Gente da comunidade: entrevista com Gleison Adriano da Silva, vencedor de Prêmio Destaque de iniciação científica do CNPq.

foto1Nosso entrevistado do mês de dezembro é Gleison Adriano da Silva, um dos vencedores da 13ª edição do Prêmio Destaque na Iniciação Científica e Tecnológica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O jovem, que em novembro se diplomou bacharel em Física pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), ganhou o prêmio de iniciação científica da área de Ciências Exatas, da Terra e Engenharias por um trabalho de sobre caracterização estrutural, térmica e óptica de sistemas semicondutores. O prêmio do CNPq distinguiu seis trabalhos (o melhor de iniciação científica e o melhor de iniciação tecnológica de cada grande área do conhecimento) dentre 467 inscritos, enviados por 167 instituições de ensino e pesquisa do Brasil.

O trabalho que valeu o prêmio a Gleison foi desenvolvido ao longo de três projetos de iniciação científica que o jovem realizou no contexto do Grupo de Materiais do Departamento de Física da UFAM, com orientação do professor Sérgio Michielon de Souza e com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM) e do CNPq. Nesses projetos, foram sintetizados materiais nanoestruturados semicondutores por meio de um processo simples e de baixo custo. Os materiais foram analisados por meio das técnicas de difração de raios X, calorimetria diferencial de varredura, micro-Raman e espectroscopia de absorção fotoacústica, e demonstraram um bom potencial para serem usados como materiais termoelétricos na transformação direta de calor em eletricidade.

Gleison se tornou bolsista de iniciação científica (inicialmente da FAPEAM e depois do CNPq) pouco depois de entrar no curso de bacharelado em Física da UFAM, em 2011. Seu orientador, Sérgio Michielon de Souza, tinha se tornado docente dessa instituição no mesmo ano e estava montando o Laboratório de Materiais no Departamento de Física, processo do qual Gleison participou ativamente. A primeira fase do trabalho foi dedicada à fabricação e estudo do sistema Cd-Se, e seus resultados foram publicados [http://dx.doi.org/10.1016/j.molstruc.2014.06.023] em setembro de 2014 no Journal of Molecular Structure (editora Elsevier), enquanto ele trabalhava na segunda fase do trabalho, voltada ao sistema Ni-Sb. Também em setembro de 2014, Gleison apresentou os resultados parciais dessa segunda fase do trabalho no XIII Encontro da SBPMat, realizado em João Pessoa (PB). Seu pôster foi distinguido no final do evento com o Prêmio Bernhard Gross ao melhor trabalho do simpósio S, dedicado a pôsteres sobre materiais avançados. Em maio de 2015, os resultados finais da pesquisa sobre o sistema Ni-Sb foram publicados [http://dx.doi.org/10.3139/146.111211] no International Journal of Materials Research (editora Carl Hanser Verlag GmbH & Co.). Em setembro de 2015, Gleison apresentou a terceira fase do trabalho, dedicada ao sistema Sn-Se, no XIV Encontro da SBPMat, no Rio de Janeiro (RJ).

Finalmente, em julho de 2016, Gleison teve a grande satisfação de receber o Prêmio Destaque na Iniciação Científica e Tecnológica, em Porto Seguro (BA), durante a 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Era a terceira vez que o estudante era indicado pela Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UFAM para concorrer ao prêmio do CNPq, e dessa vez conquistou a distinção com os resultados finais da pesquisa sobre o sistema Ni-Sb e os resultados parciais da pesquisa sobre o sistema Sn-Se. Três meses depois, Gleison defendeu seu trabalho de conclusão de curso (TCC), elaborado a partir dos estudos com os sistemas Ni-Sb e Sn-Se, e obteve o título de bacharel em Física pela UFAM.

Veja nossa entrevista com Gleison.

Boletim da SBPMat: – Onde você nasceu? Onde morou até iniciar os estudos universitários na UFAM? 

Gleison Adriano da Silva: – Sou natural do Brasil Central, Brasília (DF), e tudo começou em 2008 quando me candidatei a missionário/ agente comunitário da Diocese de Roraima na Região Norte do Brasil, sob comando do antigo bispo titular Dom Roque Paloscci, para trabalhar em comunidades no baixo Rio Branco até a sua foz no Rio Negro. Em 2009, prestei o ENEM com êxito para Engenharia Florestal na UFAM, campus Manaus (AM). Sem auxílio financeiro, fui morar em um albergue no Centro de Manaus (AM), entretanto, após processo seletivo na Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários, passei a morador da Casa do Estudante Universitário da UFAM. Em 2011, por falta de afinidade ao curso Engenharia Florestal, mudei para o curso bacharelado em Física do Instituto de Ciências Exatas da UFAM.

Boletim da SBPMat: – Poderia nos contar muito brevemente como começou o seu interesse pela ciência e/ou pela pesquisa? Foi na universidade, na infância, na escola? 

Gleison Adriano da Silva: – Tudo aconteceu muito rápido. Ao ingressar no curso bacharelado em Física da UFAM, já iniciei na pesquisa científica à convite do Prof. Dr. Sérgio Michielon de Souza e, dada minha inserção junto ao Grupo de Pesquisa em Materiais do Depto de Física da UFAM, pude ter a oportunidade de realizar investigações científicas voltadas na determinação de estruturas cristalinas, evolução micro/nano-estrutural e transformação de fases em materiais intermetálicos utilizando softwares computacionais e técnicas analíticas no Laboratório de Materiais.

Boletim da SBPMat: – Qual é, na sua visão, a principal contribuição contida do trabalho premiado? Ou, quais são as principais contribuições dos trabalhos premiados? 

Gleison Adriano da Silva: – Uma observação interessante é que as investigações laureadas estavam coincidentemente relacionadas com os temas celebrativos da UNESCO de 2014 e 2015 intitulado como Ano  Internacional da Cristalografia e Ano Internacional da Luz. Nesta perspectiva, as principais contribuições contidas nos trabalhos premiados estavam relacionadas a técnica de difração de raios X, ou seja, transformações e estabilidade de fases cristalográficas das amostras do sistema semicondutor Ni-Sb e Sn-Se durante a síntese de estado sólido, onde foi observado uma forte estabilidade estrutural nos cristais de antimoneto de níquel (NiSb) e uma notável metaestabilidade nos cristais de seleneto de estanho (SnSe).

Um trabalho simples que apresenta características microestruturais e termodinâmicas de dois novos materiais nanoestruturados de interesse científico e tecnológico submetido a uma rota de síntese não complexa e de baixo custo.

Boletim da SBPMat: – Quais foram os critérios que o guiaram para fazer uma pesquisa de qualidade destacada em nível nacional? A que fatores você atribui esta conquista? 

Gleison Adriano da Silva: – Não existe ovo de Colombo ou receita de sucesso, só muito trabalho. Nada acontece sem esforço. Como bolsista na iniciação científica eu sempre fui o primeiro a chegar e o último a sair do laboratório. A conquista é reconhecimento do trabalho, entretanto, ninguém consegue nada sozinho.

Boletim da SBPMat: – Convidamos você a deixar alguma mensagem para nossos leitores que estão realizando trabalhos de iniciação científica na área de Materiais. 

Gleison Adriano da Silva: – Acreditem no potencial de vocês e no potencial de suas investigações. O sonho é o que move agente, mas não basta só sonhar, tem que correr atrás. Considerem isso também como um incentivo para divulgação de seus resultados em eventos científicos pelo Brasil, em especial nos Encontros Anuais da SBPMat.

Boletim da SBPMat: – O que você fará ou planeja fazer agora que terminou a graduação. 

Gleison Adriano da Silva: – Após a saga da graduação, provavelmente procurarei um Programa de Pós-Graduação na Universidade de Brasília (UnB) ou em alguma renomada instituição paulista.

Boletim da SBPMat: – Fique à vontade para outro breve comentário, se desejar. 

Gleison Adriano da Silva: – Gostaria de agradecer as cartas de congratulações e aplausos expedidas pelo Chefe do Depto de Física da UFAM, Senhor Prof. Me. Marcílio de Freitas; pela Diretora-Presidente da FAPEAM, Senhora Profa. Dra. Maria Olívia de Albuquerque Ribeiro Simão; e pela Senhora Senadora Vanessa Grazziotin da câmara alta do Congresso Nacional do Brasil (http://www.senado.leg.br/atividade/rotinas/materia/getPDF.asp?t=195150&tp=1).

Também, gostaria de agradecer a cidade de Manaus (AM), a UFAM e a todas as pessoas que direta e/ou indiretamente contribuíram para a minha formação pessoal e acadêmica.

Aberta a chamada de propostas de simpósio para o XVI Encontro da SBPMat/B-MRS Meeting.

A Sociedade Brasileira de Pesquisa em Materiais (SBPMat) está recebendo, até o dia 31 de janeiro, propostas de simpósios temáticos para o XVI Encontro da SBPMat. O evento será realizado de 10 a 14 de setembro de 2017 na turística cidade de Gramado (RS), no centro de eventos FAURGS.

Qualquer pessoa com título de doutor, ligada a instituições de ensino/pesquisa ou empresas do Brasil ou do exterior pode apresentar uma proposta de simpósio em temas da área de Ciência e Tecnologia de Materiais.

As propostas devem ser preenchidas online em http://www.sbpmat.org.br/proposed_symposium/, colocando o título e escopo do simpósio, relação dos temas abrangidos, dados dos organizadores e lista preliminar de palestrantes convidados.

As propostas submetidas serão avaliadas pela comissão de eventos da SBPMat e pelos organizadores do encontro, e submetidas à diretoria da sociedade.

Os simpósios temáticos são o eixo principal da programação dos eventos anuais da SBPMat. No encontro de 2016, realizado em Campinas, foram apresentados mais de 2.000 trabalhos em 22 simpósios, abrangendo a descoberta, fabricação, caracterização e aplicações de diversos tipos de materiais, tais como os nanoestruturados, os biomateriais, as superfícies e interfaces, os orgânicos eletrônicos, as eletrocerâmicas e a nanocelulose, entre muitos outros.

O site do evento será lançado e divulgado em breve.

Boletim da SBPMat – edição 51.

 

Saudações %primeiro_nome%!

Edição nº 51 – 30 de novembro de 2016 

Notícias da SBPMat (B-MRS)

XVI Encontro da SBPMat/B-MRS Meeting

Cidade: Gramado (RS)

Data definitiva: 10 a 14 de setembro de 2017 (e não 24 a 28, como informado anteriormente).

Chamada de propostas de simpósio: Pesquisadores com título de doutor ligados a instituições do Brasil ou do exterior podem submeter propostas de simpósio em qualquer tema relacionado à Ciência e Tecnologia de Materiais. A chamada está aberta até 31 de janeiro de 2017. A submissão deve ser feita por meio do formulário online

Acordo SBPMat – E-MRS. Sócios da SBPMat podem ter apoio para participação e organização de simpósios em eventos da sociedade europeia. Saiba mais.
SBPMat em eventos da Ásia. O presidente da SBPMat representou a sociedade em dois eventos da área de Materiais realizados na China. Ele comenta a relação da SBPMat com as sociedades asiáticas e conta como foi o “summit” que reuniu lideranças para discutir o assunto dos materiais para o desenvolvimento sustentável, com foco em materias para construção civil, engenharia oceanográfica, baterias, entre outros temas. Saiba mais. 
Artigo em destaque 

Em artigo publicado na Scientific Reports (Nature), um grupo de pesquisadores de instituições do estado do Paraná reporta a síntese, processamento, caracterização e demonstração de aplicações de filmes de um nanocompósito formado por grafeno e nanopartículas de hidróxido de níquel. A equipe apresenta um método inovador de fabricação do material e mostra que o nanocompósito supera o hidróxido de níquel puro no desempenho em baterias, sensores e eletrocromismo. Veja nossa matéria de divulgação.

Gente da comunidade 
Entrevistamos o cientista argentino Galo Soler Illia, que é um dos pesquisadores mais citados e premiados no país vizinho, além de ser talvez o mais famoso referente em Nanotecnologia entre jornalistas e público leigo. Soler Illia fez contribuições significativas à compreensão do mecanismo de formação de (nano)partículas e à síntese de materiais com porosidade altamente controlada, entre outros assuntos. Atualmente, além de lecionar na UBA e ser pesquisador do CONICET, Soler Illia dirige um instituto de pesquisa e desenvolvimento em nanotecnologia e atua como assessor da Presidência do país vizinho e de várias instituições da Argentina e do Brasil. Saiba mais sobre este cientista argentino e sobre sua intensiva interação com o Brasil.

 

A professora Elvira Fortunato, da Universidade de Nova Lisboa (Portugal), recebeu a Medalha Blaise Pascal 2016 na categoria Ciência dos Materiais no dia 19 de novembro em Bruxelas (Bélgica). O prêmio, outorgado pela Academia Europeia de Ciências (EURASC), foi entregue à professora Fortunato em reconhecimento “à notável originalidade e criatividade da sua pesquisa na área”, na qual fez contribuições como a invenção do transístor de papel e desenvolvimentos em eletrônica transparente. Estabelecido em 2003, o prêmio nunca antes tinha sido outorgado a cientistas portugueses. Elvira Fortunato, que mantém próxima relação com a comunidade de Materiais brasileira, proferiu palestra plenária no Encontro da SBPMat (B-MRS Meeting) deste ano.
História da pesquisa em Materiais no Brasil 

Em dezembro deste ano, o primeiro laboratório do Brasil dedicado ao estudo dos materiais vítreos completa 40 anos, muito satisfeito com suas realizações. Além de gerar uma produção científica de impacto, o laboratório foi essencial na disseminação da ciência, tecnologia e engenharia de vidros no país e, ao mesmo tempo, criou um ambiente de pesquisa internacional na cidade de São Carlos. Descubra de qual laboratório estamos falando e saiba mais sobre sua história e seus resultados. 

Dicas de leitura
  • Sistema baseado em polímero condutor amplia possibilidades de estudo de células e sua interação com o ambiente (divulgação de paper da Advanced Functional Materials). Aqui. 
  • Defeitos de escala atômica no diamante medem campos magnéticos com resolução nano, até em temperaturas muito baixas (divulgação de papers da Nature Nanotechnology). Aqui. 
  • Estudo detalha como ocorre a hidrogenação em grafeno de poucas camadas e as interessantes propriedades que gera (divulgação de paper do Journal of the American Chemical Society). Aqui.
Oportunidades
  • 1º microscópio de feixe triplo de íons da América Latina está no Inmetro e pode ser usado pela comunidade científica. Aqui.
  • Seleção para mestrado e doutorado no PPGCEM-DEMa-UFSCar. Aqui. 
  • Seleção para mestrado e doutorado em Física no PPGFSC-UFSC. Aqui.  
  • Seleção para mestrado e doutorado em Engenharia Biomédica na Univap. Aqui. 
  • Bolsa FAPESP de pós-doutorado no IPEN para pesquisa com células a combustível. Aqui.
Próximos eventos da área
  • I Simpósio Nacional de Nanobiotecnologia; II Workshop de Nanobiotecnologia da UFMG – Avanços & Aplicações. Belo Horizonte, MG (Brasil). 1 a 2 de dezembro de 2016. Site.  
  • V Curso de Análise de Minerais/Minérios pelas Técnicas de DRX e FRX. Fortaleza, CE (Brasil). 5 a 9 de dezembro de 2016. Site. 
  • II Escola de Verão: Desenvolvimento de Fármacos e Medicamentos. Porto Alegre, RS (Brasil). 13 a 17 de fevereiro 2017. Site.
  • 9th International Conference on Materials for Advanced Technologies. Suntec (Cingapura). 18 a 23 de junho de 2017. Site.
  • XVI Encontro da SBPMat/ XVI B-MRS Meeting. Gramado, RS (Brasil). 10 a 14 de setembro de 2017. Chamado de propostas de simpósio.
      
Você pode divulgar novidades, oportunidades, eventos ou dicas de leitura da área de Materiais, e sugerir papers, pessoas e temas para as seções do boletim. Escreva para comunicacao@sbpmat.org.br.
Descadastre-se caso não queira receber mais e-mails.

 

XVI B-MRS Meeting: call for symposia proposals.

xvi-encontroThe call for symposia proposals for the XVI Brazilian MRS (B-MRS) Meeting is open until January, 31, 2017. The conference will take place in Gramado, RS at the Centro de Eventos de Gramado – Faurgs, from September 10th-14th, 2017.

Symposium proposals may be submitted by any PhD associated with educational and/or research institutions in Brazil or abroad, in any field of Materials Science and Engineering. The proposal presentation must be submitted through the form available at http://sbpmat.org.br/proposed_symposium/. The submission requires the following data:

– Description of the symposium scope
– List of topics of interest
– Tentative list of invited speakers
– Names and contacts of symposium organizers

We look forward to your participation to create an outstanding B-MRS Meeting!

Gente da comunidade: entrevista com o cientista argentino Galo Soler Illia.

Galo Soler Illia.
Galo Soler Illia.

Quantas vocações científicas despertaram, e quantos acidentes domésticos provocaram, os jogos infantis de química experimental, que, até um tempo atrás, não seguiam todas as normas de segurança para brinquedos, hoje obrigatórias? O cientista argentino Galo Juan de Ávila Arturo Soler Illia pertence a esse grupo. Ele conta que seu interesse pela ciência se acendeu (literalmente) com um pequeno incêndio provocado por um jogo de laboratório de Química na casa de seus pais –  dois advogados, militantes da Unión Cívica Radical. Esse era o partido, aliás, do avô de Galo Soler Illia, o Presidente Arturo Umberto Illia, que governou a Argentina de 1963 a 1966, até sofrer um golpe de Estado.

Hoje, Galo Soler Illia pode ser considerado um dos pesquisadores mais conhecidos do país vizinho, tanto na comunidade científica (consta entre os 30 cientistas argentinos melhor posicionados no Google Scholar pelas citações a trabalhos de sua autoria, e já recebeu os principais prêmios nacionais de ciência) quanto entre o público leigo (no campo da Nanotecnologia, ele é um divulgador muito ativo e didático presente em todas as mídias, e costuma ser fonte de informações para os jornalistas argentinos).

Galo Soler Illia nasceu em Buenos Aires em 31 de maio de 1970. Fez seus estudos primários numa escola particular construtivista, o Colegio Bayard. Para cursar os estudos secundários ingressou, em 1983, ao Colegio Nacional de Buenos Aires, instituição pública dependente da Universidad de Buenos Aires (UBA), caracterizada, entre outras coisas, pela alta exigência nos estudos, a riqueza das atividades extracurriculares e uma infraestrutura superior à das outras escolas públicas. Em 1988, formou-se pelo colégio com uma especialização em Ciências. Tanto no ensino primário quanto no secundário teve oportunidade de fazer atividades em laboratórios de ciência.

Entre 1989, Soler Illia começou a cursar a graduação em Ciências Químicas na UBA. Durante a graduação, começou a lecionar no Departamento de Química Inorgânica, Analítica e Química Física da UBA e a fazer pesquisa em um grupo de Química de Materiais e também em um laboratório montado na casa de um amigo. Em 1993, ele obteve o diploma de licenciado em Química, tendo uma média nas avaliações das disciplinas de 9,13/ 10. Na Argentina, a licenciatura habilita o diplomado a realizar todo tipo de atividade profissional na área de formação, inclusive docência e atividades de pesquisa, e o prepara para um ingresso a um curso de doutorado sem passar pelo mestrado.

De 1994 a 1998, Soler Illia realizou o doutorado em Química, também na UBA, sob orientação do doutor em Química Miguel Angel Blesa. Através da pesquisa sobre nanopartículas de hidróxidos metálicos mistos, ele gerou conhecimento sobre o complexo mecanismo de formação de partículas, o qual lhe seria muito útil nas pesquisas que realizou como pós-doc e como pesquisador profissional, voltadas à síntese de materiais com alto controle de suas características. Concomitantemente ao doutorado, continuou lecionando, como assistente, na UBA.

Em 1999, foi morar na França, junto a sua esposa, a também química Astrid Grotewold, e permaneceram no país galo até o ano de 2002. Soler Illia fez um pós-doutorado na Université Pierre et Marie Curie (Paris), com supervisão do doutor Clément Sanchez, contando com uma bolsa com duração de 2 anos do CONICET, principal entidade argentina de apoio à ciência e tecnologia. No pós-doc, o argentino desenvolveu métodos para produzir materiais com porosidade altamente controlada. Desse período, resultaram os artigos de Soler Illia mais citados até o momento, com mais de 1.800 citações em um dos papers, segundo o Google Scholar. No final do período francês, Soler Illia também trabalhou em aplicações de filmes finos mesoporosos para o centro de pesquisa e desenvolvimento da empresa Saint Gobain.

Galo Soler Illia voltou à Argentina no início de 2003, num período em que o país saía de uma enorme instabilidade política que provocou a passagem de 5 pessoas diferentes pela Presidência da República em apenas 11 dias. Além disso, o país ainda estava sob os efeitos da grave crise econômica que tivera seu ápice em 2001. Entretanto, rapidamente, Soler Illia conseguiu ingressar à carreira de pesquisador do CONICET trabalhando na Comisión Nacional de Energia Atómica (CNEA) e, sem perder tempo, fundou o Grupo Química de Nanomateriales, que, até hoje, atua no projeto e obtenção de materiais nanoestruturados. Em 2004, o cientista se tornou, por concurso, professor da UBA, do departamento em que fizera seus estudos de grado e doutorado.

No início de 2015, Soler Illia se tornou diretor do Instituto de Nanosistemas (INS) da Universidad Nacional de San Martín, localizada na área metropolitana de Buenos Aires. O INS se define como um espaço de pesquisa, desenvolvimento e criação interdisciplinar em nanociência e nanotecnologia, cujo objetivo final é resolver problemas prioritários da indústria e da sociedade em geral. No instituto, Soler Illia conta com uma equipe científica multidisciplinar de 4 pesquisadores (mais 4 em 2017), 6 estudantes de pós-graduação e pós-docs e 1 técnico de laboratório, além de uma equipe de gestão formada por 6 profissionais.

Atualmente, além de diretor do INS, Galo Soler Illia é pesquisador principal do CONICET e professor associado da UBA. É membro de conselhos assessores na Fundación Argentina de Nanotecnología (FAN) e no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (Brasil), e membro do conselho editorial do Journal of Sol-Gel Science and Technology (Springer). Além disso, o cientista tem uma coluna de divulgação científica sobre Nanotecnologia no programa televisivo “Científicos Industria Argentina”, que vai ao ar uma vez por semana no canal público argentino. Finalmente, Soler Illia acaba de ser nomeado, neste mês de novembro, membro do Conselho Presidencial Argentina 2030, integrado por intelectuais de diversos campos para assessorar o presidente da Argentina, Mauricio Macri.

Soler Illia, cujo índice h é de 44, possui uma produção de mais de 120 artigos publicados em periódicos científicos internacionais, com cerca de 11 mil citações, segundo o Google Scholar. Já orientou 7 teses de doutorado concluídas e é autor de 2 livros de divulgação sobre nanotecnologia. Também é autor de 4 pedidos de patentes.

Seu trabalho foi reconhecido com uma série de prêmios à ciência, tecnologia, inovação e divulgação científica, entre eles os principais da Argentina, como o Prêmio Houssay 2006 e 2009, da secretaria e depois ministério de ciência e tecnologia argentino; o Prêmio KONEX 2013, da fundação homônima, e o Premio Innovar 2011 e 2016, do Ministerio de Ciencia, Tecnología e Innovação Productiva. Também recebeu distinções da Academia Nacional de Ciencias Exactas, da FAN, da Asociación Argentina de Investigacão Fisicoquímica, do CONICET, das empresa BGH e Dupont, entre outras entidades. Em maio deste ano, Galo Soler Illia foi designado acadêmico titular da Academia Nacional de Ciencias Exactas, Físicas y Naturales, passando a compor um seleto grupo de apenas 36 cientistas.

Segue uma entrevista com o cientista argentino.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos o que o levou a se tornar um cientista e a trabalhar no campo dos materiais.

Galo Soler Illia: – Sempre gostei de Química. Comecei com 5 anos, quando ganhei um jogo de Química e, fazendo um experimento, queimei a mesa de jantar da casa dos meus país. Depois, em meus estudos de nível secundário fui um pouco “nerd”, dedicando-me a escrever software para as aulas de Física do meu colégio. Escrever código despertou em mim uma curiosidade por saber como funcionavam as coisas e como os problemas podiam ser resolvidos. Aprendi muitíssimo. Perto do final do ensino secundário, decidi estudar Química, pois achei que era um curso muito versátil e maravilhoso que tinha grandes possibilidades em muitos campos. Nessa época, eu estava muito interessado na Biotecnologia, que era uma área nova. Mas na época em que comecei meus estudos de graduação na Universidade de Buenos Aires (UBA), a área de Química de Materiais começava a surgir. Ainda aluno, comecei a lecionar como ajudante no Departamento de Química Inorgânica, Analítica e Química Física da Faculdade de Ciências Exatas e Naturais, inspirado pelo exemplo de professores jovens e entusiastas que estavam voltando do exterior e geravam uma atmosfera de trabalho e exigência. Junto a meus melhores amigos, instalamos um laboratório em um quarto no terraço da casa de um deles. Ali crescíamos cristais e planejávamos síntese de moléculas. Como passávamos o dia todo na universidade e tínhamos algum tempo libre, eu achei um lugar para trabalhar, sem receber bolsa nem salário, em um grupo de Química de Materiais que acabava de começar. Tudo foi muito rápido e, quase sem perceber, finalizei meus estudos de graduação e iniciei o doutorado, fabricando micropartículas para catalizadores. Foi uma época muito linda da minha vida, da qual conservo minha curiosidade inata, minha vontade de explorar e construir matéria e um maravilhoso grupo de amigos, que se tornaram destacados colegas disseminados pelo mundo todo.

Boletim da SBPMat: – Quais são, na sua própria avaliação, as suas principais contribuições à área de Materiais, considerando todos os aspectos da atividade científica?

Galo Soler Illia: – Sempre me interessou construir materiais, o trabalho do químico de unir átomo com átomo, de fabricar novas arquiteturas. Centrei-me em compreender os fenômenos fisicoquímicos que ocorrem na produção de um material. Quando a gente conhece e compreende esses processos, passa de simplesmente “preparar” um material a poder projetá-lo e sintetizá-lo, por mais complexo que seja. E a gente pode aproveitar as propriedades dos elementos químicos a seu favor para obter as propriedades que a gente deseja. Vou dar três exemplos. Na minha tese, estudei a precipitação e agregação de nanopartículas de hidróxidos metálicos mistos, precursores de catalisadores. Descobrimos um mundo muito interessante e pudemos contribuir na compreensão da complexidade por trás de um mecanismo dinâmico de formação de partículas: a influência dos efeitos estruturais no formato das partículas, a importância da coordenação dos metais na formação de uma fase mista, a evolução da carga superficial e seu efeito na estabilidade de um coloide e muito mais, que me serviu futuramente como base sólida para minha pesquisa. Tive a sorte de poder trabalhar com Miguel Blesa, Alberto Regazzoni y Roberto Candal, três excelentes Mestres que me guiaram, estimularam e corrigiram.

Na minha segunda etapa, trabalhei em Paris, no laboratório de Clément Sanchez, e, usando o que tinha aprendido, pude desenvolver métodos para produzir materiais com porosidade altamente controlada, conhecidos como materiais mesoporosos organizados. Novamente, interessei-me pelos mecanismos de formação do material, que são complexos, pois demandam o controle do crescimento de pequenas espécies inorgânicas e sua automontagem com micelas. É uma pequena sinfonia físico-química, que é necessário aprender a tocar. Tivemos que usar, desenvolver e combinar técnicas de caracterização muito variadas para poder compreender quais fenômenos estavam ocorrendo e como eles controlavam a formação e organização dos sistemas de poros, a estabilidade e cristalinidade dos materiais, que são, entre outras, as variáveis importantes no desempenho final desses sólidos.

Na minha terceira etapa, de volta à Argentina, estabeleci um grupo de pesquisa na Comisión Nacional de Energía Atómica, em Buenos Aires, e me dediquei a construir arquiteturas mais complexas, baseadas em tudo que tinha aprendido. Minhas melhores contribuições nesse sentido se referem ao uso das forças e interações na nanoescala para fabricar nanocompósitos muito variados com propriedades ópticas e catalíticas projetadas e surpreendentes. Tudo isso demandou a criação de novos laboratórios, a formação de recursos humanos e a transferência de ciência básica a tecnologias. Particularmente, nos últimos anos temos trabalhado com empresas e aspiramos a gerar nanotecnologia na Argentina, estendendo os conhecimentos do nosso laboratório à sociedade.

Boletim da SBPMat: – Conte-nos um pouquinho sobre sua interação com o Brasil. Você vem frequentemente ao país para colaborações, eventos, uso de labs, seminários? Tem trabalhos realizados com grupos do Brasil ou em laboratórios brasileiros?

Galo Soler Illia: – Retornei à Argentina em 2003 e, imediatamente, tive como referencia o que estava se gestando no Brasil. Desde aquela época, comecei a desenvolver projetos no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que é um farol para todos aqueles que trabalhamos em Materiais na América Latina. A interação com o pessoal do síncrotron foi muito importante para podermos caracterizar nossos materiais, e é impressionante ver como as instalações têm melhorado nestes anos. Faz poucos meses, tive a oportunidade de conhecer o prédio do Sirius, que é simplesmente impressionante, e será referência mundial. Também tive a oportunidade de conhecer diversas universidades proferindo cursos e colaborando na formação de graduandos e estudantes de pós-graduação. Além disso, geramos a Escola de Síntese de Materiais, que fazemos em Buenos Aires, e que terá sua oitava edição em 2017. Essa escola foi idealizada para gerar uma comunidade de cientistas latino-americanos com competências na síntese racional de materiais. Começamos com muitos estudantes brasileiros, graças ao apoio da Sociedade Argentino-Brasileira de Nanotecnologia, que depois, infelizmente, parou de funcionar. É muito belo ver como os estudantes de ambos os países trabalham juntos nos laboratórios e discutem e apresentam seus trabalhos em “portunhol”. A partir dessa escola, e com ajuda de vários colegas, estão surgindo redes de colaboração que, sem dúvida, vão nos proporcionar a base tecnológica para fazermos empreendimentos conjuntos de maior porte. Viajo várias vezes por ano ao Brasil e sempre admiro a força do país para impulsionar o desenvolvimento tecnológico local. Espero que, passados estes momentos de dificuldades, possamos continuar crescendo em conjunto.

Boletim da SBPMat: – Sempre convidamos os entrevistados desta seção do boletim a deixarem uma mensagem para os leitores que estão iniciando suas carreiras científicas. O que você diria a esses cientistas juniores?

Galo Soler Illia: – Olhando para atrás, posso fazer três recomendações aos jovens cientistas. Uma é que nunca percam sua imaginação e sua capacidade de se fazerem perguntas; a segunda é que trabalhem duro para encontrar as respostas, e a terceira é que aproveitem as surpresas. Às vezes, a gente está treinado para desenvolver um caminho e uma estratégia e a gente foca no rigor de demonstrar e formalizar o que a gente encontra. Porém, é essencial saber que esse caminho que a gente traça é cheio de cantinhos interessantes, e que, às vezes, um aspecto que não levávamos em consideração nos abre um panorama novo e inexplorado. Dizia Newton que a gente, enquanto científico, é às vezes como uma criança que na praia acha uma concha mais bonita do que outras e é feliz, mas, perante a gente, estende-se o enorme oceano da verdade. Meu conselho é: busquemos incessantemente nossas conchas, curtamos com elas e aproximemo-nos da compreensão das maravilhas do nosso universo. E tenhamos sempre em conta que desenvolver ciência em nosso continente é um belo desafio que vai agregar riqueza a nossos países e bem-estar a nossos irmãos.

Participação da SBPMat em eventos na China e integração com sociedades asiáticas.

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Banner de um dos eventos na China que contou com presença da SBPMat.

A SBPMat (B-MRS), representada por seu presidente, Osvaldo Novais de Oliveira Junior, esteve presente em dois eventos realizados na China no mês de outubro, organizados por sociedades de pesquisa em Materiais da Ásia e também pela sociedade europeia de pesquisa em Materiais. Os eventos foram o 5th World Materials Summit on Advanced Materials for Sustainable Society Development e a IUMRS International Conference in Asia (IUMRS-ICA). O presidente da SBPMat viajou a convite da sociedade de pesquisa em Materiais da China (C-MRS) e da International Union of Materials Research Societies (IUMRS). Além de participar dos dois eventos, o professor fez parte do comitê assessor internacional do primeiro, e o professor Roberto Mendonça Faria, ex-presidente da SBPMat e segundo vice-presidente da IUMRS, fez parte dos comitês assessores internacionais de ambos os eventos.

“As sociedades de pesquisa em Materiais na Ásia têm despendido grandes esforços para integração entre si, e com sociedades de outros lugares do mundo”, comenta o presidente da SBPMat, destacando o trabalho das MRS da China, Japão, Coréia do Sul e Cingapura. “Já há vários anos uma relação muito próxima da SBPMat com essas sociedades, que estarão representadas no nosso próximo encontro em Gramado, de 10 a 14 de setembro de 2017”, completa.

O “summit” foi realizado em Rizhao, província de Shandong, de 18 a 20 de outubro, e foi organizado pelas sociedades de pesquisa em Materiais da China (C-MRS), Europa (E-MRS), Coreia (MRS-K) e Japão (MRS-J), além da Associação de Ciência e Tecnologia de Rizhao. Trata-se de um evento anual, no qual cientistas, políticos e empreendedores convidados pela organização se reúnem para apresentar e discutir o assunto dos materiais avançados para o desenvolvimento de uma sociedade sustentável, com foco em temas específicos em cada edição. Em 2016, os temas escolhidos foram energias renováveis, principalmente para veículos automotores, materiais para construção visando à sustentabilidade e materiais para engenharia oceanográfica.

De acordo com o professor Novais de Oliveira Junior, as conclusões mais relevantes do evento se referiram à necessidade de ações internacionais colaborativas, ressaltando-se o caráter único da Ciência e Engenharia de Materiais para resolver problemas cruciais da humanidade, graças à abordagem integrada, multifacetada e de sinergia entre experimento, teoria e simulação computacional que essa disciplina pode oferecer. Especificamente sobre os temas da quinta edição do evento, o presidente da SBPMat destacou a importância do desenvolvimento de baterias mais duráveis, de maior capacidade e seguras, e a necessidade de investigações sobre o mar e sobre materiais de construção civil. “A propósito, no “summit” foram apresentados dados de custos de manutenção de obras civis de grande porte, como pontes, viadutos e estradas, que apontam para uma grande demanda de materiais avançados, não só para reduzir os custos, mas também garantir sustentabilidade”, comenta o presidente da SBPMat. “Houve também excelentes apresentações de especialistas europeus a respeito da energia que se pode extrair de fontes renováveis no mar”, acrescenta. Conforme o professor, um documento com as principais conclusões do evento está sendo preparado pelos participantes.

O segundo evento foi realizado em Qingdao, também na província de Shandong, a cerca de 150 km de Rizhao, de 20 a 24 de outubro, com organização da C-MRS e da sociedade de pesquisa em Materiais de Taiwan (MRS-T). Consistiu, basicamente, de 4 palestras plenárias e 27 simpósios sobre materiais para energia e meio ambiente, materiais avançados estruturais e funcionais, materiais biológicos, e simulação, modelagem e caracterização de materiais.

Acordo SBPMat (B-MRS) – E-MRS: apoio à participação de sócios da SBPMat nos eventos da E-MRS.

dscn9405 dscn9400Um acordo de cooperação assinado pela SBPMat e a sociedade de pesquisa em Materiais da Europa (E-MRS) promove a colaboração científica entre pesquisadores do Brasil e da Europa e, em particular, incentiva a participação de membros da SBPMat nos eventos da E-MRS e de membros da E-MRS nos encontros da SBPMat.

“Segundo o acordo, sócios da SBPMat podem ser organizadores de simpósios do Encontro da E-MRS, função bastante prestigiosa para qualquer pesquisador, recebendo para tanto inclusive incentivo financeiro”, detalha o professor Osvaldo Novais de Oliveira Junior, presidente da SBPMat. “Além disso, estudantes e pós-doutorandos sócios da SBPMat podem a cada ano concorrer a apoio para apresentação de trabalho no Encontro da E-MRS na Europa”, completa.

O acordo foi assinado em Campinas (SP) no dia 29 de outubro deste ano, durante o encerramento do XV Encontro da SBPMat, pelo presidente da SBPMat e pelo professor Rodrigo Martins, que representou a sociedade europeia enquanto ex-presidente da mesma.

História da pesquisa em Materiais no Brasil: 40 anos do primeiro laboratório de pesquisa em vidros do Brasil.

box-lamavO primeiro laboratório do Brasil dedicado ao estudo dos materiais vítreos completa 40 anos neste mês de dezembro de 2016. Esse laboratório, que iniciou suas atividades com apenas um forninho tipo mufla de até 1.100 °C, hoje possui 18 fornos, 4 dois quais chegam aos 1.750 °C, e mais três dezenas de equipamentos de fabricação e caracterização de vidros distribuídos em 500 m2. O aniversariante em questão é o LaMaV (Laboratório de Materiais Vítreos), do DEMa (Departamento de Engenharia de Materiais) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

No 40º aniversário do LaMaV, a equipe se manifesta plenamente satisfeita com suas realizações [veja box ao lado]. O trabalho pioneiro do laboratório foi essencial na geração, disseminação e aplicação no país do conhecimento científico sobre vidros, tanto no meio acadêmico quanto na indústria. “Formamos aproximadamente uma centena de mestres, doutores e pós-docs, que hoje trabalham como professores e pesquisadores em instituições importantes como a USP, UFSCar, ITA, UEPG, UEMa, UFBa, PUC, IPT, CEFET, UFF, UNESP, UFLavras, UFABC, CTA, UNIOESTE e outras no Brasil e exterior, e em inúmeras empresas. Este é um legado importantíssimo! ”, destaca Edgar Dutra Zanotto, um dos fundadores da SBPMat e da revista Materials Research, que fundou o LaMaV e o lidera até o presente.

Mas os esforços e resultados do LaMaV vão além das fronteiras nacionais e se caracterizam por sua internacionalidade. O laboratório já recebeu estudantes e professores visitantes de dezenas de países. Sua equipe trouxe ao Brasil os mais importantes congressos internacionais sobre vidros, participa dos conselhos editoriais de quase todas as principais revistas científicas especializadas em materiais vítreos e recebeu 7 dos mais prestigiosos prêmios e honrarias internacionais da área – além de mais de 20 prêmios nacionais, incluindo o prêmio Almirante Álvaro Alberto*. As pesquisas do grupo, principalmente aquelas sobre nucleação e cristalização de vidros e vitrocerâmicas, são mundialmente reconhecidas. “Significativa fração dos pesquisadores ativos desta área já ouviu falar, assistiu uma palestra ou leu um artigo ou patente resultante das nossas pesquisas. Certamente colocamos a cidade de São Carlos e o Brasil no mapa mundial da pesquisa em vidros! ”, diz Zanotto.

Atualmente, o LaMaV atua intensamente nos temas de cristalização de vidros, processos de relaxação estrutural e de tensões residuais, vitrocerâmicas, biomateriais, além de propriedades mecânicas, reológicas, elétricas e bioquímicas dos materiais vítreos. “Hoje temos um ótimo laboratório e um excelente financiamento, principalmente da FAPESP, mas também da Capes, CNPq e algumas empresas. Entretanto, a enorme burocracia das agências de fomento relativa à aquisição de materiais e equipamentos e na prestação de contas, as incertezas relativas ao futuro das universidades (por exemplo, PEC 55 e outras), aliadas à escassez de secretárias, técnicos e engenheiros (lab managers) que auxiliem na organização e manutenção dos laboratórios, sempre foram e continuam sendo empecilhos formidáveis”, pondera Zanotto.

A história

Tudo começou em 15 de dezembro de 1976, quando Zanotto foi contratado como professor auxiliar pelo DEMa-UFSCar com o intuito principal de iniciar o trabalho de pesquisa sobre vidros no departamento.  Em 1970, tinha sido lançado o primeiro curso do Brasil (e da América Latina) de graduação em Engenharia de Materiais e, dois anos depois, o DEMa tinha sido criado. Em 1976, o departamento já contava com grupos de pesquisa em metais, polímeros e cerâmicas, mas ninguém trabalhava ainda com vidros, lembra Zanotto, atualmente professor titular do DEMa-UFSCar. “A criação do LaMaV foi uma consequência natural do estabelecimento do curso de graduação em Engenharia de Materiais na UFSCar”, diz o professor.

Nesse fim de 1976, Edgar Zanotto era um engenheiro de materiais recém-formado (pela própria UFSCar), que acabara de concluir um trabalho de iniciação científica sob a orientação do professor visitante Osgood James Whittemore, da Universidade de Washington (EUA), pesquisador da área de materiais cerâmicos. “Minha pesquisa de IC, realizada naquele ano, focalizou a durabilidade química (lixiviação) de vidros candidatos ao encapsulamento de resíduos radioativos”, relata Zanotto. “E, pasme, este assunto ainda é “quente”! ”, completa.

Assim que foi contratado, Zanotto criou o LaMaV. Os primeiros experimentos, realizados pelo próprio Zanotto, consistiam em fundir vidros de baixo ponto de fusão, usando o forno tipo mufla e um cadinho (recipiente que pode ser usado em altas temperaturas) de platina, emprestado do laboratório de análises químicas da universidade.

Em 1977, o fundador do LaMaV iniciou o mestrado em Física no Instituto de Física e Química de São Carlos (IFQSC) da USP, sob a orientação do professor Aldo Craievich, que era, provavelmente, o único cientista atuante na área de vidros antes de 1976. De fato, ele é o autor dos dois primeiros artigos científicos sobre vidros assinados por pesquisadores de instituições brasileiras, ambos publicados em 1975. Durante o mestrado, Zanotto produzia vidros e os tratava termicamente (para gerar cristalização) no LaMaV, fazia averiguação por microscopia no laboratório de metalurgia do DEMa, e caracterizava os vidros por DRX e SAXS no IFQSC da USP. Em um ano e meio de mestrado, Zanotto terminou seu trabalho de pesquisa e defendeu a dissertação. No mesmo ano, ele iniciou o doutorado, também na área de vidros, na Universidade de Sheffield (Reino Unido), com orientação do famoso professor Peter James. Em 1982, Zanotto voltava ao LaMaV com doutorado defendido.

“Nos 10-15 anos iniciais, o trabalho isolado, a inexperiência e as incertezas e dificuldades associadas ao financiamento inconstante das pesquisas, mais o reduzido espaço físico e pouca infra laboratorial atrapalharam as nossas atividades”, relata Zanotto. Cerca de uma década depois da criação do laboratório, foi contratado o segundo professor do grupo, Oscar Peitl Filho, ex-orientado de mestrado e doutorado de Zanotto. Alguns anos depois, Ana Candida Martins Rodrigues se tornou a terceira professora da equipe do LaMaV. Finalmente, em 2013, Marcello Andreeta foi contratado. “Hoje somos 4 professores, 1 técnico, 1 assistente administrativa e cerca de 30 alunos de pesquisa e post-docs, 7 de outros países”, diz Zanotto.

O ano de 2013 foi um marco na história do LaMaV, devido à aprovação e início de atividades do CeRTEV (Center for Research, Technology and Education in Vitreous Materials), um CEPID da FAPESP. Dirigido por Zanotto, o CeRTEV reúne o LaMaV (sede do centro) e outros laboratórios da UFSCar, USP e UNESP, para realizar pesquisa, desenvolvimento e atividades de educação na área de materiais vítreos, contando com financiamento da FAPESP até 2024. “Com o CeRTEV, estabelecemos um dos maiores grupos de pesquisa acadêmicos deste planeta sobre vidros, com infraestrutura de nível internacional, 14 professores e cerca de 60 alunos de pesquisa! “, comemora Zanotto.

“Apenas divagando, se eu pudesse retornar a dezembro de 1976, com a experiência acumulada nesses 40 anos, acho que faria tudo novamente, mas mais eficientemente! ”, expressa o fundador do LaMaV.

Estudantes de doutorado de 28 países participam da "Glass and glass-ceramics school" no LaMaV em agosto de 2015.
Estudantes de doutorado de 28 países participam da “Glass and glass-ceramics school” no LaMaV em agosto de 2015.

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*Veja também nossa entrevista com o professor Edgar Dutra Zanotto, realizada em abril de 2013, na ocasião do Prêmio Almirante Álvaro Alberto, aqui.

Artigo em destaque: Muita ciência e uma dose de acaso para chegar à receita de um nanocompósito multifuncional.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: One material, multiple functions: graphene/Ni(OH)2 thin films applied in batteries, electrochromism and sensors. Eduardo G. C. Neiva, Marcela M. Oliveira, Márcio F. Bergamini, Luiz H. Marcolino Jr & Aldo J. G. Zarbin. Scientific Reports 6, 33806 (2016). doi:10.1038/srep33806. Link para o artigo: http://www.nature.com/articles/srep33806

 

Muita ciência e uma dose de acaso para chegar à receita de um nanocompósito multifuncional

boxnioh2Artigo recentemente publicado no periódico científico Scientific Reports, do grupo Nature, reporta um estudo realizado em universidades do estado do Paraná (Brasil) sobre um material baseado no hidróxido de níquel Ni(OH)2 – composto de grande interesse tecnológico [ver box ao lado]. A equipe de autores desenvolveu um método inovador para fabricar um material formado por grafeno e nanopartículas de hidróxido de níquel, fez filmes finos com esse material e demonstrou a eficiência desses filmes quando usados como eletrodos de baterias recarregáveis, sensores de glicerol e materiais eletrocrômicos.

O trabalho foi realizado dentro da pesquisa de doutorado de Eduardo Guilherme Cividini Neiva, sob orientação do professor Aldo José Gorgatti Zarbin, no Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Neiva começou a realizar trabalhos de pesquisa sobre nanopartículas de níquel na graduação, orientado pelo professor Zarbin. No mestrado, ainda com Zarbin, o estudante desenvolveu uma rota de preparação de nanopartículas de níquel metálico para aplicações eletroquímicas. Finalizado o mestrado, Neiva e Zarbin se propuseram a dar continuidade à pesquisa no doutorado de Neiva, incluindo o grafeno na preparação das nanopartículas de níquel metálico para obter nanocompósitos de níquel e grafeno com propriedades diferenciadas. “A maior parte dos meus interesses científicos estão voltados na preparação de materiais com nanoestruturas de carbono, como nanotubos e grafeno”, contextualiza o professor Zarbin, que assina o artigo da Scientific Reports como autor correspondente.

Os primeiros trabalhos no laboratório já surpreenderam a dupla. Na presença do óxido de grafeno (usado como precursor do grafeno na preparação do material), o processo tomava um rumo diferente. Nesse momento, Neiva e Zarbin enxergaram o potencial dessas particularidades: se bem compreendidas, poderiam ser controladas e utilizadas para preparar nanocompósitos, não apenas de níquel metálico, mas também de hidróxido de níquel, o que abriria novas possibilidades de aplicação. “Há uma frase que gosto muito, do Louis Pasteur, que se aplica perfeitamente nesse caso: “o acaso favorece as mentes bem preparadas””, diz Zarbin.

Partindo dessa base, orientando e orientador criaram um processo simples e direto para fabricação de nanocompósitos de grafeno e hidróxido de níquel. Nesse processo inovador, ambos os componentes são sintetizados em conjunto, em uma única reação de apenas uma etapa. Usando essa técnica, Neiva fabricou os nanocompósitos. Amostras de hidróxido de níquel puro também foram produzidas, para poder compará-las com os nanocompósitos.

As amostras foram estudadas por meio de uma série de técnicas: difração de raios X, espectroscopia Raman, espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FT-IR), termogravimetria, microscopia eletrônica de varredura com emissão de campo (FEG-MEV), e também por meio de imagens de microscopia eletrônica de transmissão (TEM) realizadas pela professora Marcela Mohallem Oliveira, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). A comparação entre os dois materiais foi favorável ao nanocompósito. “O grafeno teve papel fundamental na estabilização das partículas em escala nanométrica, no aumento da estabilidade química e eletroquímica das nanopartículas, e no aumento da condutividade do material, fundamental para uma melhora nas aplicações desejadas”, comenta Aldo Zarbin.

Aldo José Gorgatti Zarbin (à esquerda de quem olha) e Eduardo Guilherme Cividini Neiva, autores principais do trabalho, no equipamento FEG-MEV do Grupo de Química de Materiais da UFPR.
Aldo José Gorgatti Zarbin (à esquerda de quem olha) e Eduardo Guilherme Cividini Neiva, autores principais do trabalho, no equipamento FEG-MEV do Grupo de Química de Materiais da UFPR.

A etapa seguinte consistiu no processamento dos nanocompósitos e das nanopartículas de hidróxido de níquel puro para obter filmes finos, formato que possibilita seu uso nas aplicações desejadas. “Depositar materiais na forma de filmes, recobrindo diferentes superfícies, é um desafio tecnológico imenso, que se torna maior e mais desafiador quando se trata de materiais multicomponentes e materiais insolúveis, infusíveis e intratáveis (todas características do material reportado nesse artigo)”, explica Zarbin.

Para superar esse desafio, Neiva utilizou uma rota de processamento, chamada de método interfacial líquido/líquido, desenvolvida em 2010 pelo grupo de pesquisa liderado por Zarbin, o Grupo de Química de Materiais da UFPR. Essa rota, além de ser simples e barata, afirma o professor Zarbin, permite depositar materiais complexos na forma de filmes homogêneos e transparentes sobre vários tipos de materiais, incluindo plásticos. “Essa rota se baseia na alta energia existente na interface de dois líquidos imiscíveis (água e óleo, por exemplo), onde o material é inicialmente estabilizado para minimizar essa energia, possibilitando sua posterior transferência para substratos de interesse”, detalha o cientista.

Com os nanocompósitos, Neiva obteve filmes finos transparentes de cerca de 100 a 500 nm de espessura, com nanopartículas de cerca de 5 nm de diâmetro homogeneamente distribuídas sobre as folhas de grafeno. O hidróxido de níquel puro, diferentemente, gerou filmes formados por nanopartículas esféricas porosas de 30 a 80 nm de diâmetro, distribuídas de modo heterogêneo, formando aglomerados em algumas regiões.

Na fase final do trabalho, os filmes depositados sobre vidro e ITO (óxido de índio e estanho), foram testados em três aplicações, nas quais o nanocompósito teve desempenho superior ao hidróxido de níquel puro.  Enquanto material para eletrodos de baterias alcalinas recarregáveis, o nanocompósito apresentou alta energia e alta potência – dois pontos positivos que não é fácil encontrar num mesmo material. O nanocompósito também demonstrou uma boa performance como sensor eletroquímico. De fato, experimentos idealizados pelos professores Márcio Bergamini e Luiz Marcolino Jr, também da UFPR, mostraram que o nanocompósito é um sensor sensível de glicerol (composto conhecido comercialmente como glicerina e usado em várias indústrias). Finalmente, o nanocompósito agiu como eficiente material eletrocrômico. Com essas características, os filmes do grupo da UFPR têm chances sair do laboratório e fazer parte de produtos inovadores. “Isso depende de parceiros que se interessem em escalonar o método e testar em dispositivos reais”, diz Zarbin.

Por enquanto, além de artigos científicos como o publicado na revista Scientific Reports, o trabalho gerou várias patentes, tanto sobre o método de deposição dos filmes finos quanto sobre suas aplicações em sensores de gases, eletrodos transparentes, dispositivos fotovoltaicos e catalisadores. “E já desenvolvemos uma bateria flexível, que só foi possível graças à técnica de deposição de filmes que desenvolvemos”, complementa o professor Zarbin.

O trabalho, que foi desenvolvido dentro dos projetos macro “INCT de nanomateriais de carbono” e “Núcleo de Excelência em Nanoquímica e Nanomateriais”, contou com financiamento das agências federais Capes e CNPq, e da Fundação Araucária, de apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico do estado do Paraná.

 

Esta figura, enviada pelos autores do paper, condensa as principais contribuições do trabalho. No centro, um balão com dois líquidos e o filme na interface representa o método de processamento de filmes finos. À esquerda consta um esquema do filme, com as nanopartículas de hidróxido de níquel sobre a folha de grafeno. Logo à direita do balão, uma fotografia do filme depositado sobre um substrato de quartzo mostra a homogeneidade e transparência do filme (é possível ler um texto que está debaixo dele). Finalmente, à direita, de cima pra baixo, as três aplicações são mostradas através de uma curva de descarga (bateria), de uma curva de variação de transmitância pelo potencial aplicado (eletrocromismo) e de uma curva analítica mostrando a variação linear da intensidade da corrente em função da concentração de glicerol no meio (sensor).

 

XVI Encontro da SBPMat/B-MRS Meeting: de 10 a 14 de setembro de 2017 em Gramado (RS).

O próximo evento anual da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Materiais (XVI Encontro da SBPMat/ XVI B-MRS Meeting), que será realizado na cidade de Gramado (RS), ocorrerá de 10 a 14 de setembro de 2017 (e NÃO de 24 a 28 de setembro de 2017 como divulgado anteriormente).

Em breve, mais informações!