Artigo em destaque: Biomaterial compósito promissor para regeneração de tecido ósseo.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Assisted deposition of nano-hydroxyapatite onto exfoliated carbon nanotube oxide scaffolds. Hudson Zanin, Cintia M. R. Rosa, Noam Eliaz, Paul W. May, Fernanda Roberta Marciano and Anderson O. Lobo. Nanoscale, v. 7, p. 10218-10232, 2015. DOI: 10.1039/C4NR07317G.

Biomaterial compósito promissor para regeneração de tecido ósseo. 

Em um estudo realizado pelo Laboratório de Nanotecnologia Biomédica (NANOBIO) da Universidade do Vale do Paraíba (UniVap), em colaboração com cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e de universidades de Israel e Reino Unido, foi fabricado um biomaterial que permitiu avançar na compreensão de fases da geração de tecido ósseo in vitro (fora do contexto biológico real). O material, de baixo custo, tem potencial para ser utilizado para acelerar a regeneração de tecido ósseo in vivo – o que pode ser útil no caso de fraturas ósseas, por exemplo. Os resultados do estudo foram recentemente publicados na revista científica Nanoscale, da Royal Society of Chemistry.

Em grandes linhas, a geração natural de tecido ósseo ocorre quando umas células chamadas osteoblastos produzem a parte orgânica do osso e, num segundo momento, depositam sobre ela a parte inorgânica, a hidroxiapatita, de fórmula química Ca5(PO4)3(OH). A deposição natural da hidroxiapatita é um processo de biomineralização (produção de minerais por parte de organismos vivos). A biomineralização ainda não é completamente compreendida, mas seu entendimento é de grande importância para o desenvolvimento de aplicações visando a regenerar tecido ósseo ou fixar implantes em ossos.

“O artigo colabora com o entendimento do processo de precipitação da hidroxiapatita carbonatada in vitro em curtos períodos de tempo sobre superfícies tridimensionais a base de nanohidroxiapatita, nanotubos de carbono verticalmente alinhados e grafeno”, diz o professor/pesquisador Anderson de Oliveira Lobo, engenheiro biomédico com mestrado e doutorado em Física e Química de Materiais, que assina o paper como autor correspondente.

Em colaboração com o grupo de Diamantes e Materiais Relacionados (DIMARE) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), representado pelo pesquisador Evaldo José Corat, a equipe do NANOBIO, coordenada pelos professores Anderson de Oliveira Lobo e Fernanda Roberta Marciano, produziu arcabouços de nanotubos de carbono alinhados verticalmente.  Os nanotubos passaram por um processo de oxidação superficial pela técnica de plasma etching, que exfoliou suas pontas, gerou óxido de grafeno e, dessa maneira, criou um ambiente mais propício para a formação de núcleos de nanohidroxiapatita na etapa seguinte da fabricação do material, a eletrodeposição. Essa técnica de deposição foi a escolhida porque, entre os métodos conhecidos, gera a apatita artificial mais similar à biológica em termos de microestrutura e dimensões. Para definir os parâmetros da eletrodeposição por meio de estudos eletroquímicos, os pesquisadores do Brasil pediram a colaboração de um especialista no assunto em nível mundial, o cientista Noam Eliaz da Universidade de TelAviv. Após a eletrodeposição, a equipe obteve um material compósito que manteve as propriedades biológicas da hidroxiapatita, com a vantagem de que a presença de nanotubos de carbono reforçou a dureza e resistência do material.

Posteriormente, os cientistas submergiram o material em fluído corporal simulado (um líquido que simula as condições do plasma sanguíneo e é comumente usado no estudo de biomateriais). Nessas condições, o material compósito, que é bioativo nesse tipo de líquido, formou espontaneamente uma camada de hidroxiapatita carbonatada, a qual, em conjunto com o arcabouço de nanotubos e os filmes de hidroxiapatita, compôs um novo material compósito.

Os pesquisadores puderam observar e estudar todo o processo de biomineralização em períodos de até 7 dias, e propuseram no artigo modelos para explicar diversas etapas. Nesse momento, mais precisamente na discussão do modelo químico de como ocorre a biomineralização do compósito, foi importante a participação do pesquisador Paul May, da Universidade de Bristol, junto a Hudson Zanin, pesquisador do Laboratório de Abastecimento e Fornecimento de Energia da UniVap que estava fazendo um pós-doutorado na universidade britânica.

Esquema demonstrando todo o processo de produção dos nanobiomateriais e o ensaio de bioatividade in vitro. Na parte superior da esquerda para a direita mostra: (i) a produção dos nanotubos de carbono verticalmente alinhados (ii) exfoliação para a exposição das folhas de grafeno (iii) esquema demonstrando o processo de eletrodeposição de nanohidroxiapatita (iv). Nas duas linhas do meio segue demonstrado todo o processo de biomineralização in vitro demonstrando como ocorrem as trocas entre os cátions e ânions até a formação da camada de nanohidroxiapatita carbonatada. Na última linha seguem micrografias demonstrando o processo de biomineralização nos tempos iniciar (logo após a incubação) e após 7 dias (última micrografia).

A pesquisa não trouxe apenas avanços na compreensão da biomineralização in vitro. “A compreensão desse processo in vitro poderá ser associado ao processo de regeneração in vivo destes materiais”, comenta o professor Anderson Lobo. “Estudos in vitro com células osteoblásticas humanas e ensaios in vivo utilizando animais estão sendo realizados pelos orientandos de pós-graduação e pós-doutorandos do NANOBIO da UniVap”, completa.

As origens do estudo se encontram na pesquisa de doutorado de Lobo, realizada no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e defendida em 2011, na qual ele conseguiu pela primeira vez sintetizar compósitos de nanotubos de carbono verticalmente alinhados e nanohidroxiapatita. A pesquisa contou ou conta com apoio financeiro de agências brasileiras de fomento à pesquisa: FAPESP, CNPq, FINEP e CAPES.