Nascido no Equador, Ivan Guillermo Solórzano-Naranjo desenvolveu sua formação e carreira científica em vários lugares do mundo. Cursou Engenharia Mecânica na Escuela Politecnica Nacional em Quito, Equador, Engenharia Metalúrgica na Université Catholique de Louvain, na Bélgica, e gradou-se pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) no Brasil. Realizou seu mestrado em Engenharia Metalúrgica e de Materiais também na PUC-Rio e doutorou-se em Ciência de Materiais pela McMaster University, no Canadá. Desenvolveu pesquisas de pós-doutorado no Max-Planck Institute – campus Sttutgart, na Alemanha, e foi professor visitante no Institut National Politechnique de Grenoble (França), no Massachusetts Institute of Technology (MIT) e na Stanford University (EUA). É professor no Departamento de Ciência de Materiais e Metalurgia da PUC-Rio.
Entrevistado aqui por seu ter sido um dos principais participantes do processo de criação da SBPMat, Solórzano presidiu nossa sociedade enquanto presidente fundador de 2001 a 2003 e hoje é um de seus conselheiros titulares. O pesquisador foi também presidente do Inter American Committee of Societies For Electron Microscopy (CIASEM) e da Sociedade Brasileira de Microscopia e Microanálise (SBMM). É chairman do International Committee da Materials Research Society (MRS) e membro de diversas comissões executivas internacionais, assim como de comitês editoriais de revistas científicas internacionais, como a Materials Characterization (Elsevier) Journal of Materials Science (Springer) e Microscopy and Microanalysis (Cambridge University Press).
Veja a seguir as lembranças de Guillermo Solórzano sobre os primórdios do processo de criação da SBPMat, complementando a matéria já publicada sobre o tema, da qual não pôde participar por problemas de agenda.
Boletim da SBPMat (B. SBPMat): – O que o levou, no início do ano 2000, a iniciar os esforços de organização para criar uma sociedade brasileira de pesquisa em Materiais?
Guillermo Solórzano (G.S.): – No ano 1999, havia no Brasil comunidades e/ou sociedades e/ou eventos setoriais ou monodisciplinares. Tinha a dos físicos, a dos químicos, a dos engenheiros. A Associação Brasileira de Metalurgia (ABM), por exemplo, que nos anos de 1990 acrescentou a seu nome “e de Materiais”, congregava engenheiros, principalmente metalúrgicos, mas tinha muito pouca participação de físicos, químicos e outros engenheiros, como os eletrônicos, por exemplo. Por outro lado, havia associações monodisciplinares, como a de polímeros e de materiais cerâmicos. Muitas sociedades têm o mérito de sua existência no fato de serem setoriais, mas a área de Materiais é abrangente, interdisciplinar e ampla. Isso já se notava nos anos 1980, e agora é muito evidente. Na época, era a MRS (Materials Research Society) nos EUA a entidade que reunia em seus eventos os últimos avanços da pesquisa em Materiais. Nos dois eventos anuais da sociedade, um em San Francisco e um em Boston, você sempre encontrava brasileiros.
Eu fiquei no MIT (Massachusetts Institute of Technology) alguns anos, em Boston. Pude participar desses eventos e achava muito importante implantar esse tipo de atividade aqui no Brasil. Eu já era professor da PUC-Rio e achava difícil me engajar numa iniciativa dessas que consome muito tempo e esforço. Mas houve uma ocasião em que a National Science Foundation propôs para o a MRS e o CNPq a realização no Brasil de um workshop pan-americano que seria dedicado aos avanços da pesquisa em Materiais. Via-se que, através da pesquisa em Materiais, ia se atingir vários setores estratégicos da sociedade, não apenas para o desenvolvimento econômico, mas também para o social, já que as transformações da sociedade dependem de energia, infraestrutura, comunicações – setores em que os materiais são fundamentais. Em 1995, tinha havido uma reunião desse tipo no México, reunindo os países da América do Norte, e em 1996, um workshop europeu. No Brasil aconteceria a terceira etapa desta iniciativa, a qual reuniria os países do continente americano.
Já tinha havido algumas missões da NSF no Brasil que tinham encontrado grupos de pesquisa em Campinas, Rio de Janeiro e São Paulo, notando que existia uma comunidade importante no Brasil. Então, ao ser contatado, o CNPq acolheu essa iniciativa importante e decidiu fazer esse workshop no Rio de Janeiro. Aí, naturalmente, surgiu a questão de contatar a sociedade de materiais do Brasil, mas… não tínhamos tal sociedade! Assim, para atingir toda essa comunidade, alguém teria que coordenar o esforço. O CNPq me pediu que eu coordenasse o evento e eu convidei o Edgar Dutra Zanotto.
Esse workshop visou avançar a colaboração pan- americana criando mesas de discussão de alto nível em tópicos que na época eram, e ainda são, chave: energia, infraestrutura, transporte, comunicação e educação. Juntamos os experts dos EUA, Brasil, Argentina, Chile, Venezuela e Colômbia. Além de ser um sucesso e dar lugar a programas pan-americanos de pesquisa que existem até agora, esse workshop, que ocorreu em junho de 1998, serviu para perceber que deveríamos ter uma sociedade brasileira de pesquisa em Materiais.
B. SBPMat: – Nesse momento você tinha em mente quais seriam os próximos passos para a criação da sociedade? Como prosseguiu a história?
G.S.: – Em primeiro lugar, eu queria identificar a comunidade representativa de Materiais no Brasil. Para isso, contatei o CNPq e pedi uma lista dos pesquisadores que estavam nos conselhos e comitês assessores e dos bolsistas de produtividade das áreas de Materiais, Física e Química. A lista tinha uns 300 nomes. A eles enviei uma carta assinada junto a Zanotto propondo uma discussão para criar uma sociedade. Só duas pessoas questionaram; todos os outros foram muito entusiastas. Além disso, sabendo que todo ano tinha 40 a 50 brasileiros no congresso de Boston da MRS, solicitei ao presidente da MRS em 1999 que me mandasse a lista dos brasileiros que participavam do congresso e pedi se podia fazer uma reunião lá em Boston durante o evento. A MRS me enviou a lista e cedeu uma sala, cafezinho, e toda a infraestrutura para que eu pudesse receber esses brasileiros. Fizemos a reunião em Boston, num clima de muito entusiasmo. Com esse feedback, quando voltei de Boston convidei o Zanotto a dar corda à iniciativa e fizemos uma carta convidando toda a comunidade a fazer parte da discussão. Além disso, eu fiquei um ano fazendo reuniões em diversas cidades. Pagava por conta própria, aproveitando as oportunidades. Onde tinha um congresso que eu pudesse aproveitar, eu ia. Um exemplo foi o Encontro de Física da Matéria Condensada em São Lourenço, que reuniu cerca de 2 mil físicos. Quem me apresentou foi o Sergio Rezende, que era o chairman. Nas minhas viagens sempre tinha alguém influente daquele lugar que chamava todo mundo a participar. Como não tinha financiamento, não pude ir até Recife, mas pedi ao Sergio Rezende que fizesse a reunião. Ele a fez e me disse que a ideia tinha sido muito bem recebida.
Ai, para dar uma consistência maior à questão, eu propus a criação de uma comissão interdisciplinar de Materiais que congregava personalidades científicas reconhecidas no país, oriundas da Física, Química e Engenharia, como Aldo Craievich e Evandro Mirra, entre vários outros. Juntos fizemos visitas a eventos importantes.
Nesse momento, como não tínhamos nem um tostão, surgiu a ideia de estabelecer a possibilidade de ser sócio fundador. Esses sócios fundadores pagariam uma soma pequena, uma primeira anuidade, algo em torno de 40 reais, e os membros da comissão interdisciplinar algo assim como o dobro, e com isso teríamos uma caixinha para dar início a algumas atividades. Houve uns 400 sócios fundadores, todos receberam um diplominha. Dessa maneira conseguimos os primeiros recursos financeiros da SBPMat.