Pesquisadores sem remuneração: Thiago Marinho Duarte.


Thiago Duarte em 2017 na Universidade Jaume I (Espanha), onde realizou um estágio de pesquisa durante o doutorado.
Thiago Duarte em 2017 na Universidade Jaume I (Espanha), onde realizou um estágio de pesquisa durante o doutorado.

Thiago Marinho Duarte, 33 anos, tem uma sólida formação para atuar em ensino e pesquisa. O paraibano, natural de Campina Grande, fez licenciatura, mestrado e doutorado em Química, além de uma especialização em metodologia de ensino de Química e Biologia. Foram treze anos dedicados à sua formação.

Todavia, desde que defendeu seu doutorado em Química pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em fevereiro deste ano, seus planos de ser professor pesquisador têm ficado “no freezer”. Para poder pagar as contas, recorreu aos conhecimentos aprendidos na adolescência, em cursos técnicos, e começou a fazer “bicos” de eletricista.

Em setembro, ele passou numa seleção da prefeitura de Conde, na região metropolitana de João Pessoa, para atuar na frente de combate à Covid-19, lidando com assuntos diversos, desde analisar laudos de água até conscientizar a população a respeito da pandemia. Desta forma, conseguiu estabilidade financeira por alguns meses (o contrato encerra no final de dezembro) enquanto continua buscando oportunidades para voltar à carreira científica.

Normalmente, o passo seguinte à conclusão do doutorado é o pós-doutorado, o qual pode ser compreendido como um trabalho temporário de “cientista júnior”. No Brasil, essa fase da carreira ocorre geralmente em grupos de pesquisa de universidades e costuma ser remunerada por meio bolsas, pagas por agências governamentais de financiamento à pesquisa, sejam federais (como o CNPq ou a Capes) ou estaduais.

“Submeti projetos de pesquisa em dois editais do CNPq para seleção de bolsistas de pós-doutorado”, conta Thiago. “Em ambos os casos fui avaliado com nota próxima à máxima (acima de 9,5), mas fui comunicado de que não ganharia a bolsa devido a limitações no orçamento”, lamenta. De fato, a quantidade de bolsas de pós-doutorado das agências federais vem diminuindo consistentemente desde 2015, como mostrou um levantamento de dados feito pela SBPMat.

Já em plena pandemia, Thiago participou de quatro processos seletivos de instituições de ensino superior da Paraíba e Rio Grande do Norte para contratação de professor substituto – um cargo temporário que lhe permitiria manter-se na sua área profissional e ter uma renda. Mas ele não ficou selecionado. “A concorrência era muito grande”, diz. Além disso, ele se inscreveu em um concurso para professor efetivo no campus da cidade de Areia da UFPB, mas a seleção ainda não foi realizada devido à pandemia.

Thiago também pensou seriamente em empreender. Olhou com carinho as suas lembranças da época da graduação, quando chegou a produzir e comercializar detergente, e pensou que produzir saneantes não seria uma má ideia para um químico em época de pandemia de doença infecciosa. Mas esta ideia também foi parar “no freezer” frente às dificuldades que Thiago enfrentou para obter informações de caráter burocrático, necessárias para iniciar o empreendimento.

Primeiro universitário da família

“A minha primeira vocação foi a de professor”, conta Thiago. No ensino médio, ele tinha facilidade para as disciplinas da área de Ciências Exatas. No último ano, depois de ajudar alguns colegas a entender uma matéria e passar na prova, ele percebeu que poderia se dedicar ao ensino. Então, mesmo sem ter referências na família (os pais de Thiago são assalariados sem formação superior e ele foi a primeira pessoa que cursou o ensino superior entre todos seus parentes), ele decidiu fazer licenciatura em Química na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

No final da graduação, em 2011, Thiago começou a enxergar uma outra opção de carreira. Ao notar que havia muitos concursos em universidades e institutos federais, e que todos eles pediam mestrado e/ou doutorado, Thiago pensou que deveria sair de Campina Grande para fazer pós-graduação na UFPB, sempre na área de Química.

A decisão lhe trouxe muitas experiências gratificantes e crescimento pessoal e profissional. No mestrado, Thiago ficou encantado ao descobrir que os conceitos aprendidos nas aulas se tornavam palpáveis no laboratório, e que poderia fazer uma contribuição própria ao avanço do conhecimento. No doutorado, ele fez uma imersão no mundo das simulações computacionais para estudar materiais semicondutores que podem ser usados para remediação ambiental, e teve a oportunidade de sair pela primeira vez do país para fazer uma parte da pesquisa em uma universidade espanhola, com apoio financeiro da Capes.

“O contato com o mundo real dos experimentos e com o mundo ideal das simulações me fez amadurecer”, reflete Thiago. “E a experiência no exterior me fez dar um salto como pessoa e pesquisador; é algo que recomendo a todos que tiverem a oportunidade”, completa.

Atualmente, além de trabalhar na frente de combate à Covid-19, Thiago está terminando de escrever um projeto de pesquisa para atuar em um grupo do estado de São Paulo. Mais uma vez, ele vai tentar conseguir uma bolsa de pós-doutorado. Além disso, Thiago está se preparando para participar de mais um concurso de professor substituto, desta vez na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

“Quero esgotar todas as possibilidades no país, mas não descarto ir para o exterior”, diz Thiago. “É uma pena que os governantes do Brasil não tenham interesse em investir em geração de conhecimento e tecnologia”.

Link para o CV Lattes de Thiago Marinho Duarte: http://lattes.cnpq.br/3323835059496707


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