Breves entrevistas com cientistas: Christian Polak (Vacuumschmelze GmbH & Co. KG, Alemanha).

Christian Polak
Christian Polak

Christian Polak interagiu pela primeira vez com Vacuumschmelze GmbH & Co quando a sua tese de doutorado sobre materiais amorfos, defendida na Universidade Técnica de Viena (TU Wien), despertou o interesse da empresa. Em 1993, ele começou a trabalhar na área de pesquisa e desenvolvimento da empresa, onde permanece.

A Vacuumschmelze iniciou suas atividades com o desenvolvimento do primeiro forno de fundição a vácuo (como sugere seu nome em alemão) há cerca de 100 anos na cidade alemã de Hanau. Hoje, a companhia é uma fabricante de materiais magnéticos avançados e produtos relacionados com mais de 4.000 funcionários localizados em dezenas de países. Esses materiais estão presentes na vida cotidiana de milhões de pessoas, fazendo parte de carros, aviões, elevadores, sistemas de energia solar e eólica, transformadores…

Rapid solidification technology.
Tecnologia de solidificação rápida.

Atualmente, Christian Polak lidera o Departamento de Tecnologia de Solidificação Rápida na empresa. Essa tecnologia permite fabricar fitas metálicas micrométricas com propriedades magnéticas superiores, processando o metal fundido em apenas uma etapa. Processos posteriores podem, ainda, transformar esses materiais de estrutura amorfa em ligas nanocristalinas (com grãos ou cristais nanométricos).

No XVII B-MRS Meeting, Polak oferecerá uma palestra plenária sobre esses materiais magnéticos nanocristalinos e suas aplicações, principalmente no segmento dos dispositivos eletrônicos miniaturizados.

Veja algumas informações que o Dr. Polak forneceu relacionadas ao assunto de sua palestra plenária.

Materiais Magnéticos Nanocristalinos

Nanocrystalline structure of VITROPERM material.
Estrutura nanocristalina do material VITROPERM.

Mais de vinte anos atrás, Yoshizawa, Oguma e Yamauchi introduziram uma nova classe de ligas à base de ferro exibindo um comportamento magnético suave (soft) superior. As propriedades foram uma combinação única de baixas perdas, alta permeabilidade e magnetostrição próxima de zero obtidas por permalloys e ligas amorfas Co-based, mas com uma magnetização de saturação até 1,2 Tesla – muito mais alta do que qualquer um desses materiais pode oferecer convencionalmente. O particular sobre o novo material é a sua microestrutura ultrafina de b.c.c. Fe-Si com tamanhos de grão de 10-15 nm a partir dos quais suas propriedades moles derivam por último. Com base nisso, essa nova classe de ligas foi denominada “nanocristalina”. O material é composto pela cristalização de uma liga de Fe-Si-B amorfa com pequenas adições de Cu e Nb. Esta composição é a chave para uma estrutura de grãos ultrafinos e as propriedades magnéticas moles associadas.

É bem conhecido que a microestrutura, visivelmente o tamanho do grão, determina essencialmente o ciclo de histerese de um material ferromagnético. No entanto, tivemos que construir uma compreensão mais profunda da coercividade (Hc) em toda a gama de comprimentos de correlação estrutural a partir de distâncias atômicas em ligas amorfas sobre tamanhos de grão (D) no regime nanométrico até tamanhos de grão macroscópico. A dependência 1 / D da coercividade para grandes tamanhos de grãos reflete a regra convencional de que boas propriedades magnéticas moles requerem grãos muito grandes (D> 100μm). Assim, a redução do tamanho das partículas para o regime da largura da parede do domínio aumenta a coercividade Hc. Por outro lado, as coercividades mais baixas são novamente encontradas para os menores comprimentos de correlação estrutural, como nas ligas amorfas e nas ligas nanocristalinas, para tamanhos de grão D <20nm. O novo material nanocristalino preenche a lacuna entre os metais amorfos e as ligas policristalinas convencionais. A combinação de tamanho de grão pequeno e propriedades magnéticas suaves é surpreendente e fascinante do ponto de vista clássico em engenharia magnética.

Papel dos Materiais Magnéticos Moles Nanocristalinos em dispositivos eletrônicos e outras aplicações:

Tape wound cores: a nanocrystalline material application.
Núcleos magnéticos: uma aplicação de materiais nanocristalinos.

O material magnético amorfo e nanocristalino, em forma de faixa, é utilizado para produzir os chamados núcleos de fita enrolada (= núcleos magnéticos). A adição de enrolamentos de cobre leva a componentes indutivos bem conhecidos para a indústria eletrônica.

A Vaccumschmelze é líder de mercado e tecnologia em muitas aplicações com anos de experiência no mercado internacional. A experiência da empresa abrange todo o processo de desenvolvimento, desde o conhecimento das características da liga até a tecnologia de fabricação e os locais de fabricação de baixo custo.

A VAC produz componentes indutivos baseados em material nanocristalino para os mercados de instalação, automotivo e industrial.

Exemplos para o mercado de instalação: Conversores de corrente total para chaves de proteção contra corrente de fuga à terra e conversores de corrente para medidores eletrônicos de energia.

Exemplos para o mercado automotivo: bobinas e transformadores para o gerenciamento de energia, antenas flexíveis para Keyless-Entry-Systems, para veículos híbridos e elétricos, sistemas de Recuperação, Start-Stop-Systems e conversores DC / DC.

Exemplos para o mercado industrial: bobinas, transformadores e sensores de potência para fontes de alimentação e retificadores. Bobinas de modo comum e núcleos nanocristalinos pavimentam o caminho para designs de filtro compactos e inovadores com a mais alta eficiência para acionamentos de motores elétricos superiores, de acordo com as mais novas regulamentações internacionais. Os transformadores de acionamento por gaveta proporcionam a mais alta segurança, excelente confiabilidade e longa vida útil para aplicações especiais (alta voltagem) combinando eficiência de transmissão de energia e sinal em um componente, resultando em custos totais mais baixos. Os sensores atuais oferecem máxima precisão.

Novos desenvolvimentos: Aplicações de alta frequência (redução de tamanho).

Vacuumschmelze é tradicionalmente um fornecedor de componentes indutivos. Componentes indutivos convencionais, como núcleos magnéticos, componentes indutivos, bobinas e transformadores, bem como antenas flexíveis, são grandes e colocados em cima dos PCBs. Todos estes produtos estabelecidos são geralmente utilizados na gama de frequência mais baixa, e. a 50Hz ou até alguns kHz.

Respondendo aos desafios futuros dos circuitos eletrônicos, nos deparamos com novos requisitos – especialmente, houve uma tendência de usar frequências mais altas e, consequentemente, a tendência para a miniaturização. Isso permite o uso de componentes incorporados, nos quais caps, semicondutores, resistores e indutâncias localizam um local dentro do PCB, respectivamente em uma camada de um PCB multicamada.

Para dar os primeiros passos nessa direção, participamos de um projeto de pesquisa conjunto chamado VISA, que foi fundado pelo Ministério Federal Alemão de Educação e Pesquisa, onde nós tivemos que melhorar nossos materiais magnéticos amorfos ou nanocristalinos para torná-los prontos para altas frequências e incorporação. Tais componentes indutivos devem ser planos, a altura máxima não deve exceder 1 mm, as perdas de ferro devem ser tão baixas quanto possível e um fator de alta qualidade na freqüência de comutação até a faixa de MHz foi solicitado. Para aplicação, estávamos focados em conversores DC / DC para a pequena faixa de potência. Além disso, esperávamos aplicações para núcleos, indutores planares, materiais de blindagem e sensores para a indústria automotiva, p. sistemas de acionamento eletrônico, para tecnologia LED de energia ou carregadores fotovoltaicos ou para aplicações de blindagem, como sistemas de carregamento sem fio.

Novos desenvolvimentos: materiais de alta saturação (redução de tamanho).

Sabe-se bem que as ligas de Fe-Cu-Nb-Si-B nanocristalinas exibem excelentes propriedades magnéticas moles (baixo campo de coercividade Hc e alta permeabilidade µ) combinadas com baixa magnetostrição (ls) e polarização de alta saturação em torno de Js ~ 1.2T. Eles são amplamente utilizados em aplicações magnéticas.

Desde a sua descoberta, uma importante força motriz para o desenvolvimento adicional de ligas tem sido aumentar a polarização de saturação para receber uma mudança de fluxo efetiva mais alta após reverter a excitação magnética. Assim, um nível mais alto de indutância poderia ser alcançado em volume simultaneamente menor. Os desenvolvimentos mais recentes são as ligas Fe-Si-B-P-Cu, que apresentam uma alta polarização de saturação em torno de Js ~ 1,8 T, bem como uma coercividade razoavelmente baixa (Hc <10 A m).

Um problema associado a estas novas ligas é que elas estão localizadas perto do limite de formação de vidro, levando a sérios problemas de produção. Demonstrou-se recentemente que as composições mais recentes investigadas nos últimos anos exibem capacidade de formação de vidro suficiente para produção em grande escala. No entanto, a magnetostrição de saturação de ligas de Fe-Si-B-P-Cu nanocristalinas ainda é relativamente alta (ls≈14 ppm). A baixa magnetostricção, no entanto, é importante para boas propriedades magnéticas e insensibilidade ao estresse do ciclo de histerese. O objetivo do desenvolvimento atual é investigar a capacidade de aplicação de tais sistemas de liga e fornecer o tão faltar comportamento das propriedades magnéticas, particularmente no estado nanocristalino.


Para mais informações sobre este palestrante e a palestra plenária que ele proferirá no XVII Encontro da SBPMat/B-MRS Meeting, clique na foto do palestrante e no título da palestra: https://www.sbpmat.org.br/17encontro/home/

Jovem sócio da SBPMat recebe 4 prêmios de sociedades científicas do mundo em 2017.

Navadeep Shrivastava no E-MRS Spring Meeting 2017 apresentando o trabalho premiado.
Navadeep Shrivastava no E-MRS Spring Meeting 2017 apresentando o trabalho premiado.

No que vai deste ano, o sócio da SBPMat Navadeep Shrivastava ganhou quatro reconhecimentos por trabalhos sobre materiais com propriedades magnéticas e luminescentes desenvolvidos no contexto do doutorado em Física que está realizando na Universidade Federal do Maranhão (UFMA) com orientação do professor Surender Kumar Sharma.

Inicialmente, no mês de fevereiro, Shrivastava foi selecionado para receber isenção na inscrição ao E-MRS 2017 Spring Meeting, dentro de um acordo existente entre a SBPMat e a Sociedade Europeia de Pesquisa em Materiais (E-MRS). O prêmio recebido possibilitou a participação do doutorando no evento, que foi realizado em Estrasburgo (França) de 22 a 26 de maio de 2017.

No evento da E-MRS, Shrivastava ganhou o prêmio ao melhor pôster do simpósio O pelo trabalho “Luminescence and Magnetic Behavior of Color Tuned LaF3:RE3+  (RE= Ce, Gd, Eu) Nanoparticles”. Além disso, ele apresentou outro trabalho no simpósio V (“Green emitting magneto-luminescent iron-oxide/ZnS coated by codoped lanthanum fluoride nanomaterials”), que chamou a atenção da plateia, gerou uma colaboração com um grupo da Université de Strasbourg (França) e ampliou sua rede de contatos profissionais, relata ele. “Quero expressar a minha gratidão pela oportunidade de participar do E-MRS 2017 Spring Meeting”, diz Shrivastava.

Em terceiro lugar, o doutorando foi um dos vencedores do Bernhard Gross Award de 2017, outorgado pela SBPMat aos melhores trabalhos apresentados por estudantes nos simpósios de seus eventos anuais. Shrivastava recebeu a distinção pelo trabalho “Facile synthesis and magneto-luminescence study of aliance of iron oxide and NaGdF4:RE3+ into nanoentity”, apresentado em sessão oral no simpósio B. O prêmio foi entregue em 14 de setembro deste ano na cidade de Gramado, durante a cerimônia de encerramento do XVI Encontro da SBPMat/B-MRS Meeting.

Finalmente, o doutorando da UFMA acaba de ser selecionado para receber um auxílio de viagem da IEEE Magnetics Society para apresentar dois trabalhos na 62ª edição da conferência internacional de Magnetismo e Materiais Magnéticos, chamada de MMM 2017, que será realizada em Pittsburgh (EUA) em novembro deste ano.

Gente da nossa comunidade: entrevista com o cientista Marcelo Knobel.

Marcelo Knobel. Créditos: Antonio Scarpinetti – Ascom – Unicamp.

Pesquisa científica, materiais magnéticos, divulgação científica e ensino superior seriam, talvez, as expressões maiores numa nuvem de tags que representasse o professor Marcelo Knobel.

Nascido em Buenos Aires (Argentina) em 1968, Marcelo Knobel veio morar no Brasil, mais precisamente em Campinas (SP), aos 8 anos de idade, acompanhando os pais dele, a psicóloga Clara Freud de Knobel e o psiquiatra Maurício Knobel. A família estava escapando do golpe de estado que acabara de instaurar no poder, na Argentina, uma ditadura militar que demitira Maurício da Universidade de Buenos Aires (UBA). No Brasil, que também estava governado por uma ditadura militar, Maurício tinha sido contratado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Dez anos depois da chegada a Campinas, Marcelo Knobel ingressou na Unicamp para fazer a graduação em Física. Em paralelo aos estudos, começou a trabalhar com propriedades magnéticas de materiais como bolsista de iniciação científica. Finalizado o bacharelado, Knobel permaneceu na Unicamp para realizar o doutorado na mesma área, obtendo o diploma de doutor em Física ao defender sua tese sobre magnetismo e estrutura de materiais nanocristalinos em 1992. Na sequência, partiu para a Europa, onde realizou dois estágios de pós-doutorado; um deles no Istituto Elettrotecnico Nazionale Galileo Ferraris, da Itália, e o outro no Instituto de Magnetismo Aplicado, na Espanha.

De volta ao Brasil e à Unicamp, em 1995, Marcelo Knobel começou sua carreira de professor e pesquisador do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW). De 1999 a 2009 foi coordenador do Laboratório de Materiais e Baixas Temperaturas, onde atua como pesquisador até o presente, sempre investigando magnetismo e materiais magnéticos. Junto a seus colaboradores do laboratório, Knobel realizou trabalhos pioneiros no estudo da magnetorresistência e magnetoimpedância gigante em determinados materiais – dois conceitos diferentes que se referem à oposição que um material oferece à passagem da eletricidade em consequência da aplicação de um campo magnético externo. Em 2008, Knobel tornou-se professor titular do Departamento de Física da Matéria Condensada do IFGW.

Na área de divulgação científica, Marcelo Knobel começou no ano 2000 a colaborar com as atividades de ensino e pesquisa do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (LABJOR), da Unicamp. Além disso, Knobel foi um dos criadores da NanoAventura, uma exposição interativa e itinerante sobre nanotecnologia que foi lançada em 2005 e foi visitada por mais de 50 mil pessoas, principalmente crianças, até o presente. A NanoAventura recebeu menções honrosas no Festival de Cine e Vídeo Científico do Mercosul (2006) e no Prêmio Mercosul de Ciência e Tecnologia (2015), além de um prêmio, em 2009, da Rede de Popularização da Ciência e da Tecnologia na América Latina e no Caribe (RedPOP). De 2006 a 2008, Knobel foi o primeiro diretor do Museu Exploratório de Ciências, ligado à Unicamp. Em 2008, tornou-se editor-chefe da revista Ciência & Cultura da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), posição que ocupa até o presente. No campo editorial, Knobel coordena uma coleção de livros de divulgação científica da Editora Unicamp, chamada Meio de Cultura, lançada em 2008.

Em 2007 Marcelo Knobel recebeu o Young Scientist Prize da TWAS-ROLAC (escritório da América Latina e Caribe da academia mundial para o avanço da ciência em países em desenvolvimento), destinado a jovens cientistas da região. No mesmo ano, foi selecionado, junto a cerca de 50 pessoas de diferentes áreas de atuação e diversos países do mundo, para participar do programa Eisenhower Fellowships, que visa a reforçar o potencial de liderança de seus fellows. O grupo viajou pelos Estados Unidos durante 7 semanas cumprindo com uma agenda de reuniões e seminários. Em 2009, foi escolhido fellow da John Simon Guggenheim Memorial Foundation, recebendo recursos dessa fundação para o desenvolvimento de pesquisa.

De 2009 a 2013, foi pró-reitor de Graduação da Unicamp. Nesse cargo, foi responsável pela implantação do Programa Interdisciplinar de Educação Superior (ProFIS). O ProFIS é um curso de nível superior de 4 semestres que proporciona uma formação geral, multidisciplinar e crítica, e possibilita a seus egressos (ex-alunos de escolas públicas selecionados por suas boas notas no ENEM) que ingressem em cursos de graduação da Unicamp sem passar pelo vestibular. O programa foi distinguido em 2013 com o Prêmio Péter Murányi – Educação, destinado a ações que aumentem o bem-estar de populações do hemisfério sul.

Em 2010, com 42 anos de idade, Knobel foi laureado Comendador da Ordem do Mérito Científico pela Presidência da República.

Bolsista de produtividade 1A do CNPq, Marcelo Knobel publicou cerca de 300 artigos científicos em revistas internacionais com revisão por pares e 15 capítulos de livros sobre materiais e propriedades magnéticas, popularização da ciência, percepção pública da ciência e ensino superior. Também é autor de artigos sobre ciência e educação publicados em diversas mídias. Conta com 6.370 citações, segundo o Google Scholar.

Marcelo Knobel acaba de assumir, no dia 3 de agosto, o cargo de diretor do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).

Segue uma breve entrevista com o cientista.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um pesquisador e a trabalhar na área de Materiais.

Marcelo Knobel: – Escolhi a área de Física pela curiosidade, sem saber direito o que isso significava. Mas já no primeiro semestre percebi que era aquilo mesmo que eu queria para a minha vida, tentando entender a natureza. Logo no início da graduação tive aula de laboratório com a professora Reiko Sato, que posteriormente me convidou para fazer iniciação científica em seu laboratório. Ela trabalhava com propriedades magnéticas de metais amorfos, e foi o tema de início de minha pesquisa. Depois, fiz o doutorado direto com ela também, já trabalhando com nanocristais, e posteriormente segui o pós-doutoramento na mesma área.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais?

Marcelo Knobel: – Venho atuando em sistemas magnéticos nanoscópicos, investigando principalmente as interações dipolares em nanossistemas magnéticos, utilizando diversas técnicas experimentais, modelos teóricos e simulações computacionais. Esses sistemas, além do interesse em pesquisa básica, possuem diversas aplicações possíveis, principalmente em sistemas de gravação magnética e nanomedicina. O grupo de pesquisa que ajudei a consolidar desenvolve novos materiais nanocristalinos e realiza estudos através do desenvolvimento de novas técnicas magnéticas, estruturais e de transporte. No âmbito dessas pesquisas, fomos pioneiros no estudo da magnetorresistência gigante em sistemas granulares e na investigação da magnetoimpedância gigante em fios e fitas amorfos e nanocristalinos. Mas tenho me dedicado também à divulgação científica, sendo um dos responsáveis pela criação do Museu Exploratório de Ciências da Unicamp.  Fui o coordenador do projeto NanoAventura, que é uma exposição interativa e itinerante sobre nanociência e nanotecnologia para crianças e adolescentes. Atuo ainda em pesquisas na área de percepção pública da ciência, coordeno a série “Meio de Cultura” da Editora da Unicamp e atuo como editor chefe da revista Ciência & Cultura, da SBPC. Fui recentemente Pró-Reitor de Graduação da Unicamp, onde destaco a implantação do Programa Interdisciplinar de Educação Superior (ProFIS). Atualmente, estou iniciando um novo desafio, como Diretor do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano).

Boletim da SBPMat: –  Você tem uma atuação especialmente forte em divulgação da ciência e da cultura científica. Comente com os nossos leitores estudantes e pesquisadores qual é, para você, a importância de realizar esse tipo de atividade.

Marcelo Knobel: – Eu me tornei um cientista após ler livros e revistas de divulgação, e de visitar museus de ciências. Creio que devemos incentivar as novas gerações a pensar criticamente, a ter curiosidade, a buscar desvendar os mistérios que nos cercam. Para o Brasil é fundamental estimular jovens talentos para a ciência. Sem eles não teremos futuro… Além disso, é nossa obrigação prestar contas com a sociedade, que é quem financia a pesquisa científica nas universidades públicas e nos institutos de pesquisa. É importante mostrar a ciência que é realizada em nosso país, e a importância de seguir investindo, cada vez mais, em ciência e tecnologia.

Boletim da SBPMat: – Se desejar, deixe uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas.

Marcelo Knobel: – Não tenho dúvidas que é a paixão que deve guiar as carreiras de todos, e principalmente dos cientistas. Mas além da paixão, é necessária uma formação sólida, não só no conteúdo específico, mas também em habilidades pessoais, como trabalho em equipe, comunicação (incluindo português e inglês, redação científica) e cultura geral. A atividade científica exige esforço e dedicação, mas é recompensada, penso eu, por uma vida repleta de novos desafios e oportunidades.

Entrevista com o professor Sergio Machado Rezende, vencedor do Prêmio FCW de Ciência.

Crédito: Leo Ramos.

O professor Sergio Machado Rezende, pesquisador da área de Física de Materiais e ex-gestor (como ele diz) de ciência e tecnologia, recebeu, na noite de 17 de junho deste ano, o Prêmio FCW de Ciência, da Fundação Conrado Wessel. Membro da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais, Rezende teve importante participação na criação da nossa SBPMat.

O prêmio recebido por Rezende em cerimônia na Sala São Paulo reconhece perfis renomados em ciência, com qualidades de talento inovador, liderança, abrangência social, trabalho incansável, integridade e ética. Os candidatos são indicados por instituições reconhecidas do país. No caso de Rezende, a indicação partiu da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde ele é professor titular do Departamento de Física desde 1972.

Nascido no Rio de Janeiro, Sergio Rezende se formou em Engenharia Eletrônica em 1963 pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e obteve o mestrado e o doutorado, ambos em Engenharia Eletrônica-Ciência de Materiais, no Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. De volta ao Brasil, e antes de entrar na UFPE, foi professor associado da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Em gestão de ciência e tecnologia, foi presidente da Finep entre 2003 e 2005 e ministro da Ciência e Tecnologia de 2005 a 2010. Antes de assumir a Presidência da Finep, ocupou os cargos de diretor científico da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facepe); secretário de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Estado de Pernambuco, e secretário do Patrimônio, Ciência e Cultura da Prefeitura de Olinda, além de chefe do Departamento de Física e diretor do Centro de Ciências Exatas da UFPE.

Dentro da sua atuação acadêmica, desenvolvida quase sempre em paralelo à sua atuação como gestor público, o professor Rezende orientou 36 trabalhos de mestrado e de doutorado e publicou mais de 230 artigos científicos em revistas de circulação internacional.

Entre outras distinções, Sergio Rezende recebeu, em 1995, a Comenda da Ordem do Mérito Científico, categoria Grã-Cruz, por suas relevantes contribuições à ciência e tecnologia, e, em 2001, o Prêmio Anísio Teixeira da Capes, homenagem a personalidades brasileiras que tenham contribuído de modo relevante para o desenvolvimento da pesquisa e formação de recursos humanos no país. Rezende também foi distinguido, em 2011, com a primeira palestra memorial “Joaquim Costa Ribeiro”, honraria outorgada pela SBPMat.

Segue uma breve entrevista com o professor.

Boletim da SBPMat (B. SBPMat): – Quais são, na sua avaliação, as suas principais contribuições/ ações de maior impacto para a ciência no Brasil, seja no seu papel de pesquisador e formador de pessoas, seja no seu papel de gestor público?

Sergio Machado Rezende (S.M.R.): – Eu gostaria de destacar duas, uma como pesquisador e outra como gestor no cargo mais alto que ocupei.
A primeira foi o meu papel na implantação de um grupo de pesquisa em Física na Universidade Federal de Pernambuco, iniciada em 1972, num lugar onde não havia pesquisa em Física anteriormente. Eu fui o primeiro doutor na área de Física da universidade. Com meus colegas conseguimos formar um grupo que faz pesquisa na fronteira do conhecimento, temos ótimos laboratórios e estamos contribuindo na formação de engenheiros (Física básica) e formando bons físicos em nossos programas de graduação e pós-graduação. Isso mostra que é possível fazer no Brasil uma instituição de ensino e pesquisa de bom nível, num local sem tradição na área, desde que haja determinação, pessoas qualificadas e apoio do governo.
A segunda foi na minha atuação no Ministério da Ciência e Tecnologia, onde, com grande articulação da comunidade científica, empresarial e do governo, fizemos um plano de ação de ciência, tecnologia e inovação que foi bem sucedido, com prioridades claras, linhas de ação abrangentes e programas bem articulados, que possibilitaram grande aumento nos recursos financeiros federais e estaduais.

B.SBPMat: – Após muitos anos conciliando o trabalho de gestor público com o de professor e pesquisador, já de volta à vida de cientista em tempo integral, conte-nos um pouco sobre seus projetos e interesses atuais, principalmente os referentes à pesquisa em Materiais.

S.M.R.: – Eu praticamente sempre trabalhei com materiais magnéticos. Fiz poucos trabalhos que não envolveram materiais magnéticos. Nos últimos tempos tenho me dedicado a uma área do magnetismo que se chama spintrônica. É uma área muito nova, que está desenvolvendo rapidamente. Já tem algumas aplicações tecnológicas muito difundidas, mas tem um potencial de aplicações muito grande. A spintrônica ainda está numa fase inicial de desenvolvimento, então seus desafios científicos são muito interessantes e estão na fronteira do conhecimento. É muito estimulante para um cientista ter a possibilidade de trabalhar numa área que é competitiva, que tem muita gente trabalhando e que está crescendo rapidamente.

B.SBPMat: – O senhor sempre pesquisou materiais magnéticos e propriedades magnéticas. Qual é a sua apreciação da evolução dessa área e de seus principais desafios?

S.M.R.: – Os materiais magnéticos, como se sabe, têm muitas aplicações tecnológicas, e algumas delas são muito antigas. Desde que o motor elétrico, o gerador e os transformadores foram inventados no século XIX, a eletricidade passou a ser muito presente em nossa vida. Os materiais magnéticos são essenciais para todos eles, assim como para muitos outros dispositivos e equipamentos, divididos em duas classes bem distintas, os ímãs permanentes, que retêm sua magnetização, e os materiais moles, que são facilmente desmagnetizados. Existe uma terceira categoria de aplicações de materiais magnéticos que exige propriedades intermediárias entre os dois, é na gravação magnética, usada hoje principalmente nos discos rígidos dos computadores. Nessas três áreas de aplicações, são os resultados da pesquisa em Física, Química e Engenharia de Materiais que têm possibilitado o desenvolvimento de materiais melhores, com maior capacidade e em volumes menores.
Por exemplo, hoje os ímãs de terras raras que foram desenvolvidos nos últimos quinze a vinte anos são essenciais para se fazer motores e geradores de alta eficiência, empregados nos carros elétricos e nos geradores de turbinas eólicas. As turbinas eólicas, que são usadas para gerar energia a partir do vento, hoje têm capacidade de geração muito alta, graças em grande parte ao desenvolvimento de ímãs de terras raras.
Na área de gravação magnética, nós vemos a evolução em nosso dia-a-dia. A cada ano, a capacidade de memória do disco rígido dos novos computadores é maior. E nós queremos mais memória para armazenar mais informação. A grande evolução na capacidade de armazenamento dos computadores é resultado, exatamente, da pesquisa e desenvolvimento dos materiais magnéticos usados na gravação e também da cabeça de leitura da informação gravada. Todos os computadores atuais usam na cabeça de leitura um sensor de spintrônica, que utiliza um fenômeno chamado magneto-resistência gigante (GMR). É interessante lembrar que a GMR foi descoberta em 1989 por uma equipe da Universidade de Paris em Orsay, do qual fazia parte Mario Baibich, físico da UFRGS, que foi o primeiro autor do artigo científico que relatou a descoberta.

B.SBPMat: – Gostaria de deixar alguma mensagem para nossos leitores que estão iniciando suas carreiras de cientistas?

S.M.R.: – Há quarenta anos, quando eu vim para Pernambuco, os recursos para ciência eram muito menores do que são agora, o ambiente na universidade não favorecia muito a pesquisa, havia muito poucos pesquisadores, não havia programas de pós-graduação. Mas a situação mudou muito nos últimos quarenta anos. Então, o que eu quero dizer para o jovem que começa sua carreira atualmente é que dificuldades ainda existem, mas elas são hoje muito menores do que na época em que eu estava começando minha carreira. E que a coisa mais importante para um jovem é não desanimar. É preciso enfrentar os problemas com disposição. É preciso entender que o Brasil tem um futuro muito amplo e que a ciência e a tecnologia vão ser cada vez mais importantes para nosso desenvolvimento. O jovem precisa ter consciência de que vai ter um papel importante no futuro e precisa ter confiança para não desanimar com as dificuldades que, como disse antes, são muito menores hoje do que no passado.