Artigo em destaque: Fônons acoplados à ordem magnética na origem da ferroeletricidade.

O artigo científico com participação de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Spin-phonon and magnetostriction phenomena in CaMn7O12 helimagnet probed by Raman spectroscopy. Nonato, A.; Araujo, B.S.; Ayala, AP; Maciel, AP; Yanez-Vilar, S.; Sanchez-Andujar, M.; Senaris-Rodriguez, MA; Paschoal, CWA. Applied Physics Letters 105, 222902 (2014); DOI: 10.1063/1.4902234.

Matéria de divulgação: Fônons acoplados à ordem magnética na origem da ferroeletricidade.

Por meio de um estudo baseado, principalmente, na técnica de espectroscopia Raman, pesquisadores do Brasil, em colaboração com cientistas da Espanha, avançaram na compreensão dos mecanismos envolvidos na geração de ferroeletricidade magneticamente induzida (polarização elétrica que ocorre em alguns materiais com ordenamento magnético espiral, mesmo quando não estão sob a ação de campos elétricos) no composto CMO.

O CMO, cuja fórmula é CaMn7O12, é um óxido cerâmico de estrutura perovskita, que apresenta, simultaneamente, a baixas temperaturas, ferroeletricidade e antiferromagnetismo.

Além de contribuir ao avanço da pesquisa fundamental, o trabalho, cujos resultados foram recentemente publicados na revista Applied Physics Letters (APL), abre possibilidades para a criação de novos materiais cuja polarização possa ser controlada por meio de campos magnéticos. Tais materiais poderiam ser aplicados, por exemplo, em novos dispositivos spintrônicos para armazenamento de dados, mais rápidos e que consumam menos energia.

O estudo foi realizado durante o doutorado de Ariel Nonato Almeida de Abreu Silva, orientado por Carlos William de Araujo Paschoal, professor do departamento de Física da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), onde lidera um grupo de pesquisa em propriedades dielétricas e vibracionais. “A idéia surgiu da busca por materiais multiferroicos e magnetoelétricos que permitam um controle da polarização elétrica mediante substituições”, diz o professor Araujo Paschoal, que assina o artigo junto a outros sete pesquisadores. De acordo com ele, o CMO foi escolhido por apresentar um rico diagrama de fases (magnética, estrutural e de ordenamento de carga) e por ser único nos mecanismos que geram ferroeletricidade a partir de suas propriedades magnéticas.

Entre as particularidades do CMO, existe uma transição magnética, que ocorre a 90 K (cerca de -180° C), na qual o composto passa da fase paramagnética à antiferromagnética, induzindo uma ferroeletricidade gigante.

No estudo que gerou o paper da APL, Ariel e seu orientador analisaram detalhadamente os espectros Raman das amostras de CMO em diversas temperaturas (de 300 K, cerca de 26°C, até 10 K, cerca de -263°C) para investigar as vibrações coletivas dos átomos da rede cristalina (fônons) e sua relação com a ordem magnética. Entre outros resultados, conseguiram provar que, a 90 K, os fônons exibiam um comportamento não usual devido ao acoplamento com a ordem magnética.

“A principal contribuição deste trabalho foi ajudar na compreensão de como os fônons acoplam com o ordenamento magnético no CaMn7O12(CMO). Isso sem dúvida é um grande passo que nos permite avançar na compreensão da origem da polarização elétrica induzida no CMO, a qual ainda é motivo de grande discussão na literatura”, afirma Paschoal.

Espectro Raman do CMO observado a 10 K. O inset mostra o acoplamento ferroaxial da hélice magnética com a rotação global da estrutura descrita pelo vetor axial A.

O trabalho experimental deste estudo começou com a síntese das amostras, que foi realizada na Universidad de A Coruña (Espanha), onde Ariel estava realizando um “período sanduíche” sob supervisão da professora Maria Antonia Señaris Rodriguez. Na sequência, na Universidad de Santiago de Compostela, foi realizada uma série de medidas magnéticas. Por fim, as medidas de espectroscopia Raman foram realizadas no Laboratório de Espalhamento de Luz da Universidade Federal do Ceará (UFC), em colaboração com o professor Alejandro Pedro Ayala, e no próprio departamento de Física da UFMA, no Laboratório de Espectroscopia Vibracional e Impedância (LEVI).

A pesquisa contou com financiamento de agências brasileiras federais (CNPq e CAPES) e estaduais (FUNCAP e FAPEMA, do Ceará e do Maranhão, respectivamente) e de entidades da Europa.