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Uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) desenvolveu um biossensor de baixo custo capaz de detectar anticorpos da Covid-19 em cerca de 30 minutos e com alta sensibilidade. O sistema mostrou-se promissor para produzir dispositivos portáteis e descartáveis que possam ser usados para diagnosticar a infecção por coronavírus ou, ainda, para confirmar a produção de anticorpos após a vacinação usando apenas algumas gotas de sangue.
Biossensores são sistemas que possuem um elemento biológico (neste caso, a proteína N do vírus SARS-CoV-2) responsável por interagir quimicamente com aquilo que se deseja detectar (neste caso, o anticorpo específico para esse antígeno). Quando a interação ocorre, a reação química é transformada no dispositivo em um sinal interpretável.
O biossensor desenvolvido na UFPR se baseia em uma malha de aço inoxidável revestida com um material híbrido, formado por um polímero que conduz eletricidade (o polipirrol) e nanopartículas de ouro. Nessas nanopartículas, as proteínas do vírus são imobilizadas, de modo que os anticorpos das amostras de sangue, se houver, entram em contato com os seus antígenos, reagem espontaneamente com eles e se tornam detectáveis.
Combate à pandemia
A ideia do trabalho surgiu no início da pandemia de Covid-19, quando a sociedade sentiu a necessidade imperiosa de contar com sistemas capazes de detectar tanto o vírus quanto os anticorpos gerados pela infecção. Nesse momento, os professores Dênio Souto e Marcio Vidotti, da UFPR, decidiram reunir as suas expertises em sensores e temas afins para participar desses esforços mundiais.
“De início já sabíamos que a urgência e a multidisciplinaridade do assunto aumentariam o nosso desafio”, diz Bruna M. Hryniewicz, primeira autora do artigo que reporta esta pesquisa no periódico Materials Today Chemistry. Bruna participou da pesquisa durante o seu doutorado, ainda em andamento, sob orientação do professor Vidotti, ambos do Grupo de Pesquisa em Macromoléculas e Interfaces da UFPR.
A proposta foi construir um sistema de detecção de anticorpos baseado na tese de doutorado de Ana Leticia Soares, que acabava de ser defendida pela UFPR. Com orientação dos professores Marcio Vidotti e Luis Fernando Marchesi, o trabalho resultou numa plataforma formada por um polímero condutor modificado com nanopartículas de ouro que apresentou respostas promissoras ao ser unida a diversos pares de antígenos e anticorpos.
Mais sensibilidade e seletividade

Partindo dessa plataforma, a equipe investigou algumas questões que poderiam melhorar a sensibilidade e seletividade do biossensor – parâmetros que permitem diminuir a quantidade de falsos positivos e negativos nos resultados da detecção, inclusive em pequenas quantidades de amostra.
Nesse sentido, os autores sintetizaram e caracterizaram duas morfologias de polipirrol para produzir o material híbrido, a globular e a nanotubular, e verificaram que o biossensor de nanotubos poliméricos tinha uma sensibilidade oito vezes maior para detectar os anticorpos do que o sistema com polipirrol globular.
Outro ponto importante foi a escolha do método de imobilização da proteína N nas nanopartículas. Os pesquisadores optaram por promover uma ligação covalente (ligação química baseada no compartilhamento de pares de elétrons entre os átomos envolvidos), a qual traz mais estabilidade e sensibilidade ao sistema. De fato, essa metodologia posiciona o antígeno em uma orientação na qual os sítios de interação com o anticorpo ficam disponíveis – interação que é ainda mais incentivada pelo ambiente químico favorável propiciado pelo polipirrol. “Todas essas características permitem que o biossensor apresente respostas satisfatórias de sensibilidade e seletividade”, afirma Jaqueline Volpe, também primeira autora do artigo, que participou da pesquisa durante seu mestrado, sob orientação do professor Dênio Souto, ambos do Laboratório de Espectrometria, Sensores e Biossensores.
Além da participação de docentes, pós-docs e alunos do Programa de Pós-Graduação em Química da UFPR, foi fundamental na pesquisa a colaboração de pesquisadores e médicos da UFPR e do Hospital Erasto Gaertner, de Curitiba. Esses colaboradores forneceram rapidamente a proteína N do SARS-CoV-2. Eles também conseguiram amostras de sangue de pessoas com e sem Covid-19 que tinham feito exames de PCR (a metodologia de diagnóstico considerada mais segura), as quais foram usadas para testar o desempenho do biossensor.
“Levando em consideração que o trabalho foi realizado durante o auge da pandemia, os desafios foram inúmeros, desde o acesso aos laboratórios, até a exploração de um tema de alta relevância, o qual gera maior pressão no desenvolvimento da pesquisa”, comenta Larissa Bach Toledo, coautora do artigo.

De acordo com as autoras, o biossensor desenvolvido é promissor para uso em larga escala no diagnóstico de infectados e no monitoramento de anticorpos devido ao método simples e escalável de fabricação dos eletrodos (síntese em batelada), somado ao baixo custo da matriz de aço inox e à alta sensibilidade do sistema. Contudo, para produzi-lo comercialmente, seria necessário fazer muitos mais testes de validação com amostras reais, bem como transformar o sistema em um dispositivo simples, miniaturizado e fácil de usar, no qual os resultados da detecção possam ser interpretados por qualquer pessoa.
Esta pesquisa contou com financiamento da fundação alemã Alexander von Humboldt, da UFPR por meio do edital Proind 2020 e das agências brasileiras CAPES e CNPq. O trabalho também recebeu apoio do INCTBio, do qual o professor Marcio Vidotti faz parte.

Referência do artigo científico: Development of polypyrrole (nano)structures decorated with gold nanoparticles toward immunosensing for COVID-19 serological diagnosis. B. M. Hryniewicz, J. Volpe, L. Bach-Toledo, K. C. Kurpel, A. E. Deller, A. L. Soares, J. M. Nardin, L. F. Marchesi, F. F. Simas, C. C. Oliveira, L. Huergo, D. E. P. Souto, M. Vidotti. Materials Today Chemistry. Volume 24, June 2022, 100817. https://doi.org/10.1016/j.
Contato dos autores correspondentes: denio.souto@ufpr.br e mvidotti@ufpr.br.
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Conhecido como água oxigenada na sua versão diluída e farmacêutica, o peróxido de hidrogênio (H2O2) é um composto amplamente utilizado, sobretudo como alvejante ou antisséptico na produção de papel e celulose, em produtos de limpeza e beleza e no tratamento de águas residuais, entre outras aplicações. Com um mercado grande e crescente, a produção de peróxido de hidrogênio tem o desafio de se tornar mais sustentável, usando métodos que sejam amigos do meio ambiente e que permitam que o composto seja obtido no mesmo local em que será usado, diminuindo os riscos, custos e impacto ambiental do transporte. Nesse cenário, produzir peróxido de hidrogênio em geradores eletroquímicos usando basicamente água, ar e eletricidade é um caminho promissor, que, inclusive, algumas empresas já estão trilhando. Todavia, o sucesso desse processo depende, em grande parte, de contar com catalisadores eficientes, estáveis e de baixo custo.
Em artigo científico recentemente publicado, uma equipe formada por pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), e Instituto de Química de São Carlos (IQSC-USP) fez uma contribuição nesse sentido. Eles desenvolveram catalisadores baseados em nanofitas de grafeno e nanopartículas metálicas e estudaram em detalhe o seu desempenho na produção eletroquímica de peróxido de hidrogênio. Além de mostrar que esses catalisadores melhoram significativamente a eficiência da reação, equiparando-se aos melhores catalisadores convencionais em alguns aspectos, o estudo avançou a compreensão de fenômenos fundamentais que abrem possibilidades para continuar otimizando a obtenção eletrocatalítica de peróxido de hidrogênio.

“Propusemos a síntese de catalisadores com baixo teor de metal nobre (≤6,4 % em massa), com alta eficiência catalítica e alta durabilidade para a produção eletroquímica de H2O2”, diz o professor Gilberto Maia (UFMS), coautor do artigo. De fato, metais nobres, como o ouro e o paládio, são conhecidos pelas suas propriedades catalíticas, mas têm a desvantagem do custo. “Nossos catalisadores foram construídos a partir de óxidos de molibdênio, ouro e paládio, que juntos formam nanopartículas ancoradas na superfície de nanofitas de grafeno”, descreve Maia.
A equipe testou a eficiência dos catalisadores com relação à geração de peróxido de hidrogênio por meio da reação de redução de oxigênio via dois elétrons (RRO-2e-), na qual uma molécula de oxigênio, dois cátions hidrogênio e dois elétrons formam uma molécula desse composto. Principalmente, os pesquisadores testaram, com resultados muito positivos, a atividade do catalisador (a sua capacidade de aumentar a velocidade da reação), a sua seletividade (a sua habilidade de direcionar a reação para um determinado produto, neste caso, o peróxido de hidrogênio) e a sua estabilidade (a capacidade de manter as suas propriedades ao longo do tempo).
“Os resultados obtidos mostraram que a atividade catalítica melhorada para RRO-2e- foi promovida por uma combinação de fatores incluindo geometria, teor de paládio, distância entre partículas e efeitos de bloqueio de sítios ativos, enquanto que a estabilidade eletroquímica dos catalisadores pode ter sido aprimorada pela presença de molibdênio”, diz o professor Maia.
O trabalho se desenvolveu dentro da colaboração entre pesquisadores do Instituto de Química da UFMS e do Grupo de Pesquisa de Eletroquímica Ambiental do IQSC-USP, os quais vêm trabalhando em conjunto na síntese, caracterização e aplicação de materiais eletrocatalíticos. De acordo com os autores, a ideia principal e as primeiras combinações de síntese envolvendo os metais utilizados surgiram como desdobramento da tese de doutorado de Guilherme Fortunato, que teve orientação do professor Gilberto Maia e foi defendida pela UFMS em 2019. O trabalho teve continuidade e finalização dentro do pós-doutorado de Fortunato, realizado no IQSC sob supervisão do professor Marcos Lanza.
A pesquisa contou com financiamento das agências brasileiras federais e estaduais Capes, CNPq, FAPESP e FUNDECT-MS.

Referência do artigo científico: Using Palladium and Gold Palladium Nanoparticles Decorated with Molybdenum Oxide for Versatile Hydrogen Peroxide Electroproduction on Graphene Nanoribbons. Guilherme V. Fortunato, Leticia S. Bezerra, Eduardo S. F. Cardoso, Matheus S. Kronka, Alexsandro J. Santos, Anderson S. Greco, Jorge L. R. Júnior, Marcos R. V. Lanza, and Gilberto Maia. ACS Applied Materials & Interfaces 2022 14 (5), 6777-6793. DOI: 10.1021/acsami.1c22362.
Contato dos autores correspondentes: g.fortunato@usp.br e gilberto.maia@ufms.br.
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Foi na iniciação científica que Edson Roberto Leite, hoje diretor científico do LNNano, começou a trabalhar com pesquisa em sinterização. Na época ele era aluno de Engenharia de Materiais da UFSCar e o seu orientador era o professor José Arana Varela, destacado cientista de materiais falecido em 2016, que foi sócio fundador e presidente da SBPMat.
Utilizada desde a Antiguidade, a sinterização é um processo de aglutinação de partículas sólidas que resulta em um material compacto. Nesse processo, os espaços entre as partículas ou grãos (os poros) vão sendo preenchidos por átomos que se desprendem da superfície do material.
“Sempre fui muito ligado nesse tema e curioso para saber como é o transporte a nível atômico durante o processo de sinterização”, relembra Edson Leite.
Mais de trinta anos depois desse primeiro trabalho científico, Leite acalmou essa curiosidade. Junto a outros pesquisadores do LNNano, ele conseguiu visualizar, em tempo real e com resolução atômica, o processo de eliminação de poros em uma cerâmica de óxido de zircônio nanométrica. O trabalho foi recentemente publicado no prestigiado periódico científico Nano Letters.
“Com certeza o Prof. Varela iria se orgulhar e gostar deste trabalho”, diz Leite, que, aliás, recebeu o Prêmio José Arana Varela da SBPMat no ano passado em reconhecimento à sua trajetória científica.
Para chegar à publicação do artigo, o primeiro passo foi dado quatro anos atrás, quando Leite e a sua equipe desenvolveram uma metodologia que permitiu preparar monocamadas de nanopartículas auto suportadas (sem substrato). Quando levaram esses finíssimos filmes a um microscópio eletrônico de transmissão (TEM), os pesquisadores notaram que o feixe de elétrons induzia o transporte de átomos, mesmo a temperatura ambiente. A equipe enxergou então a possibilidade de estudar o processo de sinterização in situ. Isto é, poder acompanhar no microscópio as mudanças no preenchimento dos poros, passo a passo e sem precisar retirar a amostra no meio do processo.
A possibilidade tomou forma no TEM de alta resolução do LNNano, um HRTEM, que permite visualizar átomos. “Montamos um time formado pelo Jefferson Bettini (pesquisador do LNNano), minha pós-doc Tanna Rodrigues Fiuza e o Marlon Muniz da Silva (estagiário do LNNano e hoje aluno de doutorado no LNLS) e começamos a trabalhar duramente para visualizar a sinterização em escala atômica”, conta Leite.

Inicialmente, a equipe preparou filmes cerâmicos formados por grãos nanométricos de óxido de zircônio e focou os esforços em estudar o processo que ocorre no final da sinterização: a eliminação dos poros isolados que ficam nos contornos dos grãos.
O trabalho foi tão instigante quanto desafiador, não apenas pelas horas passadas ao microscópio na coleta, tratamento e análise de imagens, mas principalmente pelo esforço dos pesquisadores para compreender o que estavam vendo. “No final fomos bastante felizes e demonstramos quais as transformações que ocorrem durante o fechamento dos poros em escala atômica”, conta Leite.
Neste vídeo, filmado pelos autores do artigo usando o HRTM, é possível visualizar átomos migrando dos grãos adjacentes e preenchendo o poro:
O trabalho deve ter um importante impacto acadêmico, já que seus resultados mostram que a realidade das cerâmicas nanométricas não se encaixa, em alguns aspectos, nos modelos teóricos que são utilizados para explicar processos de sinterização. “A maioria dos modelos existentes envolvendo a cinética de sinterização considera a energia superficial e a energia dos contornos de grão isotrópicos. Nós mostramos que isso não ocorre em cerâmicas nanométricas”, explica o professor Leite. “Além disso, mostramos que ocorre uma transição em que uma superfície rugosa é eliminada e que ocorre o aparecimento de superfícies facetadas, indicando que possa existir uma barreira termodinâmica, além de uma barreira cinética para o transporte atômico”, completa. “Em resumo, podemos dizer que é necessário modificar os modelos existentes para explicar o processo de sinterização em nanoescala”, conclui o cientista.
De acordo com os autores, o trabalho também deve ter um impacto na indústria cerâmica, já que a melhor compreensão do processo de sinterização pode levar ao desenvolvimento de cerâmicas nanoestruturadas com porosidade e tamanho de partícula controlados e, portanto, com propriedades mecânicas e eletrônicas diferenciadas.
Referência do artigo científico: Visualization of the Final Stage of Sintering in Nanoceramics with Atomic Resolution. Tanna Elyn Rodrigues Fiuza, Marlon Muniz da Silva, Jefferson Bettini, and Edson Roberto Leite. Nano Lett.2022, 22, 1978 – 1985. https://doi.org/10.1021/acs.
Contato do autor: edson.leite@lnnano.cnpem.br

[Texto do professor Petrus Santa Cruz (DQF/UFPE), sócio da SBPMat]
Difícil avaliar os impactos indiretos da pandemia de Covid-19, e mais difícil ainda é receber, ainda a essa altura, notícias das vítimas diretas, como a de um colaborador de longa data, Hernán Valenzuela, que nos deixou no dia 7 deste mês de março.
Como representante sênior do Instituto Fraunhofer ENAS (Fraunhofer-Instituts für Elektronische Nanosysteme ENAS) na América Latina, há quase 20 anos Hernán passou a reunir pesquisadores envolvidos em aplicações de novos materiais em nanotecnologias nos Minapim Seminar, série bienal da qual Hernán foi chairman desde sua primeira edição em 2004, juntamente com a criação da MTM Minapim News Technology Magazine, iniciativas apoiadas inicialmente pela Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA). Na edição de 2018 do Minapim Seminar, houve destaque para a consolidação do acordo de cooperação internacional do Instituto Fraunhofer ENAS e a UFPE, tendo interagido em eventos envolvendo novas tecnologias desde os primeiros eventos internacionais na área, desde em 2003 na Nanofair (Suíça) e NanoTech (Japão).
Em 2013 deu suporte para realização do Workshop do Biotério de Espécies Nanoestruturadas BEN da UFPE na sede da SUFRAMA (Manaus), envolvendo discussões sobre Biodiversidade e Bioinspiração, no âmbito do Projeto Capes Nanobiotec Brasil.
Fruto das colaborações catalisadas por Hernán, em março de 2020 uma equipe incluindo o Diretor Presidente do Fraunhofer ENAS à época, Dr. Thomas Otto, esteve na Ponto Quântico Nanodispositivos (Positiva, LandFoton/UFPE), ocasião em que a Ponto Quântico passou a ser o Hub do Acordo de Cooperação do Fraunhofer ENAS com a UFPE, tendo a equipe sido recebida pelo Reitor Alfredo Gomes, alguns dias antes do lockdown do campus Recife, quando a OMS declarou o início da pandemia em curso.
Hernán, que era sociólogo, deixa esposa, quatro filhos, cinco netos e muitos amigos, vários deles de nossa comunidade científica.
Prof. Petrus Santa Cruz (DQF/UFPE)
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Assim como os outros setores da economia, a construção civil enfrenta um importante desafio: o de reduzir progressivamente as emissões de gases do efeito estufa e se tornar cada vez mais sustentável. Nesse sentido, existem esforços na comunidade científica para desenvolver materiais de construção que tenham impacto ambiental positivo em todas as fases da edificação, começando pela extração das matérias-primas, passando pelo uso dos prédios e chegando à reciclagem dos resíduos no final da vida útil da obra. Para isso, uma das estratégias que vêm sendo exploradas é a incorporação de matérias-primas naturais, como a terra crua e a biomassa, aos materiais de construção.
Em artigo recentemente publicado no periódico Construction and Building Materials, uma equipe científica brasileira reporta o desenvolvimento e estudo de argamassas baseadas em terra crua e resíduos de biomassa vegetal (partículas de bambu) com potencial para uso como reboco de paredes internas. Além de analisar as propriedades dessas argamassas, os autores avaliaram seu impacto ambiental, principalmente com relação às emissões de dióxido de carbono envolvidas na sua preparação, uso e descarte.
“A principal contribuição deste trabalho é evidenciar a viabilidade da produção de argamassas baseadas em recursos naturais localmente disponíveis (terra crua e biomassa vegetal – bambu) na construção de um portfólio de soluções construtivas de baixo carbono e de baixo consumo energético”, diz Romildo Dias Toledo Filho, professor do Programa de Engenharia Civil da Coppe, o instituto de pós-graduação e pesquisa em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), quem liderou o trabalho.
Para produzir as argamassas, a equipe científica utilizou terra crua, partículas de bambu, cal hidratada, cimento Portland e areia natural, entre outros ingredientes. As partículas de bambu foram obtidas a partir de resíduos do setor moveleiro do estado do Rio de Janeiro e processadas para obter fibras de algumas centenas de micrômetros de diâmetro e até 2 cm de comprimento.

A pesquisa mostrou bons resultados para as argamassas de terra e bambu e explicitou o peso de cada fator nas emissões de carbono envolvidas, apontando caminhos para reduzi-las ainda mais. As argamassas de terra, principalmente aquela com maior proporção de bambu, apresentaram emissões menores do que as convencionais devido ao estoque de carbono do bambu. De fato, vegetais da biomassa extraem dióxido de carbono da atmosfera por meio da fotossíntese e o utilizam para crescer. Quando essa biomassa é incorporada a uma argamassa, o carbono permanece armazenado e a sua emissão é evitada. Esse ganho ambiental se potencializa quando os resíduos do processamento de biomassa são aproveitados como fonte de matéria-prima, como ocorreu no trabalho da Coppe.
Além disso, os testes de densidade, condutividade térmica e resistência mostraram que as argamassas de terra com bambu, principalmente a que continha 6% de biomassa, podem ter um desempenho muito bom como reboco de paredes internas de prédios, por ter aderência e resistência adequadas e melhorar a eficiência energética dos ambientes. “As argamassas de terra que incorporam biomassa vegetal apresentam a peculiaridade da porosidade aberta, e essa característica confere às mesmas o potencial de atuar como revestimento e material passivo de regulação higrotérmica do microclima interno dos ambientes, tornando-os mais salubres, proporcionando melhores condições de saúde aos ocupantes e diminuindo o consumo de energia para climatização artificial da edificação”, explica o professor Romildo.
O trabalho foi desenvolvido dentro do doutorado em Engenharia Civil de Rayane de Lima Moura Paiva, com financiamento do CNPq e FAPERJ e orientação do professor Romildo e do professor Lucas Rosse Caldas. O estudo faz parte de uma linha de pesquisa em argamassas de terra e biomassa que está em andamento no Núcleo de Materiais Sustentáveis da Coppe em parceria com um grupo da ETH Zürich (Suíça).

A Profa. Ana Flavia Nogueira (UNICAMP), sócia da SBPMat, tornou-se editora associada de dois importantes periódicos da Royal Society of Chemistry: Materials Advances e Journal of Materials Chemistry C.
Na SBPMat, a cientista foi eleita membro titular do Conselho Deliberativo, com mandato de 2022 a 2026.