Artigo em destaque: Catalisadores nanoestruturados para produção de energias renováveis.


O artigo científico de autoria de membros da comunidade brasileira de pesquisa em Materiais em destaque neste mês é: Trifunctional catalytic activities of trimetallic FeCoNi alloy nanoparticles embedded in a carbon shell for efficient overall water splitting. Mohd. Khalid, Ana M. B. Honorato,  Germano Tremiliosi Filho and  Hamilton Varela. J. Mater. Chem. A, 2020,8, 9021-9031.

Catalisadores nanoestruturados para produção de energias renováveis

Imagem de microscopia eletrônica de transmissão do material eletrocatalisador: nanopartículas trimetálicas encapsuladas em camadas de carbono.
Imagem de microscopia eletrônica de transmissão do material eletrocatalisador: nanopartículas trimetálicas encapsuladas em camadas de carbono.

Uma pesquisa realizada no Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (IQSC-USP) resultou em um material nanoestruturado que funciona como catalisador de reações eletroquímicas (eletrocatalisador) fundamentais em alguns sistemas de geração de energia renovável. Por reunir eficiência e baixo custo, o novo material seria uma alternativa aos catalisadores tradicionalmente usados nessas reações, os quais se baseiam em elementos do grupo dos metais preciosos, como a platina, que são escassos e caros.

O material desenvolvido, que, a olho nu, tem a aparência de um pó preto, é híbrido e nanoestruturado. Consiste em nanopartículas de 10 a 50 nm, compostas por uma liga de ferro, cobalto e níquel (três elementos relativamente abundantes e baratos), inseridas em camadas de carbono dopado com nitrogênio.

Recentemente reportado no Journal of Materials Chemistry A, o estudo apresenta um método de fabricação muito simples para obter esse material com a estabilidade necessária às aplicações em eletrocatálise. O método consiste em preparar uma solução de água com sais de ferro, cobalto e níquel e adicionar a ela compostos orgânicos capazes de se ligar a íons metálicos (os chamados “ligantes”). A reação entre metais e ligantes gera estruturas conhecidas como MOFs (metal-organic frameworks). Finalmente, os MOFs obtidos são submetidos a alta temperatura (900°C) para se obter o material final.

“Criamos uma estratégia única, direta e eficaz para a síntese de um eletrocatalisador eficiente, que é barato e bastante ativo em reações de conversão de energia, e pode ter impacto na nova geração de tecnologias na área de energia “, diz Mohmmad Khalid, bolsista de pós-doutorado do Grupo de Eletroquímica do IQSC-USP e autor correspondente do artigo junto ao professor Hamilton Varela (IQSC-USP).

O artigo também reporta os testes realizados nos laboratórios do Grupo de Eletroquímica do IQSC-USP para aferir o desempenho do material nanoestruturado em algumas aplicações ligadas à geração sustentável de energia, como a divisão da molécula de água (hidrólise). Esse processo constitui a forma mais limpa de se obter hidrogênio, considerado atualmente o combustível não-fóssil mais promissor. Contudo, sem a participação de bons eletrocatalisadores, a hidrólise é muito lenta e consome bastante eletricidade.  “Nosso catalisador nanoestruturado funciona impecavelmente na decomposição das moléculas de água para geração de hidrogênio aplicando um potencial muito baixo em comparação com vários eletrocatalisadores baseados em metais não preciosos reportados anteriormente”, afirma Khalid.

O material nanoestruturado também apresentou resultados muito bons como catalisador da oxidação de etanol. Essa reação é realizada nas células a combustível de etanol (direct-ethanol fuel cells) para obter energia elétrica a partir da energia química do etanol (combustível renovável do qual o Brasil é o segundo produtor mundial). “Assim, o catalisador mostrou seu potencial não apenas para gerar hidrogênio, mas também para aplicações de células de combustível”, diz Khalid.

Superando os desafios

O trabalho começou em 2017, com um projeto de pesquisa coordenado pelo professor Hamilton Brandão Varela de Albuquerque, com a participação de Mohmmad Khalid como bolsista de pós-doutorado. De acordo com Khalid, o objetivo final do trabalho era encontrar um eletrocatalisador barato e estável para o processo de divisão da molécula de água.

Os principais problemas enfrentados pelos pesquisadores foram a agregação de nanopartículas durante a síntese do material e a sua dissolução nos eletrólitos durante os testes eletroquímicos. “Ideias interessantes surgiram em discussões com a doutora Ana Maria Borges Honorato e pudemos, então, otimizar as condições do processo de síntese”, conta Khalid. No material obtido, as camadas de carbono protegem as nanopartículas catalisadoras e influem no desempenho catalítico do material, que é afetado pela espessura dessas camadas e por pequenas variações em sua composição. “Esta nanoestrutura nos permitiu resolver não apenas o problema de agregação de partículas durante a síntese e o problema de segregação/ dissolução de metais em eletrólitos durante a operação, mas também melhorou o desempenho catalítico em redução de oxigênio, evolução de oxigênio, evolução de hidrogênio, reações de oxidação de etanol e divisão geral da água, com valores muito competitivos com relação a catalisadores de referência”, resume o pós-doc.

O trabalho recebeu financiamento das agências brasileiras FAPESP (São Paulo), CNPq e CAPES.

Autores principais do trabalho. A partir da esquerda: Mohmmad Khalid, Ana Maria Borges Honorato e Hamilton Varela.
Autores principais do trabalho. A partir da esquerda: Mohmmad Khalid, Ana Maria Borges Honorato e Hamilton Varela.


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