisa era como um sacerdócio. Eu trabalhei sempre com pesquisa, associada com ensino, associada com consultoria e, sem que eu nunca tenha procurado ficar rico, consegui ter uma situação econômica que eu acho que é muito confortável. Mas eu insisto, meu objetivo era fazer o desenvolvimento, fazer o material, não o dinheiro que eu iria ganhar. O dinheiro veio, ele vem. Então, eu sugiro que as pessoas focalizem o trabalho, os resultados e a contribuição que o trabalho delas pode dar para outras pessoas, para o ambiente, para a comunidade, para o país, para o conhecimento. O resto virá por acréscimo.

Resumindo, a minha mensagem é: trabalhem seriamente, dedicadamente e com paixão.

Finalmente, eu gostaria de dizer que acho que o trabalho de pesquisa, o trabalho de desenvolvimento ajuda muito a pessoa a crescer como pessoa. Ele afasta a pessoa de algumas ideias que não são muito proveitosas e bota a pessoa dentro de atitudes que são importantes e realmente ajudam. Uma vez um estudante perguntou para Galileu: “Mestre, o que é o método?”. A resposta de Galileu foi: “O método é a dúvida”. Eu acho que isso é muito importante em atividade de pesquisa, a qual, em Materiais, em particular, é especialmente interessante porque o resultado final é uma coisa que a gente pega na mão. Na atividade de pesquisa a pessoa tem que estar o tempo todo se perguntando: “Eu estou pensando isto, mas será que estou pensando certo?”, ou “Fulano escreveu aquilo, mas qual é a base do que ele escreveu?”. Essa é uma atitude muito diferente da atitude dogmática, que é comum no domínio da política e da religião, e muito diferente da atitude da pessoa que tem que enganar, como o advogado do mafioso ou do traficante. O pesquisador tem que se comprometer com a verdade. Claro que também existem pessoas que se dizem pesquisadores e promovem a desinformação. Alguns anos atrás, falava-se de uma coisa chamada de “Bush science”, expressão que remete ao presidente Bush. A “Bush science” eram os argumentos criados por pessoas que ganhavam dinheiro como cientistas, mas que produziam argumentos para dar sustentação às políticas de Bush. Ou seja, o problema existe em ciência também, mas aí voltamos àquilo que falei no início. A pessoa não pode entrar nisto porque vai ganhar dinheiro, vai ter prestígio ou vai ser convidado para jantar com o presidente; ela tem que entrar nisto pelo interesse que ela tem pelo próprio assunto.

Artigo em destaque: Revelando segredos da luminescência de um íon lantanídeo.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Mechanisms of optical losses inthe 5D4 and 5Dlevels in Tb3+ doped low silica calcium aluminosilicate glasses. J. F. M. dos Santos, I. A. A. Terra, N. G. C. Astrath, F. B. Guimarães, M. L. Baesso, L. A. O. Nunes and T. Catunda. J. Appl. Phys. 117, 053102 (2015). DOI: 10.1063/1.4906781.

Revelando segredos da luminescência de um íon lantanídeo.

Uma equipe de cientistas de instituições brasileiras avançou na compreensão de mecanismos que limitam a eficiência da emissão de luz em materiais dopados com íon de térbio trivalente (Tb3+). Esse íon, do grupo das terras raras e subgrupo dos materiais lantanídeos, apresenta emissões luminescentes desde o ultravioleta até o infravermelho, sendo particularmente interessante, por seu interesse tecnológico, a sua intensa emissão verde, de cerca de 545 nm de comprimento de onda.

Alguns anos atrás, por exemplo, pesquisadores japoneses demonstraram emissão laser de fibras ópticas dopadas com Tb3+. Entretanto, o dispositivo apresentou baixa eficiência devido à saturação do seu ganho óptico, mesmo a baixas potências de excitação.

Processo de luminescência de amostra de LSCAS dopada com Tb3 excitada por um laser azul emitindo luz verde. As fotos mostram a amostra sem (esq.) e com (dir.) excitação.

Retomando esse problema tecnológico, a equipe de cientistas do Brasil fez um estudo detalhado dos processos que causam a saturação da emissão verde. Para isso, utilizaram o Tb3+ como dopante de um material que, por suas propriedades, garante alta eficiência de emissão, principalmente no infravermelho: o vidro aluminosilicato de cálcio com baixa concentração de sílica, conhecido como LSCAS, de low-silica calcium aluminosilicate.

O estudo envolveu dois grupos de pesquisa que mantêm colaboração há cerca de duas décadas, o grupo de espectroscopia de sólidos do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (IFSC – USP), e o grupo de fototérmica da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Os resultados foram reportados em um artigo recentemente publicado no Journal of Applied Physics.

Em primeiro lugar, amostras do vidro com diversas concentrações do dopante foram preparadas pelo grupo da UEM.

Foto das amostras de LSCAS. A amostra base apresenta concentração de 0,05% de Tb3+.

No IFSC – USP, as amostras foram excitadas por meio de um laser em dois comprimentos de onda distintos, 488 nm (visível) e 325 nm (ultravioleta), e seus espectros de absorção, emissão e excitação foram obtidos. Ao analisá-los, os cientistas do grupo de espectroscopia de sólidos observaram certas particularidades no comportamento de algumas das emissões luminescentes, como, por exemplo, uma forte saturação numa emissão verde semelhante à observada no laser dos cientistas japoneses, e, em outros comprimentos de onda, uma diminuição da luminescência ocorrendo a intensidades de excitação mais baixas do que o previsto. Dessa maneira, os pesquisadores brasileiros puderam concluir que o mecanismo associado na literatura às emissões de materiais dopados com Tb3+, conhecido como cross relaxation, não era suficiente para explicar a totalidade do comportamento das emissões, e nem sequer a saturação que ocorre nas emissões no verde, e propuseram a ação adicional de outros processos.

“Mecanismos de perdas adicionais, tais como emissões por defeitos na matriz, processos de conversão ascendente de energia, entre outros, exercem uma influência significativa no sistema que estudamos”, explica Tomaz Catunda, professor do IFSC e autor correspondente do artigo. “Estas vias de decaimento, até então ignoradas na literatura, apresentam grande relevância na fabricação de dispositivos ópticos em materiais dopados com Tb3+”, completa.

O estudo de vidros dopados com Tb3+ na equipe brasileira começou durante a pesquisa de doutorado de Idelma Terra, defendida em 2013 pela USP, que visava ao desenvolvimento de materiais para aumentar a eficiência de células solares. A tese foi agraciada com o “Prêmio Vale-Capes de Ciência e Sustentabilidade 2014”. O estudo desses materiais continuou no doutorado de Giselly dos Santos Bianchi, realizado na UEM e na dissertação de mestrado de Jéssica Fabiana Mariano dos Santos, defendido em 2014 pela EESC-USP.

O artigo do Journal of Applied Physics veio se agregar a um conjunto de dezenas de papers publicados em periódicos internacionais gerados a partir da colaboração entre os grupos do IFSC e da UEM, em alguns casos envolvendo também outros cientistas do Brasil e do exterior, sobre espectroscopia óptica de vidros de aluminato de cálcio dopados com íons de terras raras e suas aplicações em dispositivos emissores de luz.

Boletim SBPMat – edição 31.

 

Saudações!

Edição nº 31 – 2 de abril de 2015 

Notícias da SBPMat: XIV Encontro - Rio de Janeiro, 27/09 a 01/10 de 2015 

Autores: A submissão de resumos para os 27 simpósios e 2 workshops do XIV Encontro da SBPMat está aberta até 30 de maio. Veja as instruções para autores.

Hospedagem: Está disponível uma lista de hotéis com condições especiais para participantes do XIV Encontro da SBPMat. Aqui.

Patrocinadores e expositores: 23 empresas já reservaram seu lugar no XIV Encontro da SBPMat. Contato para expositores e demais patrocinadores: rose@metallum.com.br.

Veja o site do evento.

Notícias da SBPMat: participação na IUMRS - ICAM 2015

Nossa SBPMat, representada por seu presidente, Roberto Mendonça Faria, faz parte do comitê organizador da 14ª Conferência Internacional sobre Materiais Avançados da União Internacional de Sociedades de Pesquisa em Materiais (IUMRS – ICAM 2015). O evento será realizado na Coreia do Sul em outubro deste ano. Saiba mais.

Artigo em destaque 

Uma equipe de pesquisadores da USP e de uma universidade cubana conseguiu aumentar em mais de 25 vezes a densidade de corrente acima da qual o material Bi-2223 deixa de ser supercondutor. Para isso, prepararam o material por meio de sinterização a plasma, seguida de tratamento térmico. Os autores também propuseram  quais são os mecanismos que ocorrem na microestrutura do Bi-2223 para que essa otimização aconteça.  O trabalho foi recentemente reportado no periódico Journal of Applied Physics.  Veja nossa matéria de divulgação.

Gente da nossa comunidade

Oswaldo Luiz Alves, professor do Instituto de Química da Unicamp há mais de 40 anos, é autor de relevantes contribuições na área de Materiais em temas diversos, desde o desenvolvimento de materiais vítreos para telecomunicações até o estudo das interações de novos nanomateriais baseados em carbono com biossistemas. Em entrevista ao Boletim da SBPMat, o professor Alves falou sobre seu trabalho de introdução da Química do Estado Sólido no Brasil e as contribuições que fez na área de Materiais, atuando em pesquisa, formação de pesquisadores, divulgação científica, política científica etc. Ele também nos contou um pouco sobre sua adolescência em São Paulo e deixou uma mensagem para os leitores mais jovens. Veja nossa entrevista com o cientista.

Victor Carlos Pandolfelli, professor do DEMa-UFSCar, foi nomeado editor associado do Journal of the American Ceramic Society – um dos periódicos científicos mais citados de sua área. Saiba mais.

História da pesquisa em Materiais no Brasil 

Cylon Gonçalves da Silva, primeiro diretor do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), compartilhou com nosso boletim algumas anedotas sobre a participação da indústria brasileira na construção do laboratório – mais precisamente, sobre o uso de materiais nacionais na fabricação dos aceleradores do LNLS. Veja o artigo do professor Cylon.

Dicas de leitura
Especial.

  • Relato cativante da interessantíssima história da descoberta do quasicristal natural – encontrado na Sibéria e produzido… no espaço. A reportagem foi vencedora do Physics Journalism Prize, edição 2015, do Institute of Physics (IOP) e do Science and Technology Facilities Council (STFC). Aqui.

Divulgação científica internacional de papers destacados.

  • Hidrogel de polímero e nanopartículas, de produção simples, tem potencial para liberação controlada de fármacos (divulgação de paper da Nature Communications). Aqui.
  • Hipertermia magnética: nanopartículas com formato de flor geram mais calor para destruir células do câncer (divulgação de paper do Journal of Applied Physics). Aqui.

Notícias de INCTs e CEPIDs.

  • Novo biovidro desenvolvido no âmbito do CeRTEV melhora o desempenho de implantes dentários e ortopédicos de titânio ao ser depositado na sua superfície. Aqui.
  • CDMF apresenta produtos de parcerias com empresas em evento em São Carlos. Aqui.
Oportunidades
  • Pós-doutorado PNPD no PPGFSC/UFSC, em Física da Matéria Condensada e outras áreas. Aqui.
  • Chamada de propostas FAPESP (São Paulo) – M-ERA NET (Europa) em Ciência e Engenharia de Materiais. Aqui.
  • Microtomógrafo do LNNano revela em 3D a morfologia de regiões da amostra, além de porosidade, diâmetro etc. Projetos para usar o equipamento podem ser submetidos a avaliação. Aqui.
Próximos eventos da área
  • Simpósio Internacional em Materiais e Biossistemas (SIMBI) 2015. Lavras, MG (Brasil). 28 e 29 de abril de 2015. Site.
  • 4th School of SAXS Data Analysis. Campinas, SP (Brasil). 11 a 15 de maio de 2015. Site.
  • VII Método Rietveld. Fortaleza, CE (Brasil). 6 a 10 de julho de 2015. Site.
  • São Paulo School of Advanced Sciences (ESPCA) on Recent Developments in Synchrotron Radiation. Campinas, SP (Brasil). 13 a 24 de julho de 2015. Site.
  • Advanced School on Glasses and Glass-Ceramics (G&GC São Carlos). São Carlos, SP (Brasil). 1 a 9 de agosto de 2015. Site.
  • Primeira Conferência de Materiais Celulares (MATCEL 2015). Aveiro (Portugal). 7 e 8 de setembro de 2015. Site.
  • XIV Encontro da SBPMat. Rio de Janeiro, RJ (Brasil). 27 de setembro a 1º de outubro de 2015. Site.
  • 13th International Conference on Plasma Based Ion Implantation & Deposition (PBII&D 2015). Buenos Aires (Argentina). 5 a 9 de outubro de 2015. Site.
  • 10th Ibero-American Workshop on Complex Fluids 2015. Florianópolis, SC (Brasil). 25 a 29 de outubro de 2015. Site.
  • 14th International Union of Materials Research Societies – International Conference on Advanced Materials (IUMRS-ICAM 2015). Jeju (Coreia). 25 a 29 de outubro de 2015. Site.
      
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Gente da nossa comunidade: entrevista com o cientista Oswaldo Luiz Alves.

O professor Oswaldo Luiz Alves. (Crédito: Gustavo Morita)

Foi nos clubes de ciência da escola pública e do bairro Perdizes, na cidade de São Paulo, que Oswaldo Luiz Alves começou a se interessar por ciência, durante a adolescência, fazendo experimentos de Química e Biologia. Aos 20 anos, formou-se em um dos primeiros cursos técnicos de Química Industrial da América do Sul, na Escola Técnica Oswaldo Cruz, contando com bolsa de estudo da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Durante o curso, realizou um estágio no Instituto Biológico, do governo do Estado de São Paulo, onde teve seus primeiros contatos com a técnica de espectroscopia de infravermelho.

Após uma experiência de um ano trabalhando na indústria, ingressou nos cursos de bacharelado e licenciatura em Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e concluiu ambos em 1973. Durante a graduação, foi monitor do Instituto de Química da universidade e bolsista de iniciação científica. Assim que se formou, Alves, na época com 25 anos, foi contratado como docente pelo Instituto de Química da Unicamp e, simultaneamente, iniciou seu doutorado sem realizar previamente o mestrado, desenvolvendo um trabalho de pesquisa sobre aplicação da espectroscopia vibracional (Raman e infravermelha) em complexos moleculares. Em 1979, partiu para a França com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para realizar um pós-doutorado no qual trabalhou novamente com espectroscopia vibracional, inclusive utilizando um dos primeiros espectrômetros de infravermelho por transformada de Fourier. Dessa maneira, Oswaldo Alves vivenciou na própria pele o início de uma época da Química de profícuo desenvolvimento e aplicação de novas técnicas de análise, sobretudo espectroscópicas, e suas aplicações. Além disso, Alves também se deixou motivar por outro movimento, iniciado na década de 1970, que ocorria fortemente na comunidade dos químicos na Europa: o desenvolvimento e estudo de novos materiais dentro da chamada Química do Estado Sólido.

De volta ao Brasil depois de quase dois anos na França, nos quais atuou como professor convidado na Universidade de Lille, encontrou um panorama diferente do europeu. Por aqui, quase nenhum químico trabalhava ainda na área de Estado Sólido. Assim, Alves se dedicou a introduzi-la e, em 1985, fundou o Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES) no Instituto de Química da Unicamp. Desde então, o cientista tem feito relevantes contribuições à Ciência e Tecnologia de Materiais, em temas diversos como materiais vítreos para telecomunicações, técnicas de síntese de materiais bidimensionais, desenvolvimento de sistemas químicos integrados, purificação de nanotubos de carbono e interação de novos nanomateriais baseados em carbono com biossistemas.

Atualmente com 67 anos, Oswaldo Alves é professor titular da Unicamp, onde atua como coordenador científico do LQES e do Laboratório de Síntese de Nanoestruturas e Interação com Biossistemas (NanoBioss/SisNano). Em 40 anos de docência, orientou mais de 50 mestrados e doutorados. Pesquisador 1 A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ele é autor de mais de 200 artigos publicados em periódicos científicos, os quais totalizam mais de 2.400 citações, além de mais de 20 patentes depositadas, 5 concedidas e uma licenciada, esta última referente a uma tecnologia voltada à remediação de efluentes de indústrias papeleiras e têxteis. No campo da divulgação científica, atua como editor científico de dois boletins de notícias, o “LQES News” e o “Nano em Foco”.

Oswaldo Alves é membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Academia de Ciências do Estado de São Paulo, comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e fellow da TWAS (The World Academy of Sciences for the advancement of science in developing countries) e da Royal Society of Chemistry. Recebeu prêmios de diversas entidades, como a Unicamp, a Associação Brasileira de Indústrias Químicas (Abiquim) e a Sociedade Brasileira de Química, da qual foi presidente de 1998 a 2000, além de fundador e primeiro diretor de sua divisão de Química de Materiais.

Segue uma entrevista com o cientista.

Boletim da SBPMat: – Como se despertou seu interesse pela ciência? O que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar em Química do Estado Sólido/Materiais?

Oswaldo Luiz Alves: – Lá se vão muitos anos. Antes de entrarmos para a Universidade participamos muito dos clubes de ciência de nossa escola pública e do nosso bairro na cidade de São Paulo (Perdizes). No clube de ciências do bairro tínhamos um pequeno laboratório com materiais doados por um dos bisnetos do cientista Vital Brazil, onde fizemos muitas experiências de Química e Biologia. Logo em seguida veio um estágio realizado no Instituto Biológico, este mais formal, como requisito do curso técnico de Química Industrial, onde trabalhamos com espectroscopia no infravermelho e polarografia (eletrodo gotejante de mercúrio) aplicadas à determinação de pesticidas. Quando entramos na Unicamp, em 1969, depois de uma experiência na indústria (Bayer do Brasil), para nós já estava claro que continuaríamos os estudos após a graduação, o que nos fez logo engajarmos em pesquisas com compostos de terras-raras, através de uma Bolsa de Iniciação Científica da FAPESP, já pensando em nos tornar professor universitário e pesquisador. Fizemos o doutoramento direto (isto não era muito comum nos anos 70) trabalhando com as espectroscopias Raman-laser e no infravermelho e cálculos teóricos de campos de força moleculares. Em 1979, fomos para a França realizar o pós-doc no Laboratoire de Spectrochimie Infrarouge et Raman do CNRS (CNPq Francês) para trabalhar com espectroscopia Raman com resolução espacial, efeito SERS e CARS e comissionar um dos  primeiros espectrômetros infravermelhos que operavam com transformada de Fourier. Nesta época ocorria na Europa e, principalmente na França (Bordeaux, Rennes e Orsay), uma fortíssima atividade em Química do Estado Sólido, dentro da perspectiva de materiais. Deixamo-nos contaminar!

Ao retornar ao Brasil vimos a oportunidade de fundar o Laboratório de Química do Estado Sólido – LQES (1985), com muita dificuldade, pois a quase totalidade da Química brasileira trabalhava em solução. Em função disso migramos para a comunidade de Física onde permanecemos por cerca de 10 anos, chegando, inclusive, a coordenar atividades ligadas aos materiais nas célebres reuniões da Sociedade Brasileira de Física (SBF) em Caxambu. De lá para cá, sempre estivemos envolvidos com Química do Estado Sólido e Materiais participando do Projeto Fibras Ópticas (Telebras) onde trabalhamos com vidros dopados com quantum dots para telecomunicações, vidros para óptica não linear e, no LQES, em atividades ligadas aos materiais bidimensionais (lamelares), nanocompósitos envolvendo polímeros condutores, sistemas químicos integrados, vitrocerâmicas e vidros porosos, nanopartículas de sílica com funcionalizações complexas, nanotubos de carbono, óxido de grafeno e carbon dots. Nestes três últimos temas nossos esforços estão voltados para o estudo da interação destes novos carbonos com biossistemas dentro da perspectiva da avaliação dos riscos das nanotecnologias (regulação).

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais?

Oswaldo Luiz Alves: – Sempre é muito difícil fazer estas avaliações, entretanto acredito que alguns pontos podem ser elencados.

Em termos da pesquisa científica, nossas principais contribuições foram as pesquisas com vidros dopados com quantum dots e vidros para óptica não linear, o desenvolvimento de técnicas de síntese de vários materiais bidimensionais e sua química de intercalação, o desenvolvimento de sistemas químicos integrados (vidro-polímero condutor, vidro-semicondutores), purificação de nanotubos de carbono (efeito dos debris oxidados) e interação de novos carbonos com biossistemas (efeito “corona” protêico e agregação) e nanopartículas de sílica com funcionalização antagônica para “drug-delivery“.

Criamos o Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES), laboratório pioneiro em pesquisas em Química do Estado Sólido no Brasil, onde atuamos até hoje como Coordenador Científico. Outra contribuição que acreditamos merece destaque foi a nossa atuação como Coordenador do “Programa de Química para Materiais Eletrônicos da FINEP” (final dos anos 80). Muitos dos mais importantes grupos de pesquisa em Materiais que atuaram, ou ainda atuam no Brasil em alto nível, em vários estados, receberam financiamentos deste exitoso programa. Merece ser mencionada nossa participação como fundador e primeiro Diretor da Divisão de Química de Materiais da Sociedade Brasileira de Química. Coordenamos o projeto FAPESP que financiou a construção da primeira linha de EXAFS (XAS), inclusive com participação direta nos programas de formação de usuários em uma técnica espectroscópica que nunca tinha sido utilizada no Brasil. Atualmente estamos atuando como Coordenador Científico do Laboratório de Síntese de Nanoestruturas e Interação com Biossistemas (NanoBioss/SisNano).

Em 2014 completamos 40 anos de docência no Instituto de Química da Unicamp onde formamos mais de 50 alunos (mestrado e doutorado) muitos dos quais hoje são lideres de pesquisa destacados no cenário nacional e internacional e que exercem suas atividades em vários estados brasileiros.

Atuamos como editor científico de dois boletins de notícias. O primeiro é o LQES News, quinzenal, veiculado há 14 anos, com linha editorial ligada aos desenvolvimentos da ciência, tecnologia e inovação (geral) e nanotecnologias. O segundo é o Boletim NANO em Foco, editado em parceria com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, mensal, veiculado há 7 anos, com uma linha editorial ligada aos produtos comerciais, riscos e regulação das nanotecnologias. Além disso, publicamos, também em parceria com a ABDI, a “Cartilha sobre Nanotecnologia (duas edições) destinada à introdução das nanotecnologias para o grande público.

Os diversos sistemas e materiais estudados e desenvolvidos no LQES permitiram o depósito de 27 patentes de processo e aplicação, inclusive algumas internacionais, e um licenciamento de uma tecnologia inovadora para o setor produtivo. Além disso, participamos, como consultor, de dois processos relacionados com o Programa de Subvenção Econômica para Empresas (Nanotecnologia) da FINEP, que levaram ao desenvolvimento de 8 produtos comerciais.

Ao longo destes muitos anos, tivemos a participação em várias atividades relacionadas com a política científica brasileira. Dentre elas destacamos: Coordenador dos CAs (Química) do CNPq e Fapesp. Membro do Conselho Deliberativo do CNPq (2 mandatos) e do Conselho Consultivo da Nanotecnologia (MCTI/SisNano) em todas as suas composições. Atuamos, até o momento, como consultor para a área das nanotecnologias da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). Prestamos consultoria ao Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo para a área de nanotecnologia. Fazemos parte do conselho cientifico da APAE de São Paulo.

Boletim da SBPMat: – Deixe uma mensagem para nossos leitores que estão iniciando suas carreiras de  cientistas.

Oswaldo Luiz Alves: – Primeiramente, gostaria de dizer que a carreira científica é fascinante, sobretudo nos tempos em que vivemos, onde as quebras de paradigmas ocorrem amiúde. Outro aspecto, não menos fascinante, é o conviver com a intermulti e transdisciplinaridade que, ao mesmo tempo em que ampliam nossos conhecimentos apontam para nossas limitações. Nestas relações fica claro que o conhecimento sólido e aprofundado de conceitos, técnicas e ferramentas é fundamental. Trata-se de um processo que passa por uma atitude de abertura e pela aquisição de uma “língua franca” que possibilitam a interação de diferentes especialistas e expertises, na resolução de problemas, muito bem identificados, de ciência, tecnologia e inovação. Assim, sempre que possível, devemos procurar um equilíbrio entre atitudes de pesquisa paper oriented e knowledge oriented e, sobretudo, não nos esquecermos de fazer uma segunda leitura de nossos resultados de pesquisa buscando, assim, examinar sua possível conexão com as necessidades do cidadão brasileiro e do desenvolvimento nacional.

Artigo em destaque: Puxando os limites de um supercondutor.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: 10 to 25-fold increase in the transport superconducting critical current density of spark-plasma sintered Bi-2223 superconductors. E. Govea-Alcaide, I. F. Machado, and R. F. Jardim. Journal of Applied Physics 117, 043903 (2015). DOI: 10.1063/1.4906560.

Puxando os limites de um supercondutor

Um trabalho recentemente publicado no Journal of Applied Physics, assinado por dois pesquisadores brasileiros e um cubano, traz relevantes contribuições ao estudo dos materiais supercondutores – aqueles que permitem o fluxo de corrente elétrica sem resistência (literalmente, com resistência elétrica zero).

A supercondutividade ocorre em certos materiais sob condições determinadas. Existe, por exemplo, uma condição chamada de “temperatura crítica supercondutora”, acima da qual a supercondutividade não ocorre. E existe também uma “densidade de corrente crítica” (a quantidade de corrente elétrica que passa por determinada área), acima da qual a supercondutividade é destruída.

No trabalho reportado no Journal of Applied Physics, os autores apresentam uma rota que permite aumentar a densidade de corrente crítica do Bi-2223 em mais de 25 vezes na temperatura do nitrogênio líquido (77 K, ou seja, uns 195 °C negativos).

Esquema representativo do processo de sinterização a plasma (SPS).

O método parte de pó de Bi-2223 (óxido misto de bismuto, estrôncio, cálcio e cobre), consolidado por meio da técnica de sinterização por plasma (spark plasma sintering, SPS) em temperaturas próximas de 800 °C e tratado termicamente a 750 °C por 5 minutos. A rota abre possibilidades em diversas aplicações do material. “A otimização de propriedades supercondutoras de interesse, como é o caso da corrente crítica supercondutora, nos parece ser de grande relevância para a área de aplicações de supercondutores de maneira geral”, avalia o físico Renato de Figueiredo Jardim, autor do trabalho e professor do Instituto de Física da USP.

Além disso, no artigo, os autores propuseram quais são os mecanismos que ocorrem na microestrutura do material para que aconteça o aumento nessa propriedade supercondutora.

Imagem de microscopia de varredura de elétrons retro espalhados da microestrutura do Bi-2223 consolidado pela técnica de SPS a 750 °C: grãos com forma de lâmina.

Inicialmente, os cientistas puderam confirmar que, após o processo de sinterização a plasma, o Bi-2223 apresentou grãos alongados com forma de lâminas, compostos por casca e caroço (shell-core). Os pesquisadores conferiram que a casca, que é a borda do grão, era deficiente em oxigênio, o que constitui de certa forma um problema, desde que esse elemento é fundamental para melhorar as propriedades supercondutoras do Bi-2223 ao otimizar suas propriedades intergranulares.

Entretanto, o breve tratamento térmico realizado após a consolidação do material trouxe resultados de impacto. “O tratamento térmico foi fundamental para o restabelecimento, mesmo que parcial, de propriedades supercondutoras robustas no material preparado via SPS”, diz Renato Jardim. Concretamente, o tratamento diminuiu a largura da casca deficiente em oxigênio, fato que propiciou o aumento da condução da corrente elétrica entre os grãos. “O restabelecimento de oxigênio no material ocorre via os contornos de grão e certamente não é total, ou seja, ele ocorre em certas porções dos contornos de grãos, estabelecendo “caminhos” com baixa resistência elétrica, por onde corrente elétrica, por exemplo, pode conectar os grãos supercondutores do material”, resume o professor.

De acordo com o professor Jardim, a sua colaboração científica com o primeiro autor do artigo, o físico Ernesto Govea Alcaide, atualmente professor da Universidade de Granma (Cuba), já tem mais de 15 anos, e se remonta à pesquisa de doutorado de Govea Alcaide, realizada entre 2001 e 2005 dentro de um convênio CAPES/MES (Brasil/Cuba) coordenado pelos professores Jardim (pela USP) e Pedro Mune (pela Universidade de Oriente, em Cuba). Na ocasião, Govea Alcaide iniciou um estudo sistemático da preparação de compostos supercondutores visando a aplicações tecnológicas.

“É importante ressaltar que materiais supercondutores com potencial para aplicações tecnológicas requerem algumas características bem especificas, ou seja, os materiais devem apresentar: (i) fase cristalográfica única; (ii) alta textura; (iii) alta densidade; e (iv) contornos de grãos de baixa resistência elétrica”, explica o professor Jardim.

Com essas características em mente, em uma missão de trabalho dentro do convênio bilateral, Govea-Alcaide iniciou a preparação de materiais supercondutores. Em uma visita a São Paulo, relata Jardim, Govea Alcaide teve contato com o grupo da professora Izabel Machado, também autora do artigo, e, utilizando as facilidades do seu laboratório, produziu amostras de Bi-2223 por meio da técnica de SPS a partir de pós desse material de alta qualidade, cuja produção já era dominada no laboratório do professor Jardim.

De acordo com o professor Jardim, um conjunto maior de artigos científicos, no mesmo tópico do artigo aqui mencionado e publicados recentemente pelos professores Govea Alcaide, Machado e Jardim, entre outros pesquisadores, acaba de ser agraciado com um prêmio da Academia de Ciências de Cuba como um dos trabalhos de maior contribuição científica no ano de 2014.

O trabalho cujos resultados foram reportados no artigo do Journal of Applied Physics contou com financiamento do Brasil (Fapesp, CNPq, CAPES e Petrobrás) e do Ministerio de Educación Superior (MES) de Cuba.

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Você gostaria de sugerir, para a seção “Artigo em destaque” do Boletim da SBPMat, um artigo publicado em revista científica renomada e assinado por pesquisadores atuantes no Brasil? Entre em contato: comunicacao@sbpmat.org.br.

A fabricação dos aceleradores do LNLS e os materiais nacionais, por Cylon Gonçalves da Silva.

Foto do anel de armazenamento da fonte de luz síncrotron, no LNLS (Campinas, SP), em dezembro de 1996, época do início de seu funcionamento, 7 meses antes da inauguração do laboratório. (Crédito M.B.Jr)

Quando demos a partida na construção do LNLS, em 1986, e muito antes disto, na sua “pré-história”, havia já a intenção de envolver a indústria nacional na construção dos equipamentos. Olhando de 2015, é difícil imaginar o que era a indústria brasileira em 1985. Ainda é mais difícil conceber que, em alguns setores, entre eles o metal-mecânico, ela era mais sofisticada do que é hoje. A abertura da economia brasileira, necessária, porém conduzida de forma atabalhoada e amadora pelo Governo Collor, acabou com boa parte da indústria mais sofisticada que havia no País então. De todos os materiais necessários para construir os aceleradores, dois se destacavam por seu peso (literalmente): aço e cobre. Para os imãs e câmaras de vácuo necessitávamos de aço e para as bobinas dos eletroímãs, de cobre OFHC de baixo conteúdo de oxigênio.

Lembro-me da visita feita a nosso galpão, por um especialista em ultra-alto vácuo da Balzers que nos declarou, de forma arrogante, que “é impossível fabricar câmaras de ultra-alto-vácuo” com o aço brasileiro. “Vocês vão ter de importar.” Não é necessário dizer que isto foi um belo incentivo para que procurássemos um fornecedor brasileiro para nossas necessidades. Ricardo e eu compartilhávamos um saudável desprezo por este tipo de especialista. Acho que nós dois pensávamos, sem falar em voz alta, quando ouvíamos declarações deste tipo, mais ou menos a mesma coisa: “Ah é! Não dá? Você vai ver!”. Para a fabricação dos ímãs e das câmaras de vácuo, havia duas perguntas não respondidas. Haveria no Brasil aço com as características requeridas? E o método de corte a laser que pretendíamos utilizar não afetaria negativamente as propriedades magnéticas do material nas suas bordas? Ninguém tinha utilizado esta técnica para fabricar eletro-ímãs de precisão até o LNLS considerá-la como uma opção, dadas as condições muito especiais que enfrentávamos. Quando começamos, ninguém tinha as respostas para estas perguntas. A experiência mostrou que havia o aço necessário no Brasil, tanto para os ímãs (SAE1006, adquirido no mercado nacional e relaminado  pela Mangels) quanto para as câmaras (AISI 316L), e que o corte a laser era uma técnica viável e muito flexível para a produção de lotes relativamente pequenos de eletro-ímãs*. Isto, naturalmente, não aconteceu da noite para o dia. Eventualmente, a longa história do desenvolvimento dos processos para os aços, por exemplo, no caso das câmaras de vácuo, de limpeza e soldagem, e no caso dos ímãs, da melhoria das propriedades magnéticas, poderia muito bem ser contada.

Uma outra história, mais divertida, é a do cobre para as bobinas dos eletro-ímãs. O CERN nos havia recomendado a empresa finlandesa Outokumpu, que era a fornecedora deles. É claro que, com esta recomendação, estávamos tranquilos quanto à qualidade do produto finlandês. Mas, eu não estava satisfeito em ter de importar cobre. Uma pesquisa revelou a existência em São Paulo da Termomecânica, de propriedade de Salvador Arena. Consultados os meus “especialistas”, todos foram unânimes em dois pontos: tratava-se de uma empresa da melhor qualidade e de um empresário excepcional, dos mais dedicados ao desenvolvimento tecnológico de seus produtos, apenas um tantinho temperamental. Achei que ele se encaixava no perfil de um fornecedor potencial para o LNLS e lá fui eu explicar-lhe o projeto do LNLS e suas necessidades. Fui muito bem recebido, ouvi durante algumas horas uma exposição sobre o belo programa educacional que era o seu projeto do coração, pude expor nosso projeto brevemente, mas neste, Arena foi taxativo – “Neste negócio não me meto. Não quero nada com o governo. Não vai dar certo. Esqueça, vocês não vão conseguir. A Termomecânica não vai fornecer para vocês.” (Coloco entre aspas o texto, com a ressalva de que podem não ter sido as palavras exatas de Arena, mas o sentido é o mesmo.)

Confesso que fiquei decepcionado, mas a conversa não foi em vão. Serviu para eu entender como ele pensava e para traçar uma estratégia para dobrá-lo. Importamos, com a ajuda do CERN, uma tonelada de cobre OFHC da Outokumpu (uma fração do que precisaríamos) nas especificações necessárias para as bobinas dos dipolos do anel. O cobre fornecido pela Outokumpu foi OFHC/OFE – 99,99 % mínimo Cu com até 0,0010 % max de oxigênio.  Assim que o material chegou, liguei para Salvador Arena para dizer-lhe: “O Sr. não quis nos fornecer, importei da Outokumpu, sua concorrente.” O que se ouviu do outro lado da linha não pode ser reproduzido na riqueza dos palavrões nos quais Arena era pródigo. Por baixo, fui chamado de moleque, e ele me assegurou nos termos mais enfáticos que nunca tinha dito que a Termomecânica não iria nos fornecer o cobre de baixo conteúdo de oxigênio que precisávamos. E praticamente ordenou que eu voltasse lá imediatamente com as especificações que eles desenvolveriam o material para nós. E foi o que fizeram. Graças à estratégia da importação da Outokumpu, o cobre fornecido pela Termomecânica está até hoje cumprindo seu papel com galhardia não apenas nos dipolos, mas em todos os eletro-ímãs do LNLS (certificado OFHC/OF – 99.95 % mínimo Cu + Ag com  até 0,0010 % max de oxigênio, mas com qualidade OFE). Aqui também, há uma longa história de desenvolvimento feito pela equipe do LNLS dos materiais até o produto acabado. Mas, isto fica para outra ocasião.

Prof. Cylon Gonçalves da Silva

*Agradeço a Guilherme Franco, Osmar Bagnato e Ricardo Rodrigues, da equipe do LNLS, por me refrescar a memória sobre os tipos de aço empregados, bem como os detalhes técnicos do cobre OFHC.

[Artigo enviado para publicação no Boletim da SBPMat pelo professor Cylon Gonçalves da Silva, primeiro diretor do LNLS (1986-1998). Para mais informações sobre a implantação do LNLS, convidamos os leitores a acessarem a reportagem “A construção, no Brasil, da fonte de luz síncrotron e de suas primeiras estações experimentais“]

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Você gostaria de sugerir um tema de história da pesquisa em Materiais no Brasil para uma reportagem do Boletim da SBPMat? Gostaria de escrever um texto sobre esse tema para publicação em nosso boletim? Entre em contato: comunicacao@sbpmat.org.br.

Professor Victor Pandolfelli (DEMa – UFSCar) é nomeado editor associado do Journal of the American Ceramic Society

O pesquisador Victor Carlos Pandolfelli, professor titular do Departamento de Engenharia de Materiais da Universidade Federal de São Carlos (DEMa-UFSCar) foi nomeado editor associado do Journal of the American Ceramic Society. A revista científica tem ocupado os primeiros lugares na área de Ciência de Materiais – Cerâmicas nos Journal Citation Reports da Thomson Reuters.

De acordo com Pandolfelli, nos 98 anos de existência do periódico, esta é a segunda vez que um brasileiro é escolhido para tal posição. O professor José Arana Varela, atual diretor presidente do Conselho Técnico Científico da FAPESP, era, até a nomeação de Pandolfelli, o único latino-americano a pertencer ao grupo de editores associados.

Pandolfelli é membro titular da Academia Brasileira de Ciências, da World Academy of Ceramics e da Academia Nacional de Engenharia, fellow da American Ceramic Society e guest professor da Wuhan University of Science and Technology (China). Pandolfelli é membro do comitê editorial de 12 revistas técnicas na área de materiais cerâmicos. É membro do advisory board da World Academy of Ceramics (2014-2018) e coordenador latino-americano da Federation for International Refractories Research and Education (FIRE), que envolve 11 universidades em diferentes países e 16 empresas globais na área de refratários. Publicou mais de 450 artigos em periódicos científicos com revisão por pares e recebeu 12 prêmios internacionais. Possui um livro publicado e 8 patentes registradas.

SBPMat na organização de conferência internacional da IUMRS.

A SBPMat, representada por seu presidente, Roberto Mendonça Faria, faz parte do comitê organizador da IUMRS-ICAM 2015 (14º Conferência Internacional sobre Materiais Avançados organizada pela União Internacional de Sociedades de Pesquisa em Materiais). Em particular, o professor Faria compõe o conselho internacional da conferência junto a outros cientistas do mundo, entre eles, dirigentes das sociedades de pesquisa em Materiais da Austrália, Europa (E-MRS), Japão, Singapura e Taiwan.

A submissão de resumos para apresentar trabalhos nos simpósios da conferência está aberta até 31 de maio.

Saiba mais sobre a conferência: http://www.iumrs-icam2015.org/html/index.html

Boletim SBPMat – edição 30.

 

Saudações !

Edição nº 30 – 6 de março de 2015 

Notícias da SBPMat: XIV Encontro - Rio de Janeiro, 27/09 a 01/10 de 2015 

Simpósios aprovados e submissão de resumos: 27 simpósios e 2 workshops (número recorde na história dos encontros da SBPMat) compõem esta edição do nosso evento anual.

Até 30 de maio, você pode submeter resumos para apresentar seu trabalho nos simpósios ou workshops do evento. 

Saiba mais.

Patrocinadores e expositores: 16 empresas já reservaram seu lugar no XIV Encontro da SBPMat. Contato para expositores e demais patrocinadores: rose@metallum.com.br.

Veja o site do evento.

Notícias da SBPMat: programa University Chapters

Mais dois pontos no mapa dos university chapters da SBPMat: na UNESP de Presidente Prudente (o University Chapter Nanomaterials) e na UNESP de Ilha Solteira. Já vão 8 unidades criadas nas regiões Sul, Sudeste, Nordeste e Norte do Brasil desde o lançamento do programa, no início do ano passado. Saiba mais sobre os novos university chapters.

Artigo em destaque 

Uma equipe da UFPE, em colaboração com um grupo da UFS, desenvolveu um laser randômico emissor de luz ultravioleta usando pó de óxido de zinco, cujas partículas funcionaram como centros espalhadores de luz. Os cientistas provaram que a emissão foi induzida pelo mecanismo de “absorção de 3 fótons”.  O trabalho, cujos resultados foram recentemente publicados na Nanoscale, abre possibilidades para aplicações em diversas áreas, principalmente medicina.  Veja nossa matéria de divulgação.

Gente da nossa comunidade

Em 30 anos de carreira científica, Helio Chacham fez relevantes contribuições à área de Materiais. Inicialmente, dedicou-se à investigação teórica de materiais sob ultra-alta pressão. Desde meados de 1990, colaborando frequentemente com grupos experimentais, ele vem estudando nanomateriais, em particular materiais bidimensionais. Em entrevista ao Boletim da SBPMat, o professor Chacham falou sobre suas principais contribuições nesses temas, além de contar um pouco sobre sua infância e adolescência em Belo Horizonte, entre outros assuntos. Veja nossa entrevista com o cientista.

História da pesquisa em Materiais no Brasil 

Apresentamos a segunda parte da reportagem sobre a história do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). Entre 1986 e 1997, em Campinas (SP), uma equipe de cientistas e outros colaboradores projetou, construiu e testou a fonte de luz síncrotron e os instrumentos das estações experimentais do laboratório. Para isso, o time trabalhou, sucessivamente, em uma sala da Unicamp, uma casa e um galpão industrial, antes de se instalar no campus definitivo do LNLS. Reportamos uma breve cronologia dessa epopeia e compartilhamos depoimentos de alguns de seus líderes. Veja.

Dicas de leitura
Divulgação científica internacional de papers destacados.

  • Nova estratégia de engenharia de materiais para obter baterias de íons lítio mais leves, seguras e duráveis (divulgação de paper da Advanced Functional Materials). Aqui.
  • Filmes finos de óxidos complexos integrados a cristais ferroelétricos: potencial para armazenar informação (divulgação de paper da Advanced Functional Materials). Aqui.
  • Cientistas conseguem dispor moléculas orgânicas dentro de nanotubos e, a partir disso, demonstram aplicação para Internet mais rápida (divulgação de paper da Nature Nanotechnology). Aqui.
  • Novo método permite crescer flocos de dissulfeto de molibdênio, com precisão, em locais determinados (divulgação de paper da Nature Communications). Aqui.

Notícias de INCTs e CEPIDs.

  • No marco de uma colaboração entre o CeRTEV (CEPID da FAPESP em materiais vítreos) e o International Materials Institute for New Functionality in Glass, o professor Edgar Zanotto ministrará uma aula a distância sobre vitrocerâmicos para um grupo internacional. Aqui.
Oportunidades
  • Pós-doutorado PNPD institucional em Astrofísica na UFSC. Aqui.
Próximos eventos da área
  • 4th School of SAXS Data Analysis. Campinas, SP (Brasil). 11 a 15 de maio de 2015. Site.
  • São Paulo School of Advanced Sciences (ESPCA) on Recent Developments in Synchrotron Radiation. Campinas, SP (Brasil). 13 a 24 de julho de 2015. Site.
  • Advanced School on Glasses and Glass-Ceramics (G&GC São Carlos). São Carlos, SP (Brasil). 1 a 9 de agosto de 2015. Site.
  • Primeira Conferência de Materiais Celulares (MATCEL 2015). Aveiro (Portugal). 7 e 8 de setembro de 2015. Site.
  • XIV Encontro da SBPMat. Rio de Janeiro. 27 de setembro a 1º de outubro de 2015. Site.
  • 13th International Conference on Plasma Based Ion Implantation & Deposition (PBII&D 2015). Buenos Aires (Argentina). 5 a 9 de outubro de 2015. Site.
  • 10th Ibero-American Workshop on Complex Fluids 2015. Florianópolis, SC (Brasil). 25 a 29 de outubro de 2015. Site.
  
Você pode divulgar novidades, oportunidades, eventos ou dicas de leitura da área de Materiais, e sugerir papers, pessoas e temas para as seções do boletim. Escreva para comunicacao@sbpmat.org.br.
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